28 DE JUNHO DE 1983
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trializadas. Admite-se que o elenco das eventualidades cobertas pela segurança social possa vir a ser alargado, por forma a incluir, por exemplo, a ajuda personalizada à habitação, o seguro de educação/formação e a assistência judiciária. Haverá certamente que ajustar o regime ou regimes de segurança social às estratégias de luta contra a pobreza e adaptar a compensação dos encargos familiares e as prestações de sobrevivência às modificações que a estrutura da família está a conhecer. Não é, no entanto, menos evidente que a crise económica desencadeada nos anos 70 vem trazer consigo sérias limitações a esta perspectiva do desenvolvimento da segurança social e impor o repensamento sério das fontes do seu financiamento, a racionalização do emprego dos meios disponíveis e a própria diversificação das prestações, por forma a oferecer soluções alternativas para a satisfação das carências sociais. Não parece legítimo, numa época em que os constrangimentos podem vir a exigir a adopção de estritos critérios de selectividade, caminhar pura e simplesmente no sentido da universalização do direito às prestações.
9 — A situação portuguesa no domínio da segurança social apresenta algumas originalidades. Portugal é apenas um país semi-industrializado, mas foi o primeiro país na Europa Ocidental que se propôs instituir um sistema integrado de segurança social ou, na linguagem da Constituição de 1976, num sistema unificado e descentralizado de segurança social. A ideia de um sistema integrado surgiu em textos programáticos anteriores à Constituição, mas o certo é que esta ideia não chegou a encontrar uma expressão teórica ou doutrinária suficientemente definida. Não obstante esta falta de expressão teórica ou doutrinária, a integração implicaria necessariamente alterações substanciais no aparelho administrativo da segurança social e nos regimes que esse aparelho administrativo deve gerir. O mesmo, aliás, se deverá dizer da unificação. A unificação do aparelho administrativo, quaisquer que sejam as suas dificuldades, é obviamente um problema mais simples do que a unificação dos regimes.
10 — O presente projecto não pode nem pretende ser encarado como o modelo de uma segurança social integrada ou unificada, até porque, em rigor, a unificação não é uma conquista ou um resultado, mas um objectivo a atingir e o caminho que progressivamente conduz à sua realização.
11 — O modelo a que obedece o presente projecto de lei representa uma solução que se julgou realizável ou exequível na nossa situação actual. Esse modelo pode não ser inteiramente perfeito, mas oferece a vantagem de não bloquear o desenvolvimento do sistema de segurança social, embora tal desenvolvimento e o seu ritmo tenham necessariamente de ficar dependentes dos factores económicos, demográficos, sociais e políticos que vão configurar o nosso futuro colectivo.
12 — O projecto traduz antes de mais nada uma opção quanto ao campo de aplicação dos regimes de segurança social. Em princípio, poder-se-ia ser levado a crer que o disposto no n.° 1 do artigo 63.° da Constituição implica uma concepção universalista do direito à segurança social. A esta luz, haveria que prever a criação de um regime de prestações universais, unicamente dependentes da residência e da verificação das eventualidades previstas. Seria possível conceber um regime que assegurasse a todos pensões de invalidez, de velhice e de sobrevivência e que concedesse a todas as pessoas com encargos de família o abono de família e as demais
prestações familiares, independentemente de quaisquer pressupostos contributivos e de condições de recursos. Este regime de prestações universais constituiria a base de um conjunta, que seria completado por prestações graduadas em função dos salários ou dos rendimentos anteriores.
13 — Certo é, porém, que são ainda relativamente poucos os países que possuem regimes de prestações universais. Nalguns casos, esta universalidade tem sido conseguida através da generalização dos seguros nacionais que abrangem, a partir de determinada idade, toda a população residente. Os exemplos da universalidade são ainda mais escassos ao nível dos países semi-industriali-zados. Os únicos países semi-industrializados que concedem prestações familiares numa base universal são a Irlanda e Israel. No domínio da protecção da saúde Chipre garante cuidados médicos a todos os residentes de recursos limitados através dos hospitais públicos e a Irlanda tem um serviço de saúde que cobre os trabalhadores protegidos pelo regime de seguros sociais e as pessoas de escassos recursos. A Itália, com índices de desenvolvimento superiores aos dos países semi-industrializados, tem desde 1978 um serviço nacional de saúde (cf. Social Secrurity Programas Thoughout the World. 1979, U.S. Department of Health and Human Services). Todos os outros regimes de prestações universais ou, pelo menos, generalizados, estão implantados nos sistemas de países plenamente industrializados (países escandinavos. Holanda, Reino Unido, Canadá, Nova Zelândia, Luxemburgo, Alemanha Federal) e, mais escassamente, nos sistemas de países desenvolvidos do Leste Europeu.
14 — A Constituição de 1976 impôs a criação do Serviço Nacional de Saúde como um serviço universal e, embora graças a um somatório de regimes de protecção, foi possível entre nós assegurar os cuidados médicos a partir de 1978 a toda a população residente. Temos, portanto, um regime universal ou, pelo menos, de cobertura generalizada de cuidados médicos.
15 — As incertezas criadas pela actual conjuntura económica, conjugadas com a necessidade de proteger especialmente as situações de maior carência, levam a considerar preferível não instituir desde já esquemas de prestações universais de segurança social, embora se deixe ficar inteiramente aberta a via da universalização. O número reduzido de exemplos de regimes universais ou generalizados de prestações aconselha a percorrer essa via com a indispensável prudência, tanto mais que, além de melhorarmos o nível das prestações de substituição dos rendimentos de trabalho e das prestações de manutenção de recursos, teremos de fazer esforços sensíveis para integrar novas eventualidades no nosso sistema de segurança social.
16 — Afigurou-se que haveria que aproveitar ao máximo os regimes de protecção já existentes e que se devia procurar promover a sua unificação, com as alterações que essa unificação pressupõe, em vez de se inventar ou tentar inventar soluções enovadoras, mas não experimentadas e muito dificilmente ao alcance dos meios materiais e institucionais de que dispomos. Não seria em nenhum caso legítimo ignorar todo o longo caminho que a Previdência fez entre nós, quaisquer que sejam as deficiências que lhe devam ser reconhecidas.
17 — Acabou por se caminhar no sentido de propor a criação de 2 regimes dentro do sistema de segurança social: o regime geral de segurança social e o regime não contributivo da segurança social. O regime geral de segurança social deverá essencialmente abranger toda a