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II SÉRIE-A — NÚMERO 143

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recordamos o seu apoio a Humberto Delgado, a prisão por parte da PIDE, e o exílio em França, por se recusar

a participar na Guerra Colonial, aonde chegou em 1963 com apenas vinte e um anos. Só regressaria a Portugal

depois do 25 de Abril.

Em Paris, colaborou com músicos como José Afonso e Sérgio Godinho, mudando para sempre a canção

portuguesa com as suas primeiras gravações, no final dos anos 60, por ser autor e protagonista de uma

irreversível viragem estética na música popular portuguesa, de que é exemplo mais evidente o disco Cantigas

de Maio (1971), de José Afonso, de que foi produtor, e que se tornou um marco e inspiração para todos os

criadores de canções e arranjos musicais.

A sua influência fez-se ainda sentir no universo do fado, cuja abordagem estética se transforma numa forma

diferente de produzir fado em estúdio, mudando arranjos musicais e até a interpretação vocal, sem nunca

esquecer as suas raízes e tradições.

Regressado a Portugal, após a Revolução dos Cravos, foi fundador do Grupo de Ação Cultural (GAC), fez

parte da companhia de teatro A Comuna, fundou o Teatro do Mundo, a União Portuguesa de Artistas e

Variedades e fez arranjos e produziu discos de outros artistas, como Camané e Amélia Muge.

Trabalhou com artistas de todas as gerações, assim como compôs, produziu, apoiou, ensinou e influenciou

autores de diversas proveniências musicais, num percurso que dedicou a sua atenção também ao cinema e ao

teatro, bem como à intervenção cívica e política, também depois do 25 de Abril, já em democracia. Foi militante

do PCP ainda nos anos 60, fundador da UDP(R) e membro do seu Conselho Nacional em 1980, e apoiou

também a criação do Bloco de Esquerda, em 1999, do qual foi dirigente.

Na verdade, José Mário Branco pautou a sua vida pelo rigor, pela exigência estética e pela radicalidade do

seu compromisso ético, sendo não só um dos maiores nomes da canção portuguesa que deixa ao País um

legado musical precioso, como artista, cantor e compositor, mas também um lutador político antifascista e

combatente contra as opressões e as desigualdades, cujo percurso de inconformismo, rebeldia e coerência

ajudaram a construir a nossa democracia, num percurso que começou antes do 25 de Abril e que durou até ao

seu desaparecimento.

Músico muito para lá do rótulo da «canção de intervenção» cujas palavras ecoam ainda hoje de forma tão

atual:

Quando eu finalmente eu quis saber

Se ainda vale a pena tanto crer

Eu olhei para ti

Então eu entendi

É um lindo sonho para viver

Quando toda a gente assim quiser.

José Mário Branco deixou-nos um legado que não pode ser apagado pela passagem do tempo e a sua

riquíssima obra é merecedora do reconhecimento, da perpetuação, da valorização e da divulgação que a

classificação da sua obra certamente ajudará a garantir.

Assim, ao abrigo das disposições regimentais e constitucionais aplicáveis, os Deputados abaixo assinados

do Grupo Parlamentar do Partido Socialista apresentam o seguinte projeto de resolução:

A Assembleia da República resolve, nos termos do disposto no n.º 5 do artigo 166.º da Constituição da

República Portuguesa, recomendar ao Governo que:

1. Classifique a obra de José Mário Branco como obra de interesse nacional.

2. Tome todas as diligências conducentes à preservação, valorização e divulgação da obra de José Mário

Branco.

Palácio de São Bento, 12 de dezembro de 2024.

Os Deputados do PS: Maria Begonha — Edite Estrela — Mara Lagriminha Coelho — Pedro Delgado Alves