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15 DE DEZEMBRO DE 1988 617

também com a minha riqueza da razão, porque não quero a sua «riqueza» de argumentação!...

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Creio que o tom com que a maioria está a abordar a questão do IRS é excessivamente leviano para os termos em que a questão está hoje colocada na nossa cena política.
O «cavaquismo» tem na reforma fiscal um dos seus espinhos mais dolorosos e um dos seus fiascos mais evidentes. Creio que o nervosismo que o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais aqui exibiu há bocado era apenas um aperitivo para o nervosismo que temos direito a presenciar agora, face à questão central do falhanço da reforma fiscal. Isto é, o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais pode vir à Assembleia da República com um chumaço de papel de computador - que se nega sistematicamente a transmitir a quem quer que seja, nesta Casa, mas que exibe para câmaras televisivas - e dizer-nos que tudo está bem. Não alterará um ponto que seja a nenhum decibel lhe resolverá o problema que está colocado, problema esse claramente sumarizável nas seguintes proposições: primeiro, não há reforma fiscal nenhuma; segundo, a máquina fiscal não estão preparada para a reforma nenhuma; terceiro, a legislação que serve de base à pseudo-reforma fiscal é materialmente inconstitucional; quarto, a legislação que serve de base à pseudo-reforma fiscal é inconstitucional também porque caducou a autorização legislativa ao abrigo da qual foram preparados os códigos que, tarde e a más horas, o Governo fez publicar.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Dito isto, Sr. Presidente e Srs. Deputados, alguma modéstia, alguma calma, algum controlo de decibéis é recomendável por parte da bancada governamental e do PSD. Isto é, podem os Srs. Deputados ler o frágil déplié, a frágil «folheca» de propaganda, enviada pela Secretaria de Estado dos Assuntos Fiscais para casa de milhões de portugueses, e nem isso resolverá a inconstitucionalidade basilar da legislação que está publicada!
Podem os Srs. Deputados governamentais dizer que a reforma é gradualista, suave, que vai chegar aos seus objectivos, que isso não altera minimamente as três proposições que aqui enunciei.
Suponho, Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, que V. Ex.ª não encontrará por aí quem lhe erga uma estátua, qualificando-o como o benfeitor dos contribuintes portugueses. Admito mesmo que lhe aconteça o contrário!...
Porquê? Por três razões!
Quem ler a proposta de lei do Orçamento do Estado verá uma coisa nunca vista: o artigo 23.º, n.º 1, diz que «Para efeitos do disposto no n. º 4 do artigo 8.º da Lei n.º 106/88 (...)». Isto é anómalo, Srs. Deputados! É que deveria fazer-se menção no Orçamento do Estado - já não digo na proposta - aos códigos propriamente dito; só que o Governo, quando apresentou a proposta, não tinha os códigos (estavam atrasados!) e agora, aparentemente, a maioria não se dá sequer ao trabalho de, onde se faz menção à lei de autorização legislativa, fazer menção aos códigos que agora estão publicados.
Isto é, o artigo 8.º, n.º 4 da Lei n.º 106/88 corresponde ao artigo 55.º, n.º 3 do Decreto-Lei n.º 442-A/88 e o n.º 4 do artigo 11.º da Lei n.º 106/88 corresponde ao artigo 73.º do mesmo decreto-lei. Podiam ter, pelo menos, esse trabalho... mas não! Numa matéria tão importante nem a esse cuidado os Srs. Deputados governamentais se dão, o que nos leva à questão de saber do valor da legislação ao abrigo da qual está a ser desenvolvida toda esta actividade.
Sobre isso gostaria de chamar a atenção para vários aspectos e formular algumas perguntas à bancada governamental.
A primeira, quase diria que é insólita, vai no sentido de saber qual foi a data da aprovação do texto dos códigos que estão publicados no Diário da República. É que consta a menção ao dia 20 de Novembro, mas essa data é puramente impossível, uma vez que se sabe que, depois disso, houve alterações do artigo 92.º, alterações essas que dizia respeito ao regime de retenção, que não é um regime secundário nem de pouca importância. Essas alterações foram ao Conselho de Ministros ou o Sr. Secretário do Estado nem teve conhecimento delas, uma vez que foram negociadas topo a topo, Presidência a Governo, Presidência a Secretário de Estado da Presidência, com subalternização do Secretário de Estado?!...

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Segundo aspecto: este diploma foi publicado já no mês de Dezembro, com data anterior e vem com a menção a uma determinada data de promulgação, a qual se situa depois da caducidade da autorização legislativa.
Entende o Governo que isto não tem efeito em relação ao valor da autorização legislativa em causa e, logo, do diploma emanado? Devo dizer que o nosso entendimento é precisamente o contrário e que é inteiramente inexplicável que um Governo, com uma maioria tão obesa, tenha publicado e aprovado de uma forma tão atrasada a legislação, autorizada, atempadamente, pela Assembleia da República.
É um mistério total que, todavia, ensombra de inconstitucionalidade a legislação sobre o IRS e o IRC.
Gostaria de dizer, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que símbolo do atamancamento supremo que o Governo imprimiu a esta operação é o facto de na própria lei do Orçamento pretender alterar, como já aqui foi suscitado, a própria «Lei da Reforma Fiscal». Isto é, pretende alterar o n.º 4 do artigo 11.º da Lei n.º 106/88, não garantindo o rendimento mínimo a certos contribuintes, o que é absolutamente absurdo, é uma entorse, não tem significado. Pois bem, o PCP apresentou uma proposta no sentido de eliminar essa entorse ou esse elemento.
Última observação: o Governo cria uma situação de pandemónio fiscal uma vez que há direito de recurso individual para as instâncias competentes, desde logo os tribunais, perante um imposto aplicado inconstitucionalmente, como é o caso deste. Portanto, a «reforma fiscal», além de não o ser, pode ser também não só sinónimo de gravame fiscal como também de pandemónio fiscal.