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8 DE FEVEREERO DE 1984

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O Orador: — Concordo, Sr. Deputado. No entanto, também pode ser o contrário. Há aqui, indubitavelmente, necessidade de uma regulamentação.

Mas por mim não há problema nenhum.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Cunha.

O 3r. Octávio Cunha (UEDS): — Sr. Deputado Correia Afonso, penso que este problema não se vai pôr na prática.

O Sr. Deputado está muito preocupado com os g2Stos, mas vejamos, afinal, aquilo que se vai passar. O que vai acontecer é que aquilo que era clandestino até agora nos hospitais passa a ser reconhecido como legal.

A meia dúzia de macas no serviço de urgência deixam de sobrecarregar este e outros serviços, passando apenas a fazer parte daquele que lhe é destinado.

Além disso, as pessoas que vêm aos serviços de urgência passarão e ser melhor atendidas porque não existe aquele permanente chegar de mulheres a partir da 1 hora da madrugada que vêm acabar na urgência um aborto que iniciaram em casa.

Os serviços não vão ficar mais sobrecarregados. Ao contrário daquilo que se diz muitas vezes, a aprovação desta lei não vai aumentar os casos de interrupção de gravidez nem de aborto clandestino. A experiência mostra que, se pode, eventualmente, haver durante alguns meses um certo aumento de pedidos, tudo acaba por se estabilizar.

A experiência do Estado de Nova Iorque é clara nesse aspecto e é, segundo me parece, a melhor controlada neste sector.

Os serviços já se encontram de certo modo organizados. O que sc pretende é que, de facto, um administrador, ou um director de serviço, por sua posição pessoal, impossibilite que os serviçoi sociais funcionem, ao fim e ao cabo, como têm funcionado sempre.

Simplesmente, ele agora, em vez de assinar uma tabela de saída de uma senhora que veio ali acabar um aborto que começou em casa com o diagnóstico de septicemia, que é o caso de infecção, ele passará a referir interrupção de gravidez.

Já não dirá «septicemia», até porque, se o aborto foi praticado em boas condições, a mulher não vai infectar-se.

Se ela chegar infectada, ele escreverá que se tratou de uma septicemia pós-interrupção clandestina de uma gravidez. Ele terá o direito de o fazer.

Ao fim e ao cabo, vamos tornar claro aquilo que tem sido obscuro e obrigar, através da lei, a que as mulheres não abortem em casa nem se entreguem nas mãos de qualquer curiosa para o fazerem. O que queremos, portanto, é diminuir os riscos, criando condições.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Correia Afonso.

O Sr. Correia Afonso (PSD): — Sr. Deputado Octávio Cunha, aprecio a sua preocupação, na medida em digo-lhe que me recuso, a nível da Assembleia da República, a ir legalizar práticas já existentes.

Em re\ação a este assunto, uns estão de acordo, outros em desacordo. Mas o que temos é obrigação de

dar dignidade de conceitos àquilo que estamos e legislar.

Recuso-me a aceitar o que o Sr. Deputado Octávio Cunha acabou de referir, no sentido de que vamos legislar apenas aquilo que já existe.

Não, Sr. Deputado. Temos de dar a este problema a dignidade que ele tem, colocá-lo ao r.ívei a que ele se coloca, e não apenas, como mero acto regimenta; ou regulamentar, dizer que aquilo que já se faz era proibido, mas passa a ser permitido.

As posições em relação ao aborto são diferentes, mas num ponto elas coincidem: que este problema deve ser tratado de acordo com a dignidade que tem. Ê, aliás, em função dela que tenho estado a contribuir e a desenvolver.

Ora, não posso, de maneira nenhuma, aceitar isto. Logo, se é assim, em termos de conceito, não há dúvida de que este ponto tem de ser regulamentado. Não aceito estar aqui com uma medida policiai a transformar uma coisa que era proibida em permitida.

Estamos a entrar numa nova vida. Aquilo que a Assembleia da República vai decidir, embora com o voto contrário meu e do meu partido, tem que ter a dignidade de uma decisão importante que entra na vida das pessoas. Não pode ser apenas a legalização do que se passa clandestinamente nos hospitais. E muito mais do que isso.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado losé Luís Nunes.

O Sr. José Luís Nunes (PS): — Não percebi muito bem o debate que está a travar-se, porque estou aqui a tentar meter mais umas pequenas modificações atinentes à definição terminológica, mas aquilo que me parece fundamental em relação a isto é o seguinte: esta norma merecia, quanto a mim, 3 críticas que lhe foram feitas pelo Sr. Deputado Correia Afonso.

A primeira, que assumimos, é que ela tem alguma coisa de programático.

No entanto, esta característica, como já foi aqui referido pelo Sr. José Magalhães, permite dar um pouco de sentido a tudo isto. Portanto, não inc parece que seja grave.

O segundo ponto, que aqui foi sublinhado pelo Sr. Deputado Correia Afonso, e muito bem, c que quando se referia «disporão de serviços adequados» estava-se, não digo a pisar o risco, mas a andar perto de uma secante ou de uma tangente.

Estava-se a adoptar um conceito que não me sinto habilitado a dizer se é correcto em termos médicos, ou seja, que deverá haver serviços, nc sentido técnico da palavra, para este efeito.

Em terceiro lugar, no que toca ao problema de saber onde deve ser autorizada a prática da interrupção da gravidez, não vejo nenhum inconveniente em que a certa altura por acto administrativo, que pede ser do Governo ou de outras entidades, se centralize aqui ou ali a prática de certo acto médico.

Mas o que gostava de focar era que a interrupção da gravidez, tal como aparece neste nosso decreto-lei, é um acto médico, no sentido que lhe dá o Supremo Tribunal de Justiça na sua jurisprudência normal: z prática consíante e reiterada de actes dentro da sua arte, que era a expressão utilizada no Código Pena! de 1852.