O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

20 DE JULHO DE 1996

174-(267)

várias matérias (princípio da imediação, da economia processual). Mas que a dificuldade e complexidade do tema não sirva de alibi, para se não defender e consagrar o registo da prova, em termos tais que tal possa consistir uma garantia dos cidadãos perante a administração da justiça.

No relatório do seu Projecto do Código de Processo Civil, de 1935, o Prof. Alberto dos Reis clamava que «é bom que a justiça seja pronta, mas é igualmente bom que a justiça seja justa».

Terminando, concluiremos com-Pessoa Vaz quando afirma que é necessário defender um dos maiores valores, porventura o maior, da Administração da Justiça do nosso tempo, o da «realização da Paz e da Segurança entre os indivíduos, de forma, simples, rápida e económica, mas

segundo um rigoroso critério de Verdade e de Justiça» í24).

Contributo do Provedor de Justiça para a obra «Independência e a Unidade da Judicatura», Abril de 1994

É com muito prazer que o Provedor de Justiça acede ao honroso convite formulado pelo Autor para exprimir nesta Obra a sua opinião sobre a «Independência e Unidade da Judicatura».

Apesar de o convite me ter sido dirigido de um ponto de vista institucional, não posso esquecer a minha qualidade de Magistrado, posto que em situação de licença, razão pela qual tentarei nestas breves linhas transmitir a perspectiva de alguém que, após experimentar a vida forense nas suas três carreiras mais significativas, se encontra neste momento a servir de mediador entre o Poder e o Cidadão.

Característica essencial do nosso Estado nos últimos 150 anos, a separação de poderes, quer entendida da forma mecanicista própria do oitocentismo de matriz francesa, quer da forma integrada e funcionalizada da doutrina moderna, tem constituído um poderoso instrumento de garantia dos direitos do cidadão face ao Poder, pela constituição de mecanismos internos de controlo.

A instituição judicial é hoje, como sempre foi, propugnada como o instrumento por eleição para a defesa dos direitos subjectivos e da legalidade. Se a forma de designação não era permeada pela mesma democraticidade que caracterizava os demais órgãos do poder, a sua estreita e estrita ligação à vontade democraticamente expressa em Lei permitia conciliar a independência necessária com a garantia do controlo eleitoral.

A visão do juiz como um aplicador mecânico da Lei, mero transmissor de mensagem sem ruído nem perda, não é compaginável com as correntes mais recentes na Teoria da Aplicação da Lei. O juiz, ao interpretar-aplicar determinado normativo, age segundo a sua percepção pessoal do que é o Direito (mas não, desejavelmente, segundo a sua intuição do que ele deveria ser). Isto explica as especiais cautelas que hodiernamente se têm com a formação dos magistrados. Em Portugal é de louvar a acção exercida nesse domínio pelo Centro de Estudos Judiciários, instituição dependente do Ministério da Justiça, sem que esse facto em nada diminua a sua valia.

Não podendo existir poder sem controlo, cada vez mais se tem debatido a forma de conciliar a independência dos juízes, com as suas garantias acessórias como a inamovibilidade, com a solução a dar à clássica interrogação de Juvenal «Quis custodes custodiei»,'evitando suspeições so-

(M) In R. O. A.. 1986-III. pág. 673.

bre a possibilidade, sempre presente, de governo de juízes ou sobre a bondade de actuações recentes da magistratura com influência determinante na evolução do sistema político.

As problematizações contemporâneas deste tema têm girado em torno do dilema criado pelo autogoverno e pela sujeição à Constituição e à lei.

Será que a alternativa possível é entre um neocorporati-vismo ou a dependência fatal e inexorável face aos demais órgãos do Estado? Parece-me uma falsa questão.

A existência de Conselhos Superiores de Magistratura como únicos órgãos com competência disciplinar sobre a judicatura parece ser um dado adquirido. Já a sua composição parece-me poder ser alvo de melhoramentos vários, no sentido de reafirmar e assegurar a legitimidade da sua actuação e no sentido de aproximar a comunidade judiciária da comunidade política, base da sua sustentação e razão da sua existência. A este propósito poderia ser útil encarar a possibilidade de introdução de elementos não juristas nos mencionados Conselhos.

A este propósito, coloca-se um problema essencial na determinação do grau de independências tribunais, mais gritante no modo como se antecipa e enquadra a função jurisdicional, qual seja o da legitimidade dos órgãos judiciais.

Numa primeira abordagem, não basta a existência de normas do género descrito para se afirmar uma legitimidade democrática. Quod nimis probat nihl probat.

É, então na existência de um controlo externo, assegurado por vias mediatamente provindas do voto popular, que estará a compatibilização da independência imprescindível com a sujeição, não menos imprescindível, ao único titular da soberania — o Povo. A meu ver, a solução está no alargamento dos Conselhos Superiores da Magistratura à designação por via da cooperação entre órgãos de soberania com legitimidade democrática e à sua abertura a titulares oriundos de estratos sócio-profissionais que não a própria magistratura.

Problema com grandes afinidades aqueloutro enunciado é o da unidade da organização judicial. Poderá a existência de várias ordens de jurisdição comprometer, talvez irremediavelmente, a possibilidade da manutenção da independência desejada? Julgo que não é assim.

A tradição portuguesa já com uma centena de anos, admite, sem quebra de qualidade, a existência de ordens jurisdicionais autónomas e bem distintas.

É o caso, hoje constitucionalmente imposto, dos Tribunais Administrativos que têm vindo a provar, à saciedade, não poderem ser considerados como braços jurisdicionais de facto da administração pública.

Opinião diferente tenho sobre os Tribunais Militares; admitindo, a custo, a necessidade, sequer a utilidade, da sua existência, a sua actual configuração legislativa e a sua prática impõem bastas reservas, maxime quanto à sua constitucionalidade.

Se quanto ao seu âmbito tenho dúvidas sobre a bondade da solução vigente, já no que toca. à forma orgânico-processual actual parecem-me existir traços justificativos de uma alteração urgente, seja por meios legislativos, seja por meios de outras natureza.

Não falo de recentes polémicas, quiçá injustas para as pessoas envolvidas, resultantes da errada e inconstitucional atribuição de competências não jurisdicionais a um órgão que a Constituição apenas quer que funcione como Tribunal.