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1718 I SÉRIE - NÚMERO 43

O Orador: - Choca particularmente ver como certos juristas jogam a sua reputação na tentativa de demonstrar que um lamentável gesto eleitoralista seria um acto acima de qualquer suspeita de ilegalidade, um pilar e um exemplo de sã administração pública, que, embora qualificado de «provisório», seria irrevogável, irreversível e oponível a todos os órgãos de soberania presentes e futuros.
A falta de bom senso não tem limites! Srs. Deputados, em 3 de Outubro de 1985, o Governo estava demitido e confinado, nos termos do artigo 189.º, n.º 5, da Constituição, «à prática dos actos estritamente necessários para assegurar a gestão dos negócios públicos». O Primeiro-Ministro, já candidato à Presidência da República, declarava que não queria exercer as funções de chefe de um governo demitido.
No funcionamento colegial do Governo repercutia-se o facto de ministros do PSD se encontrarem em quase abandono de funções...
As consequências jurídico-constitucionais deste quadro não oferecem dúvida, sendo reconhecidas por autores de todos os quadrantes políticos e ideológicos.
É assim que o Prof. Freitas do Amaral autor da dissertação sobre governos de gestão com que se candidatou ao título de professor agregado da Faculdade de Direito replica implacavelmente e esmaga o Freitas do Amaral autor dos pareceres da Rádio Renascença, afirmando peremptoriamente (e com toda a razão) que os governos de gestão estão impedidos de praticar «actos de alta administração ou administração extraordinária», que «só serão legítimos em caso de urgência».

Vozes do PCP: - Muito bem!

É difícil que alguém admita, de razão fria, que o despacho eleitoralista de 3 de Outubro de 1985 pudesse obedecer a quaisquer razões de urgência que não a mais ilegítima urgência eleitoral!...

Aplausos do PCP.

Por outro lado, para além das limitações decorrentes deste quadro, a entrada em vigor da lei de revisão constitucional veio impedir, a partir de 1982, a atribuição de novas licenças para funcionamento de estações emissoras de rádio ao abrigo da legislação anterior. Situação reconhecida expressamente pelo próprio Secretário de Estado, Anselmo Rodrigues, perante o plenário da Assembleia da República na mesma ocasião em que assegurou peremptoriamente: «Não vai haver nenhuma autorização até à publicação [... ] do regime legal de licenciamento, tal como o impõe a Constituição.» (Diário da Assembleia da República, 1.ª série, n.º 81, de 3 de Março de 1984.)
Falava bem nesta altura o ex-secretário de Estado, não sabemos por que mudou de ideias, mas sabemos que a lei não mudou! O acto praticado em 3 de Outubro de 1985 é imoral, indigno, ilegal e, sobretudo, não pode constituir um facto consumado e inamovível pelos órgãos de soberania, legitimados pelo sufrágio popular e incumbidos de defender a legalidade democrática.

Aplausos do PCP.

Aliás os argumentos aduzidos por alguns teriam ainda uma outra consequência inaceitável: se se sustenta que o acto de 3 de Outubro podia ser praticado pelo secretário de Estado com base na lei dos serviços radioeléctricos, está-se a sugerir que o actual secretário de Estado teria pelo menos igual poder neste preciso momento em que a nova lei de licenciamento também não se encontra em vigor, podendo confirmar ou praticar licenciamentos...

Vozes do PCP: - É ridículo!

O Orador: - Mas haverá alguém que ouse assumir a responsabilidade de defender e praticar esta enormidade?!
E acima de tudo: como é que é possível que se ergam, neste debate, vozes apaixonadas sustentando o nenhum poder da Assembleia da República para corrigir a situação criada por um secretário de estado demitido, que a dois dias de eleições faz um típico «testamento ministerial», expressamente proibido pelo artigo 189.º, n.º 5, da Constituição e que o próprio confessa que é «provisório». Isto é enorme e, a valer, seria um precedente monstruoso!

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sem dúvida!

O Orador: - O acto é «irreversível»? A Assembleia eleita em 6 de Outubro pelo povo português «nada pode» contra este gesto? Imaginemos, Srs. Deputados, que um secretário de estado de um qualquer governo demitido atribuía de um só golpe, todo o espaço radioeléctrico disponível ou multiplicava licenças para a instalação de bancos, seguradoras e actividades reservadas de alto valor económico ou estratégico.
A argumentação de certos juristas conduziria a isto - a que todo o espaço radioeléctrico ou sectores inteiros da economia estivessem irrevogavelmente e irreversivelmente comprometidos e a Assembleia da República e os outros órgãos de soberania impedidos para sempre de defender o interesse nacional, contra um acto ilegal, insensato, eventualmente corrupto. O Estado Português estaria desarmado para enfrentar uma situação destas. É inteiramente absurdo!

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - É este absurdo em que alguns estão a cair, porventura de boa fé, mas que está a ser deliberadamente sustentado por juristas e catedráticos ligados ao partido do Governo e ao CDS e pelo candidato do partido do Governo à Presidência da República, que hoje procura agenciar um lugar de deputado na Assembleia da República.

Uma voz do PSD: - Isso é ignóbil!

O Orador: - Srs. Deputados: Pensemos no gravíssimo precedente que isto constituiria! A responsabilidade que hoje todos temos nesta Assembleia é de afirmar de uma forma inteiramente clara que este absurdo não prevalece sobre a lei e que o Estado democrático não está desarmado. Este dever é nosso, mas é-o também de todas as pessoas e de todas as instituições responsáveis no nosso país!

Aplausos do PCP.

O segundo grande tema para o qual se exige a nossa reflexão é o das implicações e razões da instituição do Conselho da Rádio em que o Governo vê um bárbaro atentado às suas prerrogativas constitucionais.

Vozes do PCP: - E é!