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II SÉRIE — NÚMERO 39

Bem pode alias dizer-se que o modo como em Portugal se tem encarado a defesa do consumidor, confundindo-a, com a acção repressiva sobre os pequenos comerciantes «apanhados em falta» pela fiscalização econórráca, é, por si só, esclarecedora das concepções dos autores de tal política.

Por isso se não estranhará que seja na «defesa do consumidor» traduzida legislativamente no Decreto--Lei n.° 41 204, com as actualizações que em matéria de rotnJaigem e publicidade lhe mtrodiuziu a tecnocracia Idos amos 70, ou sejas em termos exclusivos de «continuidade», que ainda hoje se baseiem as políticas adoptadas.

É que, os últimos teóricos do Estado libérai já não se atrevem a sustentar que «querer suprimir a miséria é condenar a Providência». O Estado é já tutor protegendo contra os perigos. Só que não visa suprimi-los.

Para assegurar esta protecção, utiliza o poder pofi-daí.

2 —Os trabalhos do INSERM (Institut National de la Santé et de la Recherche Médicale) francês, sobre os consumos alimentaires, permitiram cbarnar a atenção paira outro ângulo do problema.

No século xix, os «ricos» comiam pão branco, os pobres pão escuro. Hoje, os «ricos» começam a utilizar o pão escuro...

Ou seja, o consumo de produtos «iLimentares não 6 explicávêá excLusSivamenite por critérios ortiffitários.

O que se passa é que sob a influência dos modelos culturais dos gtiupos privilegiados se sacrificam características alimentaires úteis mo plano nutritivo por características sem interesse dietético mas eficazes como sinal.

As rdkções entre os aspectos de sinal e símbolo social e os aspectos utilitários do consumo foram analisadas de forma exemplar, 'há quase um século, por Th Veblen.

A sua Theory of the leisure class continua uma obra íuinidaimenitaí paira mostrar como a moda .tem pouco a ver com o conforto e a utilidade.

De igual modo a literatura clássica está cheia de figuras de «nobres» arruinados itudo sacrificando patra manter as aparências.

São dos nossos dias e de Portugal exemplos tão simples como o do consumo de (televisores a cores ou, há pouco tempo ainda, o automóvel

Interpretar, consequentemente, o desemoMmento dos consumos como uma melhoria da «nttiMdade» dos bens constitua um miito contemporâneo sem grande coincidência com a realidade.

3 — A maior paute dos consumidores corutenta-se com seguir os hábitos do grupo social a que pertencem.

A chamada de atenção pana o valor de «süiaita dos consumos é (também um maior aprofundamento da problemática da defesa do consumidor.

O que está em causa não é já apenas a influença da publicidade, unias da sociedade que nos rodeia, ao seu sistema de percepção e de valores.

Há, assim, subjacente a cada «defesa do consumidor» uma ideologia.

Não são apenas mercadorias mas sinais e símbolos sociais que são consumidos (Jean BaudriUJartí, Pour une Critique de l'Économie Politique du Signe, Paris, 1972, ed. .Galimaird).

Daí que conferir aos consumidores meios de fazerem ouvir a sua voz e as suas rdvmdicacões seja apenas a primeira parte de um problema mais vasto.

Não deixa de ter-se presente o receio que começa a manifestar-se em vários autores (e a crítica não é «de direita») de que as acções das associações de consumidores possam agravar o gosto pelo consumo, na medida em que, uma vez eliminados os «maus produtos» a confiança nos produtos comprados e na eficácia do consumo como sinal e símbolo social sairiam (robustecidos.

4 — O preceito constítucional sobre a defesa do consumidor — alínea m) do artigo 81.° da Oonstitíuiçao da República— coloca o acento tónico da defesa do consumidor na formação de cooperativas e associações de consumidores.

Mais além se terá tentado ir na experiência, iniciada no VI Governo Provisório, da existência de um cargo govenamental vocacionado para assegurar a defesa do consumidor, experiência não prosseguida, no entanto, pelos vários governos constitucionais.

Daí a necessidaSde de empenhamento redobrado da Assembleia da República legislando, quer pontualmente para resolução de problemas maàs gritantes, quer, de modo genérico, abrindo pistas à colaboração dos interessados e, em particular, das associações de consumidores que imparia apoiar e promover.

5 — Assim se procuram estabelecer princípios gerais, a desenvolver posteriormente, de modo a assegurar uma eficaz protecção dos consumidores, de modo a que deixem de ser «vítimas predestinadas» do sistema económico.

Ao mesmo tempo, e desde já, se confere às associações de consumidores estattuto de parceiro saciai, como «coMtrapoder» indispensáveis que São, obrigando as empresas e os serviços públicos a ter mais em conta as necessidades da população do que o crescimento dos seus lucros ou poder.

6—Na elaboração deste projecto foi tido em conta o Programa Preliminar da CEE para uma política de protecção e de informação dos consumidores, aprovada pelo Conselho de Ministros da CEE em resolução de 14 de Abril de 1975 (JO n.» C92, de 25 de Abril de 1975), muito embora não se desconheça que as referências directas aos consumidores são limitadas, no Tratado de Roma, aos domínios da agricultura e da concorrência. Do mesmo modo, foi itido em consideração o 2.° Programa Comunitário para o período de 1980-1985.

Iguaimente foi tido em conta o estudo da EURO-COOP intitulado «L'élargissement des Communautés européennes à la Grèce, l'Espagne et le Portugal et ses conséquences dans le domaine agricole pour le consommateur européen».

Assim, nos termos do m." 1 do artigo 170.° da Constituição da República, os deputados abaixo assinados apresentam o seguinte projecto de >le£:

ARTIGO 1."

1 — As associações de consumidores de âmbito nacional gozam do estatuto de parceiro sociai, para todos os efeitos legais e designadamente ò de representação no Conselho Nacional do Piano, Conselho Nacional de Rendimento e Preços, comissões coordenadoras regionais de planeamento, conselhos municipais e em todos os órgãos consultivos da Administração Pública que funcionem junto de entidades com competência em maitérjas que interessem & política de defesa do consumidor.