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II SÉRIE — NÚMERO 62

E a retroactividade da lei fiscal tem tradição na legislação portuguesa. Citamos três casos, para ilustrar a afirmação.

Assim, o Decreto n.° 15 467, de 14 de Maio de 1928, a pretexto de interpretar o significado de «outros rendimentos» do artigo 49.º da Lei n.° 1368, de 21 de Setembro de 1922, ordenou que os contribuintes inserissem nas suas declarações determinados rendi' mentos e que tinham de incluir não só esses rendimentos do ano 1926-1927, como dos quatro anos anteriores, tendo de fazer essa declaração até 30 de Junho e pagar em 1 de Outubro.

O Decreto-Lei n.° 196/72, de 12 de Junho, no seu artigo 13.°, estabelece que o adicional criado se aplicaria aos rendimentos de 1971.

O Decreto-Lei n.° 375/74, de 20 de Agosto, manda, no seu artigo 21.°, que os artigos 12.° a 15.° se aplicam aos rendimentos de 1973 e o artigo 13.º substitui as taxas, aumentando-as, de imposto complementar.

Nestas condições, e ainda que possa haver dúvidas, como bem salienta o Dr. Marcelino no seu bem elaborado parecer, e possa haver quem opine pela constitucionalidade como pela inconstitucionalidade, tanto no que toca à competência do Governo para legislar como no que respeita ao efeito retroactivo da lei, a verdade é que enfileiro com os que entendem não se verificar a inconstitucionalidade, nem formal nem material, do Decreto-Lei n.° 667/76, de 5 de Agosto, pelo oue decido não solicitar a apreciação da sua constitucionalidade ao Conselho da Revolução.

6) Processo n.° 76-DI-l0

Inconstitucionalidade do Estatuto Disciplinar dos Funcionários Civis do Estado.

Parecer do assessor Dr. João Caupers:

I

Introdução

Suscitado numa reclamação dirigida ao Serviço do Provedor de Justiça por alguns trabalhadores do Serviço de Formação Profissional do Ministério do Trabalho o problema da inconstitucionalidade do Estatuto Disciplinar dos Funcionários Civis do Estado, e porque a questão já se levantara noutros processos pendentes neste Serviço, foi determinado que se procedesse ao estudo do problema, em ordem a encontrar as linhas gerais que deveriam presidir à revisão daquele diploma legal à luz da nova Constituição Política e da desejável vivência democrática.

Foi o que se fez, tentando extrair do texto constitucional todas as suas consequências e partindo da necessidade de conciliar os direitos e liberdades que a lei reconhece a todos os cidadãos, funcionários públicos ou não, com a necessidade de dignificar o exercício de funções públicas, apagando más recordações e varrendo definitivamente certos parti pris quanto às qualidades profissionais e métodos de trabalho dos chamados «servidores do Estado», que são afinal servidores do público.

A revisão do Estatuto Disciplinar ¿os Funcionários Civis do Estado é uma tarefa que urge realizar. Depois de ter atravessado um período de esquecimento, semelhante a uma forma de desuso, justificável na base do vácuo legislativo que a queda do fascismo provocou, vácuo esse por vezes preenchido com nem sempre razoáveis «emanações» da legalidade revolu-

cionária, o Estatuto renasceu, já na fase de institu-cionalidade de democracia portuguesa. As tentativas de impor a sua aplicação não foram, normalmente, bem sucedidas, visto que muitas das suas disposições se revelaram manifestamente obsoletas ou apresentavam acentuado cunho repressivo. Torna-se, pois, indispensável produzir um texto que substitua o (ainda) vigente (parcialmente), até porque algumas das suas disposições foram revogadas pela própria Constituição.

Não cabe, obviamente, ao Serviço do Provedor de Justiça a elaboração de um projecto para regular a matéria; parece que, no entanto, a intervenção do Provedor poderá servir para dinamizar a resolução do problema, cuja responsabilidade recai, em última análise, sobre a Assembleia da República [artigo 367.°, alínea m), da Constituição] ou sobre o Governo, através do departamento competente [artigos 168.° e 202.°, alínea f), da Constituição], sempre com a participação dos trabalhadores interessados (artigos 56.°, 57.° e 58.° da Constituição).

É, pois, com este espírito que procedemos ao presente estudo.

II

Os preceitos constitucionais

As normas constitucionais com particular relevo na matéria são as seguintes:

a) O n.° 2 do artigo 18.° colocou «fora da lei» al-

gumas normas do Estatuto que restringem direitos dos funcionários garantidos pela Constituição: é o caso, crê-se, do artigo 38.° do Estatuto Disciplinar dos Funcionários Civis do Estado ao estabelecer que «em processo disciplinar a única nulidade absoluta é a falta de audiência do arguido, nos casos em que a lei a impuser». Como o n.° 3 do artigo 270.° garante ao arguido em processo disciplinar a sua «audiência e defesa», parece que qualquer circunstância que conduza à impossibilidade ou dificuldade de o arguido se defender convenientemente deve ser considerada nulidade absoluta;

b) O n.º 1 do artigo 271.º da Constituição res-

ponsabiliza os funcionários ou agentes que, no exercício das suas funções e por causa do seu exercício, causem prejuízos a outrem. Supõe-se que este princípio constitucional deve levar a rever a questão da eventual responsabilidade disciplinar de um superior hierárquico que de má fé instaura um processo disciplinar a um subalterno. Actualmente, a irresponsabilidade do superior é completa e nem mesmo em recurso contencioso se podem indagar as motivações da instauração do processo;

c) Também dos n.os 2 do artigo 267.° e 2 do ar-

tigo 269.° se devem extrair consequências susceptíveis de influenciar o futuro estatuto disciplinar: por exemplo, deverá considerar-se infracção disciplinar a actuação do funcionário orientada não pele interesse de servir o povo, mas por inclinações de carácter partidário ou outras;