19 DE JUNHO DE 1991
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liquidação respeitante ao mencionado exercício, como reconhece o director distrital de Finanças de Aveiro no seu depoimento.
Além disso, o SEAF, apesar das dúvidas que tinha quanto aos montantes presumidos, não aceitou a proposta do director de Serviços de Justiça Fiscal, no sentido de que fosse deferido o segundo requerimento da Campos, S. A., no qual solicitava a dispensa do pagamento de juros e multas respeitantes a impostos em dívida.
Obviamente que nenhum daqueles actos é censurável, nem em nosso entender o são as determinações no sentido de confrontar o trabalho dos serviços de fiscalização de Aveiro com os valores agregados do sector.
Estava o SEAF na presença de montantes presumidos de que duvidava. Procurou a resposta na utilização dos «índices» da DGCI, o que é perfeitamente justificável. São instrumentos de análise comparativa susceptíveis de evidenciarem desvios que tanto podem servir para agravar como para desagravar situações fiscais dos contribuintes.
O conhecimento que este tinha do sector, as notícias verdadeiras que corriam sobre um processo crime — contrabando — que envolvia a administração da Campos, S. A., e o método utilizado pelo NFE de Aveiro podem justificar as reticências relativamente aos valores apurados pela fiscalização da DGF.
É legítimo ao membro do Governo procurar averiguar do rigor e objectividade dos trabalhos de natureza técnica que lhe são submetidos para definição de um direito subjectivo, para uma decisão definitiva. Trata-se de um comportamento que se subsume no quadro dos poderes de orientação c tutela, sempre exigível no caso de um despacho que não aceita a fundamentação técnica como suporte de decisão. Não se vislumbra neste procedimento do SEAF qualquer irregularidade, ilegalidade ou até menor consideração devida aos subordinados.
A intervenção do SEAF, em casos da natureza e complexidade como a do que se aprecia, é justificável e foi, aliás, solicitada por diversas vezes. Ao membro do Governo é que compete assegurar os valores da imparcialidade e da uniformidade da actividade administrativa, como fazer prevalecer o interesse público.
«A intervenção do Secretário de Estado como instância de recursos, revisão ou substituição é necessária como instância mais qualificada para realizar a interpretação/ aplicação das normas de direito fiscal nos quadros do sistema jurídico português, não só porque é membro do Governo como porque lhe compete orientar a execução de política fiscal (")•» No caso em apreço, a intervenção do SEAF, mesmo determinada pelo facto de considerar exagerados os montantes presumidos, não se desviou da defesa dos interesses do Estado (Fazenda Nacional). Prova-o a decisão sobre a aplicação do sistema de tributação do grupo B da Cl. Nem deixou de se pautar por propósitos de rigor e objectividade, como resulta do seu procedimento relativamente à não aceitação da proposta da Direcção de Serviços de Justiça Fiscal.
7.2 — O despacho de 21 de Maio de 1990 do SEAF. — Parece não haver dúvidas —reconhece expressamente o próprio Secretario de Estado dos Assuntos Fiscais e testemunham-no as empresas Campos, S. A., e Celulose do Caima— de que o terceiro requerimento da Campos, S. A., que mereceu o despacho de 21 de Maio de 1990 do SEAF, é originado pela necessidade de clarificar e quantificar a situação da empresa perante o Fisco, tendo em vista a venda de um substancial lote de acções representativo do seu capital social, precisamente à Celulose do Caima.
Nesse seu terceiro requerimento, a Campos, S. A., solicita: que seja aceite o pagamento dos impostos em dívida com dispensa de pagamento de juros e multas; que sejam declarados extintos os processo de execução pendentes; que se considere, para o efeito de encontro de contas, a quantia já paga pela empresa; que a decisão que venha a merecer o requerimento não prejudique as reclamações contra os montantes presumidos oportunamente apresentados pela empresa e das quais não desiste.
Sobre o requerimento, informado por um membro do seu Gabinete, decidiu o SEAF, admitindo que o fazia com fundadas dúvidas sobre os montantes presumidos e a sua conformidade com a actividade real da empresa, mas que a transacção não deveria ser inviabilizada.
Determina ainda no mesmo despacho a realização de uma segunda fiscalização que reveja todo o trabalho, com rigor e objectividade.
Embora o despacho de 21 de Maio de 1990 do SEAF tenha recaído sobre uma informação com o n.9 162/90, elaborada por um membro do seu Gabinete, que se pronunciava no sentido de ser dada resposta favorável aos requerimentos formulados pela Campos, S. A. (consideração da quantia de 1 018 920S paga; dispensa do pagamento de juros e multas; extinção das execuções instauradas e levantamento das apreensões; não preclusão das reclamações efectuadas), não é linear que ele tenha concordado com toda a informação, sobretudo com o seu alcance.
No mencionado despacho de 21 de Maio de 1990, o SEAF renova as dúvidas sobre os montantes presumidos, que lhe parecem francamente exagerados, pois que se trata de uma empresa que vinha laborando com graves dificuldades num sector que esteve em crise acentuada até ao limiar de 1987 e determina uma nova fiscalização, tendo em vista rever todo o trabalho anteriormente feito, com rigor e objectividade.
Cerca de um mês depois o SEAF, indagando sobre o início da fiscalização ordenada, reiterará as suas dúvidas sobre os montantes presumidos e sublinhará não ter querido prejudicar o processo negocial em curso.
Resulta claro que o SEAF nunca considerou definitiva a situação da empresa perante o Fisco. O seu despacho pecara todavia por não consubstanciar uma «resposta clara e fundamental» ao pedido da empresa Campos, S. A., talvez porque tenha querido conciliar a viabilização da transacção em curso com a não definição da situação tributária da empresa e simultaneamente arrecadar para os cofres do Estado a quantia de 181 563 contos, a pronto, o que de outro modo não iria conseguir.
O despacho de 21 de Maio de 1990 do SEAF não é constitutivo, definidor de um direito subjectivo.
Não tem, por isso, carácter conclusivo, fazendo depender a definição da situação do contribuinte dos resultados de uma segunda fiscalização que apurasse valores reais, que com «rigor e objectividade» fixasse definitivamente, a obrigação fiscal. A definição da situação fiscal da empresa Campos, S. A., ficou suspensa por uma condição: os resultados da nova fiscalização determinada cm 21 de Maio de 1990. Trata-se do estabelecimento dc uma condição voluntária dc eficácia do acto administrativo praticado (12).
Nem a empresa requerente quis que o despacho que viesse a recair sobre o seu terceiro requerimento fixasse definitivamente a sua situação tributária, porquanto expressamente declarou naquele seu requerimento não desistir das «reclamações oportunamente apresentadas».