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20 DE OUTUBRO DE 1988 1477

cing ou de um pedido feito pelo primeiro-ministro em exercício. E o que o eleitorado é chamado a julgar não é tanto o acto do Chefe do Estado, mas é, essencialmente, a governação do pimeiro-ministro que se recandidata e que provocou a dissolução do Parlamento, no caso inglês, no espanhol e até no caso austríaco, embora o presidente federal tenha mais poderes do que a rainha de Inglaterra ou que o rei de Espanha, mas a prática tem demonstrado que, em virtude do relacionamento entre o sistema partidário e o Chefe do Estado, a realidade é equiparável. Onde essa situação em regra não se verifica é nos regimes semipresidenciais, em que o Chefe do Estado é eleito por sufrágio directo e universal - o caso típico do francês e do português. Também aí a comparação não pode ser levada demasiadamente longe, porque, até à experiência da coabitação, havia uma identidade política entre o Chefe do Estado e a maioria parlamentar em França. Mas no caso português, o acto de dissolução da Assembleia da República envolve sempre um risco para o Chefe do Estado, quando o pratique, que é o de saber se o eleitorado vai coonestar, através da indicação de voto que vai sair do sufrágio, a própria decisão do Presidente da República, ou vai infirmá-la. E, portanto, no sistema semipresidencial português, o acto de dissolução da Assembleia da República é sempre um acto que, de uma maneira ou de outra, envolve, em segunda linha pelo menos, um juízo de valor sobre a decisão do próprio Presidente da República. Mas é por isso mesmo que a decisão do Presidente da República é uma decisão discricionária, no sistema político português, não é uma decisão condicionada - não é sob proposta do Primeiro-Ministro, não é (como já foi na versão originária de í 976) mediante parecer prévio favorável de um órgão (como o Conselho da Revolução); é um acto livre. E é em boa parte nessa liberdade da prática do acto de dissolução que se justifica o facto de o Presidente da República, ser eleito por sufrágio directo e universal. E a verdade é que,...

O Sr. Presidente: - Até aqui, tudo bem.

O Sr. António Vitorino (PS): - ... em meu entender, não resulta qualitativamente distinta a decisão e o julgamento popular sobre o acto do Chefe do Estado de dissolução do Parlamento, quer essa dissolução decorra do accionamento do mecanismo de moção de censura construtiva, quer ela decorra do accionamento do mecanismo de moção de censura não construtiva. E pode resultar - dirá o Sr. Deputado Rui Machete - sob o ponto de vista psicológico.

O Sr. Presidente: - Político!

O Sr. António Vitorino (PS): - Isto é, o Chefe do Estado pode-se sentir, politicamente, menos à vontade para dissolver o Parlamento quando o faz contra uma maioria parlamentar que apoiou a indicação de um primeiro-ministro. É uma concepção legítima que, por acaso, o exemplo histórico português desmente. A interpretação, sincera e honesta, que faço da decisão do Presidente da República, de dissolver a Assembleia da República em 1983, contra uma maioria existente no Parlamento, que era a maioria da AD, e contra um primeiro-ministro indigitado por essa maioria, demonstra que, para decisões desse tipo, não é inevitável o desfecho que o Sr. Deputado Rui Machete antevê, de que o Presidente da República se encontre tolhido na sua decisão. Não é inevitável! Não estou a dizer que a situação que o Sr. Deputado Rui Machete prefigura não se possa verificar; estou apenas a aduzir um exemplo histórico em que não havendo moção de censura construtiva, em que existindo uma maioria parlamentar formada por dois partidos, em que esses dois partidos, tendo chegado a acordo na indigitação de um primeiro-ministro cujo nome chegou a ser formalmente entregue ao Presidente da República, o Presidente da República decidiu, mesmo assim, sem moção de censura construtiva, correr o risco de ouvir o eleitorado e de verificar que a sua decisão foi acertada, porque o eleitorado não reconfirmou a maioria existente no Parlamento.

O Sr. Presidente: - V. Exa. dá-me licença? O que eu quis dizer e que, de resto, reafirmo é isto: a circunstância de a lei constitucional vir claramente afirmar que, na hipótese de uma moção de censura com indicação do primeiro-ministro futuro, o Presidente da República - se quiser manter a legislatura - só tem por hipótese a sua designação, indicia, do ponto de vista do juízo político, uma prevalência do Parlamento sobre o Presidente da República, em termos justamente da sua competência para a resolução das crises políticas, que não é despicienda. E, portanto, se o Presidente da República, prevalecendo-se de uma liberdade que ainda a Constituição lhe dá, mas embora com um estatuto menor, "afrontar" o Parlamento, os riscos políticos da sua actuação, e a própria legitimidade política da sua actuação, são claramente menores. É isto que digo e que me parece estar em contradição com a ideia básica da idêntica legitimidade resultante de ambos serem eleitos por um sufrágio universal e directo, de um lado a Assembleia da República, de outro lado o Presidente da República. Quer dizer: dá-se um passo, e um passo importante, em sentido contrário. A mim o que me impressionou na argumentação que V. Exa. expendeu, há pouco, foi isto: é que V. Exa. expendeu uma argumentação muito na linha de um parlamentarismo racionalizado, argumentando a favor de uma das armas, entre outras, sem lhe atribuir um significado particularmente importante. E o que eu digo é que este passo indicia uma alteração do sistema político com enorme importância e relevância não tanto pelo mecanismo estritamente jurídico - mas é que nós não podemos, como sabe, interpretar a Constituição como um código civil (há quem o faça, mas nós não o devemos fazer) - e esta alteração, a meu ver, atinge uma relevância que não podemos negar-lhe, nem estar cegos perante ela. É isso que particularmente me impressiona. Na vossa argumentação há este aspecto, que me parece verdadeiramente fulcral, das relações entre os poderes do Presidente da República e da Assembleia da República, antes e depois da introdução da moção de censura construtiva, e, quando falo delas, não estou a fazer uma mera aritmética, nem V. Exa. está, mas, às vezes, há uma certa propensão para ver se é mais uma alínea ou menos uma alínea. Não é isso! É o posicionamento global no funcionamento do sistema político do Presidente da República que é afectado, a meu ver. Sinceramente, penso que isto existe.

O Sr. António Vitorino (PS): - Nós, nesse sentido, não estaremos de acordo, nem tenderemos, no infinito, a estar de acordo. O Sr. Deputado Rui Machete no fundo diz que uma alteração deste género acabaria por ter como