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II SÉRIE-A — NÚMERO 162

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conservacionistas da União Europeia e de alguns Estados-Membros, casos de França2 e da Bélgica3.

De uma forma progressiva, ferramentas e instituições legais ao dispor dos cidadãos têm sido usadas para

responsabilizar os Estados e os grandes poluidores por ações lesivas para o ambiente, a saúde humana e as

gerações futuras. Na Índia, por exemplo, em 2024, o Supremo Tribunal deliberou que os cidadãos têm o direito

fundamental de viver num ambiente livre de poluição4. Na Coreia do Sul, no mesmo ano, o Tribunal

Constitucional decidiu que parte da lei climática do país não está em conformidade com a proteção dos direitos

constitucionais das gerações futuras, um resultado que os ativistas locais consideraram histórico5. Mesmo em

Portugal, a litigância climática faz o seu percurso, estando o Estado português a ser colocado em tribunal pela

falha sucessiva em aplicar a Lei de Bases do Clima6.

Apesar dos passos que têm sido dados, o reconhecimento do crime de ecocídio, quer a nível nacional, quer

internacional, tem sido mais lento. Três países insulares do Pacífico levaram esta intenção ao Tribunal Penal

Internacional (TPI)7. Vanuatu, Fiji e Samoa, países especialmente vulneráveis aos efeitos das alterações

climáticas, alegam que o TPI deve reconhecer o ecocídio como um crime ao abrigo do direito internacional, a

par do genocídio e dos restantes crimes de guerra.

O conceito de ecocídio tem sido aplicado sobretudo no contexto de operações militares. E acaba por se

relacionar com os danos infligidos ao ambiente numa estratégia deliberada de guerra durante um determinado

conflito. Exemplo disso é o parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre o direito a um ambiente

saudável na União Europeia, em especial no contexto da guerra na Ucrânia8. Aqui se refere que «as ações da

Rússia parecem equivaler a um ecocídio», tendo o Comité solicitado que esta ação, tal como definida pelo Painel

de Peritos Independentes para a Definição Jurídica do Ecocídio, fosse estabelecida como infração penal ao

abrigo do direito da UE. O Comité referiu mesmo que o reconhecimento do crime de ecocídio na Diretiva

Criminalidade Ambiental revista conduzirá a avanços legislativos para lá das fronteiras da UE, em especial no

TPI, que podem contribuir para responsabilizar a Rússia pelos danos ambientais e ecológicos no território

ucraniano.

É do conhecimento comum o facto de a maior parte dos danos ambientais resultar da atividade de empresas

que procuram apenas maximizar o lucro, desconsiderando os limites planetários e o cumprimento dos Objetivos

do Desenvolvimento Sustentável, mas também negligenciando a conduta de responsabilidade social e ambiental

que hoje se exige ao sector privado. Os responsáveis diretos e indiretos por estes danos saem muitas vezes

impunes, deixando as populações a lidar com os impactos causados pela sua negligência. Um caso

paradigmático disso é o das minas de carvão de São Pedro da Cova, no concelho de Gondomar, em que a

remoção de resíduos perigosos levou quase 10 anos9. Este caso, reconhecido por muitos como um dos maiores

crimes ambientais em Portugal, só foi concluído quando a Justiça considerou que o procedimento criminal se

extinguiu por prescrição em 2020, razão pela qual os recursos apresentados pelo Ministério Público e pela junta

de freguesia não puderam ser julgados10. E isto apesar de a acusação afirmar que os arguidos «tinham todas

as condições para saber» qual a perigosidade dos resíduos, conheciam a composição química dos pós e sabiam

que estes iam poluir o solo e colocar em perigo a vida da população, não se inibindo, apesar de tudo, de o

fazer11.

Do mesmo modo, também o caso da Quinta da Rocha, na ria de Alvor – Sítio de Importância Comunitária ao

abrigo da Rede Natura 2000 –, em que um empresário foi condenado a dois anos de pena suspensa e à

obrigatoriedade de restaurar todas as espécies e habitats destruídos pela sua ação, é exemplificativo da

necessidade do avanço e do endurecimento do ordenamento jurídico português nesta matéria. A sentença, que

saiu em 2013, referia a obrigação de restabelecer todas as condições que anteriormente justificaram o elevado

estatuto de proteção ambiental da área e a interdição completa de atividades nas zonas de habitats protegidos

2 The creation of the crime of ecocide in French law unleashes passions – Navacelle 3 Belgium becomes first in EU to recognize ecocide as international crime. 4 Supreme Court pulls up Centre: Every citizen has right to environment free of pollution – India News – The Indian Express 5 South Korea’s climate law violates rights of future generations, court rules – South Korea – The Guardian 6 Litigância climática: Portugal já acordou para o direito do clima? – Justiça climática – Público 7 Ecocídio a par de genocídio e crime de guerra? Ilhas do Pacífico levam proposta a TPI – Justiça climática – Público 8 Parecer do Comité Económico e Social Europeu — Direito a um ambiente saudável na União Europeia, especialmente no contexto da guerra na Ucrânia (parecer de iniciativa)(2023/C 228/02) 9 Concluída remoção de resíduos perigosos em São Pedro da Cova (Portugal 2020) 10 Relação conclui que caso de resíduos perigosos de São Pedro da Cova prescreveu – Observador 11 Ministério Público pede condenações por crime ambiental em São Pedro da Cova – Público