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1464 II SÉRIE - NÚMERO 47-RC

de positivismo ideológico, no sentido de a lei ter de ser obedecida a qualquer custo e ter um conteúdo justo só pelo facto de o ser. Estou-me a lembrar de uma citação sobre o problema da lei e dos princípios materiais que se lhe devem colar, referindo o autor que a lei tem um minimal content of natural law, isto é, há sempre um conjunto de princípios materiais que não podem existir desgarrados da lei. O que o PS aqui pretende não é criar uma certa libertinagem no modo de fazer o direito e de o aplicar; é, pelo contrário, imprimir à lei aqueles valores materiais, sem os quais a lei não pode ser justa, que não se baseiam numa versão contingente de leituras jusnaturalistas puras, antes obedecem aos parâmetros de uma moral kantiana universalista que tem a ver com a rejeição do positivismo ideológico e com a aceitação de fundamentos materiais que estejam ligados ao princípio da liberdade e da dignidade da pessoa humana. Não quer dizer mais do que isso, nem quer subtrair à lei qualquer tipo de valoração como ponto decisivo para a criação das decisões pelos tribunais.

O Sr. Presidente: - Mas, como sabe, Sra. Deputada, a proposta não irá ser aprovada da mesma maneira.

Passemos à discussão do artigo 209.° O PCP, no seu projecto de revisão, faz uma proposta de aditamento ao prever um n.° 2 assim concebido: "Nas suas funções de investigação, os órgãos de polícia criminal actuam sob a direcção dos magistrados judiciais e do Ministério Público competentes e na sua dependência funcional." Quer justificar, Sr. Deputado José Magalhães?

O Sr. Miguel Galvão Teles (PRD): - O PRD também prevê um aditamento do género, não sei agora onde, vou procurar...

O Sr. Presidente: - Descubra-o e depois analisamos a vossa proposta.

O Sr. António Vitorino (PS): - O PRD usou a técnica do caleidoscópio!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Magalhães, V. Exa. pretende justificar a proposta do PCP?

É possível que o Sr. Deputado Miguel Galvão Teles tenha querido incluir o preceito noutro lugar...

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Deputado Miguel Galvão Teles, V. Exa. está a referir-se ao artigo 224.° da vossa proposta?

O Sr. Miguel Galvão Teles (PRD): - Está no artigo 226.°-A...

Vozes.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Magalhães, passemos à sua exposição rapidamente.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, eu proponho que encetemos apenas a discussão, uma vez que me parece inadequado e inconveniente uma discussão sobre uma matéria deste tipo ser aberta e encerrada nestas condições.

O Sr. Presidente: - Não. Gostaríamos de o ouvir, para todos irem reflectir sobre a sua introdução durante o almoço. Fazia-se a discussão a seguir.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Certamente, Sr. Presidente. Esta é uma das matérias em que vale a pena gastar algum tempo, uma vez que está no coração das reflexões sobre a nossa legislação processual penal e sobre o papel e repartição de competências e poderes entre as diversas entidades que se devem mover na esfera processual penal, nos diversos tipos de funções antes e depois do processo e durante ele.

Discutimos tudo o que diz respeito à questão da actuação dos órgãos de polícia criminal, do papel do Ministério Público, da relação de necessária dependência funcional entre as entidades policiais e as que se movem na esfera dos tribunais: juizes e Ministério Público. Quando debatemos aqui a reforma processual penal que neste momento se encontra em vigor (mais em palavras, de resto, do que na realidade), um dos aspectos fulcrais é, precisamente, que os órgãos de polícia criminal não actuem senão sob a direcção de magistrados, dentro da respectiva repartição de competências e na sua dependência funcional. Este é um dos pontos em que mesmo os mais acérrimos defensores da reforma processual penal, legalmente plasmada, têm de convir em que é preciso uma solução que dê cumprimento a essa dependência funcional, sob pena de subversão radical de funções e de confusão entre justiça e polícia, que é, de todas, a mais crassa e grave de todas as confusões.

Aquilo que nós aqui fazemos não é uma reforma processual penal "em pacote", não é um condensado: é uma norma de garantia, uma norma de topo, uma norma "económica", na medida exacta em que não procura ter uma dimensão que exceda a razoável em termos constitucionais. A dimensão não é a questão: a questão é a precisão, o rigor e a adequação para a finalidade que importa salvaguardar. A sede parece-nos adequada.

Não queria polemizar com o Sr. Deputado Miguel Galvão Teles nesse ponto, mas esta inserção parece-nos correcta. Podíamos ter colocado uma norma deste tipo em direitos, liberdades e garantias quando se discute a questão da instrução criminal. Pareceu-nos, no entanto, que isto transcende essa óptica. Diz respeito a todos os aspectos co-envolvidos e, portanto, esta sede, em que se referem os tribunais e o relacionamento entre estes e as autoridades (incluindo as policiais, naturalmente), é a mais correcta para o efeito que buscamos.

A norma é um tanto subtil, quando não distingue -e remete, de certa forma, para a lei- a repartição de competências entre as duas magistraturas. A norma tem em conta um determinado modelo de repartição de competências que é o constitucional. Sabe-se que a leitura desse modelo constitucional tem sido feita de forma diferenciada. Neste momento foi feita em termos de- lei ordinária de uma determinada maneira que nos parece iminentemente criticável e constestável. Em todo o caso, esta norma transcende essa querela do modo como está redigida. É uma formulação sucessivamente flexível para apenas salvaguardar o imperativo supremo, qual seja direcção-dependência funcional/separação entre justiça e polícia. É essa a consignação máxima da proposta.