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II SÉRIE — NÚMERO 61

a facturar directamente à entidade responsável.

14.1 — Vários aspectos devem ser considerados na apreciação da forma utilizada — despacho simples — para o estabelecimento das medidas contidas no despacho.

Decorre do artigo 201.°, n.° 1. alínea c), da Constituição que a forma típica de desenvolvimento dos princípios ou bases gerais dos regimes contidos em leis é o decreto-lei. Ainda que possa haver regulamento, este tem de ser mediatizado através de decreto-lei. Para além das garantias que a forma de decreto-lei representa para o cidadão, há também a assinalar que só os decretos-leis estão sujeitos a fiscalização da Assembleia da República, através do instituto de ratificação (cf. artigo 172.° da Constituição).

Por outro lado, a própria Lei do Serviço Nacional de Saúde determina no n.° 1 do seu artigo 54.° que o exercício do direito e acesso às prestações «constará de diploma especial», estipulando o n.° 1 do seu artigo 65.° que esse diploma especial, necessário à sua execução, é o decreto-lei.

Do que atrás ficou referido parece possível concluir que o despacho, pelo menos na parte em que estabelece normas do regime legal respeitante ao exercício do direito e acesso às próprias prestações, está inquinado de inconstitucionalidade formal por ofensa ao disposto no artigo 201.°, n.° 1, alínea c), da Constituição e de ilegalidade, na modalidade de vício de forma, por ofensa ao disposto nos artigos 54.°, n.° 1, e 65.°, n.° 1, da Lei n.° 56/79.

Poderá, em contraponto, contra-argumentar-se que todos os aspectos de regime constituem um mero desenvolvimento ou complemento necessário a uma adequada aplicação do regime das taxas moderadoras. Tal posição não nos parece de aceitar, pois embora se aceite a necessidade do estabelecimento de normas do regime de exercício do direito à protecção à saúde, em sede do despacho de fixação de montantes das taxas moderadoras, tal situação ocorre apenas por falta de publicação do diploma formalmente adequado para o efeito, não sendo também defensável que se degrade, a simples normas complementares de um despacho de fixação de taxas, normas substancialmente qualificáveis como normas de regime.

14.2 — A apreciação dos aspectos de fundo do despacho comporta uma pluralidade de perspectivas.

14.2.1—O primeiro aspecto a realçar é que o regime de fixação de taxas moderadoras aparece desligado dos princípios que nortearam a criação do Serviço Nacional de Saúde, vazados na Lei n.° 56/79, nomeadamente quanto aos seguintes pontos:

Implantação de uma série de órgãos e serviços destinados a dar cabal execução à Lei do Serviço Nacional de Saúde (cf. artigos 24.° a 43.°);

Entrada gradual em funcionamento, com início nos distritos mais carenciados (cf. artigo 58.°);

Integração dos beneficiários dos sistemas nos vários distritos, à medida que a estrutura do Serviço Nacional de Saúde neles entre em funcionamento (cf. artigo 59.°).

A fixação das taxas moderadoras e a correspondente definição aparece, assim, desligada do espírito do sistema da lei e até, nalguns casos, em contradição com medidas de política concreta nela determinadas. Nesta medida, não parece excessiva a conclusão de que a fixação de taxas moderadoras não teve em vista propriamente pôr em execução a Lei do Serviço Nacional de Saúde, tendo antes visado a tutela de uma determinada situação conjuntural, cujo objectivo será analisado de forma específica.

14.2.2 — Atrás ficou referido que o critério distintivo essencial para a qualificação de determinada figura como tributária assentava no fim imediato de criação de receitas públicas, teríamos um tributo, embora com este fim imediato pudessem coexistir fins subsidiários ou complementares; se, ao invés, o fim imediato fosse de diferente natureza, mas com ele pudesse coexistir, como resultado, a angariação de receitas públicas, estaríamos perante uma prestação coactiva de natureza não tributária.

Segundo supomos, a verdadeira natureza das taxas moderadoras fixadas no despacho deve ser apreciada recorrendo, quer à análise do seu regime, quer às justificações dadas pelas entidades responsáveis pela sua fixação. As dificuldades que o problema apresenta • resultam de nestas taxas moderadoras coexistirem finalidades mistas de angariação de receitas públicas com objectivos e montantes predeterminados [cf. declarações do Ministro dos Assuntos Sociais, citadas na nota (J*)] e de contenção ou racionalização de consumos (cf. preâmbulo do despacho: «as áreas hospitalares, pelos seus pesados investimentos e elevados custos, devem ser reservadas aos doentes que efectivamente delas careçam»).

Apesar das dificuldades expostas, afigura-se-nos que, neste caso, não será difícil defender terem estas taxas sido fixadas com a finalidade principal de angariar receitas públicas. E que, quando o fim principal de uma prestação coactiva de natureza não tributária não é a criação de receitas públicas, nunca aparece como justificação financeira da figura um défice ou insuficiência orçamental. Embora as receitas provenientes destas figuras constem na descrição e estimativa orçamental das receitas públicas, a sua afectação às despesas públicas é meramente subsidiária, não podendo argumentar-se que determinados objectivos de política financeira do Estado ficam comprometidos com a sua falta de cobrança (*),

No sistema do despacho, aliás, só aparecem com a natureza de taxa tributária as chamadas taxas moderadoras pagas pelos inscritos na segurança social e independentes, pela comparticipação

("). Tomando, como exemplo, o caso das multas, ninguém com bom-senso poderá vir alegar que a sua não cobrança põe em causa a realização de determinadas despesas públicas.