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4 DE JANEIRO DE 1984

1892-(47)

artigo 167.° resulta que é da exclusiva competência da Assembleia da República legislar sobre a matéria da criação de impostos e sistema fiscal (M). Trata-se, pois, da consagração do princípio da legalidade no duplo aspecto da reserva da lei formal e da definição dos elementos nucleares dos impostos por meio de lei, conforme entendimento defendido pela Comissão Constitucional no seu Parecer n." 3/79 (M). Podendo a violação de tal princípio constituir, simultaneamente, uma ofensa a um dos direitos fundamentais dos cidadãos f95) — o de não pagar impostos que não hajam sido criados em termos constitucionais, reconhecido no n.u 3 do artigo 106.° da Constituição—, certo sector da doutrina qualifica tal violação como inconstitucionalidade material, e não como inconstitucionalidade orgânica C6). No caso sob apreciação poder-se-á admitir a existência de uma tripla inconstitucionalidade — formal, orgânica e material —, consoante o ângulo através do qual se encarar a infracção das normas constitucionais, isto é, inobservância das regras sobre a forma e processo de formação dos actos, relativas à competência ou atinentes ao conteúdo das próprias regras constitucionais C).

Todavia, e apesar de se haver esbatido na actual Constituição o relevo dos diferentes tipos de inconstitucionalidade, afigura-se-nos razoável a qualificação do vício de que enferma a Portaria n.° 131/82 como inconstitucionalidade material com base no reconhecimento (n.° 3 do artigo 106.° da Constituição) do direito fundamental dos cidadãos de não pagar impostos que não tenham sido estabelecidos em harmonia com a Constituição C4). Nada impedirá, porém, que, em alternativa, se suscitem perante o Conselho da Revolução as questões da inconstitucionalidade formal e orgânica (") da citada portaria, considerando que, paralelamente, não se mostram respeitadas as normas atinentes à tramitação do acto (portaria, em vez de lei ou decreto-lei aprovado ao abrigo de autorização legislativa) e à competência do órgão (ministro, em lugar da Assembleia da República ou do Governo, legislando por meio de decreto-lei). Ao referido órgão de soberania ca-

(") Sobre a orientação actual do princípio de reserva total da lei no âmbito da administração das prestações (subvenções que representam, simultaneamente, vantagem para uns cidadãos e encargo para outros), cí. Dr. J. Comes Canotilho, ob. cit., vol. i, pp. 42 c segs., e Dr. Sérvulo Correia, «Os princípios constitucionais da Administração Pública», in Estudos sobre a Constituição, vol. ui, pp. 664 c segs.

(") Pareceres da Comissão Constitucional, vol. 7.°, p. 213.

(") Pois nem todos os direitos fundamentais estão incluídos na parte t do texto constitucional.

(*) Cf. Prof. Teixeira Ribeiro, Os Princípios Constitucionais da Fiscalidade Portuguesa, p. 11, Prof. Jorge Miranda, Manual de Direito Constitucional, t. n, p. 594, e Drs. A. Xavier, ob. cit., pp. 135 e 136, e Braz Teixeira, ob. cit., pp. 80 e 81.

O V. artigos 280.", n.° 2, e 281°, n." 2. da Constituição.

(") Cf. Prof. Jorge Miranda, ob. cit., p. 594, e os autores citados no mesmo sentido. Aquele constitucionalista sustenta que as inconslitucionalidades formal e orgânica «convolam-se ou sublimam-se» em inconstitucionalidade material.

Ç) No sentido da inconstitucionalidade formal geradora da inexistência jurídica, v. Dr. Miguel Galvão Teles, citado pelo Prof. |. Miranda, ob. cit-, p. 594.

berá deliberar sobre o tipo e a extensão das in-constitucionalidades detectadas ao longo da análise da Portaria n.° 131/82 (10°) a que procedemos.

IV) Conclusões

1 — De quanto fica exposto, de concluir é que:

1) Se mostram improcedentes os argumen-

tos de inconstitucionalidade material — traduzida na violação das normas do n.° 2 do artigo 64." da Constituição pela Portaria n.° 131/82, de 29 de Janeiro— e de inconstitucionalidade por omissão invocados na queixa;

2) A Portaria n.° 131/82, de 29 de Janeiro,

ofende as normas dos artigos 106.°, n.os 2 e 3, e 107.° da Constituição da República, justificando-se, por isso, o uso pelo Provedor de Justiça da faculdade que lhe é conferida pelo n.° 1 do artigo 281.° da lei fundamental, solicitando ao Conselho da Revolução que aprecie e declare, com força obrigatória geral, a inconstitucionalidade material dos proceítos dos n.os 1 e 2 da referida portaria ou, para o caso de assim não ser considerado adequado, as inconstitucionalidades orgânica e formal do mesmo diploma. Este, salvo outro melhor, o nosso parecer.

2 — Sobre este parecer pronunciaram-se, sucessivamente, o coordenador e o adunto, nos termos seguintes:

Parecer do coordenador:

1 — Concordo, genericamente, com as conclusões formuladas pelo Ex.™ Assessor em sequência do extenso e bem fundamentado estudo que as antecede e, assim, com a proposta feita no sentido de ser usada a faculdade conferida pelo artigo 281.°, n.° 1, da Constituição, solicitando-se ao Conselho da Revolução a apreciação e declaração, com força obrigatória geral, da inconstitucionalidade material dos preceitos em causa, com a adjuvante alternativa colocada in fine.

2 — De todo o modo, e pessoalmente, eu in-clinar-me-ia (sobretudo e também) para a verificação da inconstitucionalidade material, traduzida na ofensa feita pela Portaria n.° 131/82, de 29 de Janeiro, ao artigo 64.°, n.° 2, da Constituição e, muito designadamente, ao seu espírito.

Nesta sede, afigura-se-me com inteira pertinência a tese subjacente às considerações expendidas pela reclamante na sua exposição inicial no tocante a ser atingido o comando constitucional que aponta para um direito à saúde e em ordem a esse escopo para um serviço nacional de saúde universal, geral e gratuito.

Tais finalidades determinarão, com efeito, a subordinação da produção legislativa ordinária na matéria a um enquadramento que não consen-

(IM) Como actos derivados deste diploma, a Portaria n.° 188/ 82 e o despacho ministerial de 3 de Fevereiro de 1982 acabam irremediavelmente afectados pelas inconstitucionalidades da Portaria n." 131/82.