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1892-(32)

II SÉRIE — NÚMERO 68

citamente fundamentado, é um acto ferido de inconstitucionalidade, bem como que são inconstitucionais todas as disposições legais que admitam a mera conveniência de serviço como fundamento daquele acto.

Do mesmo modo, considero que será ferido de inconstitucionalidade aquele acto se os fundamentos invocados não corresponderem aos únicos motivos que pela Constituição são admitidos para restrição do direito do trabalhador à livre escolha da profissão e do género de trabalho e referidos no artigo 51.°, n.° 3, da Constituição.

Sintetizando:

1 — Quando um funcionário ou agente do Estado aceita (mediante a posse ou apresentação ao serviço) a investidura em determinado lugar, tal aceitação representa uma escolha por ele feita para uma certa profissão e determinado género de trabalho, assumindo as responsabilidades do cargo e usufruindo também de todos os direitos, garantias, regalias e expectativas que àquela profissão e posto de trabalho são inerentes.

2 — Qualquer acto discricionário da Administração que venha, por imposição, determinar uma alteração na profissão ou género de trabalho assim escolhidos, como a transferência, não poderá deixar de ser considerado inconstitucional, por violar os artigos 18.°, n.° 2, e 51.°, n.° 3, da Constituição, excepto se aquele acto se tiver fundamentado em motivos com base em «interesse colectivo» ou «capacidade» (competência, eficiência, produtividade, aptidão, etc.) do próprio funcionário ou agente transferido.

3 — Por outro lado, o poder discricionário conferido à Administração impõe que ele seja usado com um fim de interesse público (Constituição, artigo 270.°, n.° 1) e, assim, qualquer acto de transferência praticado no uso de poder discricionário, mesmo que de harmonia com as reservas impostas pelo artigo 51.°, n.° 3, da Constituição, será viciado de desvio de poder se não tiver um fim de interesse público.

4 — Ê óbvio que, só podendo o acto discricionário determinativo de transferência de funcionários e agentes da administração fundamentar-se em motivos que se reportem ao «interesse colectivo» ou à «própria capacidade» do transferido (artigos 51.°, n.° 3, da Constituição) e ter um fim de interesse público (artigo 270.°, n.° 1, da Constituição), quando tal não aconteça, o funcionário ou agente transferido só poderá usar o direito de recurso contencioso que a Constituição (artigo 269.°, n.° 2) lhe confere se puder provar (visto que é a ele que lhe cabe o ónus da prova) que a transferência não se fundamentou nos motivos que a Constituição estabelece ou não tem um fim de interesse público.

5 — Será assim igualmente inconstitucional — por obstar ao exercício do direito que o artigo 269.°, n.° 2, da Constituição confere — todo o acto de transferência exercido dentro da competência legal (artigo 52.°, n.° 3, da Constituição), no uso de poder discricionário, se no mesmo não se expressarem concretamente os motivos que o fundamentam.

6 — Deste modo e visto que, por um lado. tuJas es forças políticas do País que foram, dominantemente, ora umas, ora outras, Governo admitem e reconhecem que a invocação da conveniência de serviço como único fundamento de acto discricionário que imponha a transferência de um servidor de Estado pode ser e foi usada como cobertura de fins diversos daqueles que a lei impõe para aquele acto, sendo aqueles fins proibidos pela Constituição [artigos 52.°, alínea b), e 310.D], e, por outro lado, a pura e simples remissão para um conceito —o da conveniência de serviço — não garante ao interessado (funcionário transferido) usar do seu direito a recurso contencioso (artigo 269.°, n.° 2, da Constituição), pela impossibilidade prática de provar que aquele conceito se não reconduz a uma avaliação da sua «capacidade» ou do interesse colectivo (e repare-se que o próprio Decreto-Lei n.° 356/79 reconhece que ele se reconduz «quase sempre», o que admite que nem sempre acontece), nos termos do artigo 51.°, n.D 3, ou que tem fins diversos do fim de interesse público, não podendo impugná-lo por «desvio de poder»; não posso deixar de concluir que o acto administrativo, no uso de poder discricionário, que determine a transferência de funcionários ou agentes do Estado e que invoque unicamente a conveniência de serviço e não seja concreta e explicitamente fundamentado é um acto ferido de inconstitucionalidade.

São, do mesmo modo, inconstitucionais todas as disposições legais que admitem a mera conveniência de serviço como fundamento daquele acto, nomeadamente o Decreto-Lei n.° 356/79, de 31 de Agosto.

2 — Com base neste parecer, o Provedor pediu ao Conselho da Revolução a declaração de inconstitucionalidade de «toda a disposição legal que permita, em acto discricionário e no uso de competência legal, transferência imposta a funcionário ou agente do Estado, com a mera invocação de conveniência de serviço».

3 — E, tendo em conta também o referido parecer, bem como a análise de diversos processos abertos com base em queixas de funcionários ou agentes transferidos, formulou ao Secretário de Estado da Reforma Administrativa a seguinte recomendação:

Tenho a honra de recomendar a V. Ex." — aliás no seguimento de outras recomendações idênticas feitas pelo Provedor de Justiça — que, após obtenção de prévia autorização legislativa da Assembleia da República, se digne providenciar para que, com a maior urgência, seja publicado diploma em que se estabeleça o regime global da transferência de funcionários ou agentes da função pública e que daquele regime constem, nomeadamente, as seguintes regras:

a) Exigência de no acto determinativo da

transferência constarem, concreta e especificamente, os motivos que fundamentam a necessidade da transferência;

b) Obrigação da elaboração de uma lista de

prioridades ou graduação dos motivos