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1 DE MARÇO DE 1985

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7 — O carácter universalista (1S) do direito à protecção da saúde decorre não só da utilização da expressão «todos» no n.° 1 do artigo 64.°, como também das características apontadas no n.° 2 do mesmo artigo do serviço a implementar para a respectiva execução: um serviço de saúde universal, geral e gratuito.

Grosso modo, pode dizer-se que os sistemas de saúde podem assumir duas modalidades, em matéria de financiamento:

a) O sistema do serviço nacional de saúde, que se caracteriza pelo financiamento do serviço através da colectividade (quer pelo sistema exclusivo do Orçamento Geral do Estado, quer por participações de entidades públicas ou locais) ('), em que desaparece qualquer relação financeira entre o doente e o prestador de cuidados;

b) O sistema do terceiro garante, em que a instituição de protecção indemniza, total ou parcialmente, o prejuízo financeiro causado pelo beneficiário (").

da Saúde, com vista à sua integração no futuro Serviço Nacional de Saúde.

6 — O direito à saúde, como todos os direitos sociais previstos na Constituição, exige, para a sua efectiva realização, uma concretização da parte do legislador, aspecto sobre o qual não há divergências doutrinais.

Onde as posições se começam a dividir é na matéria da qualificação dos direitos sociais como verdadeiros direitos subjectivos ('), pretensões jurídicas 0°) ou direitos de carácter pragmático (")•

A falta de concretização imediata dos direitos sociais coloca-os «sob reserva do legislador» (u), motivo por que o tipo de inconstitucionalidade por ocorrência mais frequente nestes direitos é a por omissão.

Outro aspecto a considerar na realização ou concretização dos direitos sociais são as condicionantes que lhes podem ser introduzidas, dependentes sempre de um determinado estádio de evolução económica e social, sendo geralmente aceite que a sua realização assuma carácter gradativo, porque limitada aos recursos financeiros disponíveis.

Porém, alguns outros vão mais longe, defendendo que o carácter gradativo e progressivo de realização dos direitos sociais imporia mesmo a proibição de retrocesso (13), na medida em que as normas constitucionais atributivas de direitos sociais têm, pelo menos, uma função de garantia dos graus de realização atingida, em cada momento, por esses direitos.

Com a óptica da realização gradual dos direitos de carácter social pode ainda relacionar-se a questão de saber se o gradualismo ou o condicionalismo económico-financeiro podem justificar a inexequibilidade temporária desses direitos (por ausência de medidas legislativas de concretização) ou a disponibilidade de o legislador poder dar execução (mesmo que temporária) a esses direitos sociais, com modificação do seu conteúdo constitucional O4).

(') Neste sentido Vital Moreira/Canotilho, Constituição da República Portuguesa, anotada, fls. 63-64 e fl. 168.

('") Jose Carlos Vieira de Andrade, Direito Constitucional — Direitos Fundamentais, p. 185. Segundo este autor os direitos sociais s<5 serão direitos subjectivos uma vez emitida a legislação destinada a executar os preceitos constitucionais.

(") M. Bethe, Os Conceitos Fundamentais do Direito à Saúde, Ln Colóquio «O Direito à Saúde como Direito do Homem», pp. 11, 17 e 18. Neste autor é referida uma posição crítica frequentemente assumida no sentido da inoportunidade da inclusão de direitos sociais nas constituições porque provocariam falsas esperanças c, sendo aplicáveis, poriam em causa a credibilidade da Constituição. Por um lado há o desejo de que a Constituição seja o reflexo de todas as funções e tarefas do Estado moderno e, por outro, o voto de que estes mesmos sejam imediatamente aplicáveis.

(") A expressão é de Vital Moreira, ob. cit. p. 64.

(") Neste sentido, Vital Moreira/Canotilho, ob. cit. p. 64, defende a inconstitucionalidade material da norma que contrarie a realização legal já atingida.

(") Em termos muito lineares de teoria geral do direito, a realização de um direito social em termos diferentes dos constitucionalmente previstos só não geraria inconstitucionalidade material em situações de aplicação bastante restrita, como sejam o estado de necessidade e o estado de sitio.

A primeira questão que pode colocar-se num sistema constitucional que adopte o tipo de serviço nacional de saúde, com carácter de gratuitidade para o beneficiário da protecção de saúde é o de saber se esse sistema é compatível cora quaisquer pagamento de interessados, quer por via directa no acto de prestação e à entidade prestadora de cuidados, quer ainda por via indirecta a uma entidade que funcionaria como garantia do pagamento O8). Na primeira das hipóteses assinaladas o pagamento poderia constituir uma quebra do princípio de gratuitidade do sistema e, na segunda, uma quebra do princípio da universalidade, na medida em que direitos idênticos não seriam atribuídos a todos os cidadãos.

8 — Para dar execução ao artigo 64.° da Constituição foi publicada a Lei n.° 56/79, de 15 de Setembro (Serviço Nacional de Saúde). Desta lei destacam-se os seguintes princípios gerais, cora interesse para a matéria em análise:

a) O direito à protecção da saúde previsto na Constituição é assegurado através do Serviço Nacional de Saúde (artigo 1.°);

b) O acesso ao Serviço Nacional de Saúde é garantido a todos os cidadãos, independentemente da sua condição económica e

(") No sentido apontado no ponto 5.

(") Este é o sistema geralmente adoptado em países socialistas e na Inglaterra, Nova Zelândia e Dinamarca, (of. fean-Marie Auby, Le droit de la santé, pp. 212-213).

(") Neste si tema ainda se poderiam subdistinguir diferentes modalidades de quotizações ou prémios de seguros pagos obrigatoriamente pelos interessados (Alemanha, Bélgica, França) ou sistemas de seguro facultativo completo por soluções favoráveis pana categorias sociais necessitadas (EUA, com os sistemas de cuidados gratuitos Medicare ou Dedicaid para idosos e indigentes) [cf. autor e ob. cit. em ('")].

(") Neste último caso, também seria de colocar o problema da admissibilidade de celebração de contratos de seguro facultativos ou obrigatórios ou da exigência do pagamento de contribuições a terceiras entidades, que assumissem a responsabilidade do pagamento perante a entidade prestadora de cuidados médicos.