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8 DE FEVEREIRO DE 1984

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médico, embora exija também expressão bastante do consentimento —isto é, da vontade— da mulher sobre a qual vai ser praticada a interrupção voluntária da gravidez. Este projecto resolve de forma insatisfatória — e por isso nos abstivemos— a situação da mulher inimputável e das menores de 16 anos, permitindo, nesses casos, que se substitua a vontade da mulher —que, num caso, não pode existir e, no outro, se está perante a situação específica da menoridade— pela vontade do representante legal, do ascendente, do descendente, etc. Só que, depois, no n.° 4 do artigo 141.°, introduz um outro factor, que permite ultrapassar todos esses requisitos do consentimento, depositando a decisão por inteiro nas mãos do médico, no caso de urgência ou de ausência (isto é, impossibilidade de presença imediata) do representante legal, do ascendente, do descendente ou de qualquer parente na linha colateral.

O Sr. Correia Afonso (PSD): — Dá-me licença, que o interrompa, Sr. Deputado?

O Orador: — Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Correia Afonso (PSD): — Sr. Deputado José Magalhães: Utilizam-se as expressões «ou» e «e». Isto é, tal decisão deverá surgir na falta das referidas pessoas ou na sua ausência e em caso de urgência. Portanto, a ausência e a urgência são requisitos cumulativos.

O Orador: — Tem razão, Sr. Deputado. O projecto permite ultrapassar, nessa circunstância, cumu-lando-se os dois requisitos, a vontade dessas pessoas que têm alguma relação com a menor ou com a inimputável, atribuindo por inteiro ao médico a decisão de consciência. Isto quer dizer, feito o balanço, que se permite, neste caso, aquilo que, quanto a nós mal, não se autorizou à mulher que poderia, em consciência plena, decidir da interrupção da gravidez. Permite-se à menor de 16 anos e à inimputável um regime que é «mais favorável» do que aquele que se concede àquela que está no pleno gozo de todas as suas faculdades e que, aparentemente, não se enquadra na lógica do projecto de lei. No projecto de lei do PCP, como se lembram, acontecia precisamente o contrário: estabelecíamos um regime em que, para este eleito, os requisitos exigidos eram superiores, porque se está perante uma situação de menoridade, em que há necessidade de agir com uma certa prudência. Em todo o caso, parece-me que se chegou aqui a um resultado inverso daquele que está na lógica da proposta originária do PS.

Isto não envolve nenhuma posição de fundo, neste momento, quanto ao nosso sentido de voto. De qualquer forma, seria importante reflectir, para que a opção aqui a tomar tenha presentes todas as implicações.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Nunes.

O Sr. José Luís Nunes (PS): —Sr. Deputado José Magalhães: Em primeiro lugar, isto tem regras. E as regras são estas: é que não se podem alterar, para determvxvados casos, as chamadas regras do consentimento, que se mantém para a generalidade dos casos.

Quer dizer: mesmo para um caso destes, não penso que essas regras do consentimento possam ser alteradas.

Em segundo lugar, o n.° 4 do artigo 141." não tem contradição nenhuma, pois diz respeito àqueles casos em que o médico se encontra confrontado com a sua própria necessidade. Estando a mulher grávida a morrer, e na ausência das pessoas referidas no n.° 3 do artigo 141.°, o médico tem de tomar uma decisão.

Mas devo dizer-lhe, com toda a franqueza, que, como o Sr. Deputado José Magalhães sabe, a lei não resolve todos os problemas, nomeadamente os chamados problemas de consciência. Se eu fosse médico e me entrasse no consultório uma testemunha de Jeová, cuja religião proíbe as transfusões de sangue, começava por lhe dar um enxerto de pancada e fazia a transfusão de sangue, com ou sem a sua autorização, de acordo com a minha consciência, quaisquer que fossem as consequências. Não teria nenhum respeito por essa opinião. Atenção, pois, a este pormenor, Srs. Deputados.

Portanto, o que aqui está é que está bem. E que, nos casos em que o consentimento não é possível, vai-se buscar um ponto de vista puramente técnico, em que o médico, confrontado com a sua própria consciência, dirá que vai praticar o acto, pois ele é necessário.

Mas admita o caso anterior, em que a mulher é menor de 16 anos e o médico é confrontado com uma negativa, quer da própria mulher, quer dos seus próprios pais, no sentido de rejeitarem a realização do aborto — até no caso de a mulher ser hostilizada pelos próprios pais. Devo dizer-lhe que, nesse caso, o médico fica na situação de confrontação consigo próprio. E é para remediar esta situação que aparecem, ou podem aparecer, depois as causas descriminadoras da culpa previstas no artigo 35.° do Código Penal, se o caso for introduzido em julgamento e se o médico se decidir a agir contra a lei. Nem sempre agir contra a lei é agir contra a moral. Mas este problema é pano de fundo para uma conversa muito mais detalhada.

Portanto, não há qualquer contradição em relação ao n.° 4 do artigo 141.°

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Cunha.

O Sr. Octávio Cunha (UEDS): — Quero apenas corrigir um exagero, que compreendo, porque, por vezes, também a nós nos apetece dar um grande açoite em alguns cidadãos que nos impedem de tratar, por exemplo, crianças. Acho que uma das leis que este Parlamento terá de criar com bastante urgência — que já é aplicada noutros países — é a que, em relação aos menores, tira automaticamente a autoridade paterna — penso que esta é a designação correcta — em certos casos. Na Suíça, por exemplo, no caso de um recém--nascido que precise de uma exsanguinotransfusão, porque está atingido por uma doença que a exige e porque o seu sistema nervoso central está em risco, imediatamente e sem consultar o juiz, os pais perdem a autoridade, só a retomando no dia em que for dada alta à criança.

Ê evidente que, na nossa prática, e no que respeita aos menores, continuamos também a aplicar essa «lei», consensualmente admitida, de tratar o doente, só depois