I SÉRIE — NÚMERO 36
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A Sr.ª Maria de Belém Roseira (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Adão Silva, paradoxo com paradoxo
se paga.
Explique-me, por favor, Sr. Deputado, como é que o atual Governo chegou a estas funções dizendo que
conseguiria evitar pedir mais sacrifícios aos portugueses, cortando nas gorduras intermédias, nos gastos
excessivos na máquina do Estado, quando eu, fazendo umas contas muito simples sobre as despesas em
outsourcing a nível dos serviços integrados, ou seja, da administração direta do Estado, vejo 248 milhões de
euros e vejo que, a nível dos serviços e fundos autónomos, ou seja, da administração indireta do Estado,
estão orçamentados 558 300 milhões de euros para 2014. Tudo somado, dá cerca de 1000 milhões de euros,
Sr. Deputado.
Protestos da Deputada do PSD Teresa Leal Coelho.
Se somarmos 558 300 milhões de euros com 248 milhões de euros, faça a conta, por favor, Sr.ª Deputada.
Portanto, Sr. Deputado Adão Silva, este é o paradoxo como o qual o confronto. Como é que o Governo é
capaz de atacar os pensionistas, que já têm a sua vida programada há anos, independentemente da idade que
têm… Os senhores estão a chegar ao pé de pensionistas que têm 80, 85, 90 e 95 anos e dizem-lhes: «O
senhor, no o mês que vem, já não recebe a pensão que recebeu até agora e para a qual descontou». E ao
mesmo tempo são capazes de entregar, em outsourcing puro, que tanto mais necessários serão quanto mais
enfraquecerem a máquina do Estado, este montante, que é um montante absolutamente escandaloso!
O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Peço-lhe que conclua, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Maria de Belém Roseira (PS): — Mas como lhe disse, Sr. Deputado, leia com atenção o artigo do
Dr. Bagão Félix, ouça com atenção as intervenções da Dr.ª Manuela Ferreira Leite, que respeita com certeza,
e leia com atenção o que escrevem pessoas de várias áreas políticas que não se conformam com aquilo que
está a ser feito e com a garantia da sustentabilidade sempre à custa daqueles que não têm poder
reivindicativo e que, por isso, não se podem opor.
Isso não se faz!
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Para fazer uma intervenção ao abrigo do n.º 2 do artigo 76.º do
Regimento, tem a palavra a Sr.ª Deputada Inês de Medeiros.
A Sr.ª Inês de Medeiros (PS): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Tornou-se num exercício quase
doloroso falar de cultura nesta Casa, tal a menorização a que ela está sujeita, sendo-lhe sistematicamente
negado o seu papel fundamental para a criação de uma sociedade mais justa, mais qualificada, mais
dinâmica, mais inventiva, mais democrática.
O acesso à cultura é um direito constitucional. Direito pelo qual Sophia de Mello Breyner tanto lutou como
Deputada na Constituinte. Omitir e desprezar esse facto permite que se instale na sociedade portuguesa a
ideia de que a cultura é um luxo, um bem supérfluo, um adorno. Na melhor das hipóteses, é vista como uma
mera figura de retórica; na pior, como a personificação de um grupo de interesses, tão minoritário como
dispensável, incapaz de se adaptar a uma suposta modernidade que apenas se mobiliza na defesa de
privilégios indevidos.
O atual Governo não esconde preferir esta segunda visão. Foi muito claro desde o início. O objetivo era
«libertar a cultura do Estado» e confiá-la à iniciativa privada. Abdica, assim, de prevenir e corrigir os riscos
inerentes ao funcionamento do mercado para o acesso à cultura: a anulação pura e simples por falta de
rentabilidade a curto prazo, a concentração e estandardização das produções culturais, o aprofundamento das
desigualdades geográficas, económicas e sociais. Uma cultura de massas para os mais pobres e uma cultura
de excelência para uma elite. Que isto revele uma concordância tácita de que quem pouco ou nada tem fica
automaticamente diminuído nos seus direitos não parece incomodar os nossos decisores. Mas o que isto