13 DE DEZEMBRO DE 1990
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acrescentado nem em termos da participação no emprego dos diversos sectores e empresas. Não se alterou o peso de determinados sectores e empresas, em que a vantagem comparativa por excelência são os salários baixos. Pelo contrário, se analisarmos alguns indicadores indirectos, poderemos extrair ilações extremamente preocupantes sobre essa evolução estrutural.
Por outro lado, em termos de tipo c qualidade do emprego, é sabido que a situação também não melhorou. É que, quanto a vínculos e direitos dos trabalhadores, a situação não 6 melhor do que era há quatro ou cinco anos, a começar pelos contratos a prazo que, hoje em dia, são bastante mais importantes percentualmente do que o eram nessa altura — 19 % actualmente contra 13 % em 1985.
É evidente que avaliamos positivamente o aumento quantitativo do emprego, mas não podemos deixar de manifestar muita preocupação com o que se passa cm termos de qualidade do emprego, até porque este é um problema que afecta o futuro das próprias empresas e a capacidade de formação e de desenvolvimento do nosso tecido produtivo.
Sem que isso se deva à crise do Golfo, porque foi antes de esta se desencadear, também ao nível de alguns indicadores de conjuntura mais vulgares se verifica que subiu a taxa de inflação, em vez de descer como tinha sido prometido. A evolução das contas públicas também não foi das mais positivas durante 1990 e, embora o ano não esteja encerrado, em matéria da evolução da balança de bens e serviços as últimas informações são um pouco contraditórias relativamente à expectativa muito optimista sobre a balança de transacções correntes, que nos foi transmitida cm sede do debate na generalidade. Mas cá estaremos, nos próximos meses, para ver o que acontecerá.
Por outro lado, se é verdade que houve aumento nos salários reais, é também verdade que o aumento dos impostos não foi feito com equidade, que houve um aumento grande das desigualdades sociais, que houve uma transferência de valor muito grande de alguns portugueses para outros c que os quadros da distribuição do rendimento nacional, embora não mostrem tudo, mostram uma parte do que acabo de dizer.
Também é verdade que, cm áreas socialmente prioritárias, como a saúde, a educação ou a habitação, o panorama é extremamente preocupante.
Há ainda um terceiro problema no que toca às GOP.
Para além de conterem esta deficiência de análise do presente, este excesso de optimismo, as GOP têm também, um défice de humildade e de capacidade de autocrítica cm relação ao passado.
E que se agora, à semelhança de há alguns anos atrás, se vem dizer que o nosso modelo de especialização atribui demasiado peso a actividades de trabalho intensivas e com uma compeli ti vidade externa que assenta frequentemente em custos salariais baixos, então seria preciso extrair algumas conclusões destas afirmações. Se a situação continua a ser esta, certamente haverá um papel negativo da sociedade civil, mas o Estado também não é completamente neutro nem tem uma mera função de árbitro nesta matéria.
Qual foi, então, o papel desempenhado pelo Estado Português c, cm particular, pelo Governo Português nos últimos anos no sentido de combater esta situação?
É porque a situação não pode ser analisada como se este diagnóstico não tivesse sido já feito, há alguns anos atrás, e como se nada se tivesse passado entretanto. Não se retiraram conclusões sobre as políticas que o Governo
seguiu nos últimos anos. Mais ainda: julgo que houve políticas erradas nos domínios económico e social que não transformaram suficientemente as estruturas produtivas mas que, pelo contrário, estimularam a conservação e incentivaram adiamentos de mudanças muito importantes aos níveis microcconómico e estrutural.
Em quarto lugar, há um défice de credibilidade nos objectivos que são apontados, porque todos os anos são os mesmos, não se notando uma grande melhoria na passagem das palavras aos actos objectivos, que, obviamente, são consensuais.
Quando se refere a «afirmação de Portugal no mundo», a «modernização e o crescimento sustentado da economia»,
a «dimensão social e a qualidade de vida dos cidadãos», não há um só português que esteja contra estes objectivos.
No entanto, o que se passou nos anos anteriores parece constituir um desmentido às promessas que são feitas para o próximo ano, porque, na verdade, mantém-se a mesma linha.
Por exemplo, fala-se na necessidade de «mobilizar vontades e energias, a partir de objectivos c estratégias claramente definidas». Ora, se o Sr. Ministro perguntar aos agentes económicos e sociais, da agricultura ou da indústria, se consideram que está claramente definida a estratégia para o País, se fizer um inquérito como o que foi distribuído junto dos municípios, certamente que ainda será mais esmagadora a percentagem das respostas que vão num sentido não muito positivo para o Governo, porque os sinais que o Governo transmite aos agentes económicos são altamente contraditórios c pouco claros.
Por fim, julgo que também há um défice de compreensão do que deveriam ser umas GOP anuais.
É que, para além de não ter sido assumida qualquer capacidade de autocrítica cm relação ao passado c de haver irrealismos quanto ao futuro imediato, no texto há análises c propostas que fazem tábua rasa do que foram as responsabilidades do actual governo, apresentam-se linhas de orientação estratégica, por exemplo, sobre a modernização produtiva e a nova especialização internacional, sobre a estrutura empresarial c a modernização produtiva, sobre o papel do Estado c dos parceiros sociais na modernização, sobre a perspectiva regional, tudo exemplos de perspectivas contraditórias com o que se tem passado na prática.
Há, pois, uma desarticulação entre o texto c a realidade — aliás, para confirmá-lo basta-nos analisar alguns aspectos deste texto.
Tomemos, por exemplo, o «novo contexto internacional e comunitário». Este contém pontos polémicos e lacunas significativas como a da questão espanhola levantada, em sede do Plenário, pelo meu camarada Manuel dos Santos. No entanio, quanto a mim, esta é a parte mais interessante das GOP. Este texto leria pleno cabimento numas GOP de médio prazo e, a curto prazo, para 1991 nao deixa de ser indubitavelmente muito interessante. Mas que respostas concretas dá o Orçamento para 1991 àquele texto, aquele conjunto enorme de desejos, de afirmações, de altíssimos objectivos estratégicos? Verifica-se uma inconsequência toial na relação entre o texto c a política concreta que daí deveria derivar.
Há uma enorme desproporção entre as ilações passíveis de tirar da grandeza de uma análise de tal maneira globalizante c as respostas contidas no quadro das acções propostas.
No debate, na generalidade, afirmou-se que as GOP não passavam de «música celestial», não fui eu próprio a