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1478 II SÉRIE - NÚMERO 47-RC

corolário lógico defender uma reapreciação integral do papel do Presidente da República no sistema político, o que decerto desembocaria, inevitavelmente, na defesa da tese da eleição indirecta do Presidente da República e da desnecessidade de conferir ao Presidente da República a legitimidade do sufrágio directo e universal. Não é essa a nossa posição. Não è esse o sentido da nossa proposta. E, sinceramente, com o mesmo à-vontade e a mesma segurança com que o Sr. Deputado me disse o que acabou de dizer, eu lhe digo o contrário: não será esse, o desfecho da introdução do mecanismo da moção de censura construtiva no sistema político português. E isto porque nós não concebemos que se trate de uma alteração da liberdade de decisão do Presidente da República, porque entendemos que não há diferenças qualitativas entre a liberdade de decisão do Presidente de dissolver o Parlamento perante uma moção de censura construtiva e perante uma moção de censura não construtiva; o que entendemos, como disse na minha intervenção, é que há um descentramento do momento da decisão do Presidente da República sobre a dissolução da Assembleia da República, que só ocorre depois de comprovadamente esgotadas as possibilidades do Parlamento gerar soluções governativas estáveis. E, nesse sentido, o que diremos é que, de acordo com a interpretação que fazemos da função moderadora e arbitral do papel do Presidente da República no sistema político, o recurso à dissolução deve ser sempre tido como de natureza excepcional e, portanto, tudo o que nós fizermos no sistema político para preservarmos o Presidente da República da necessidade de recorrer a esse mecanismo é um contributo para o reforço da estabilidade governativa e, neste sentido, haverá entre nós uma diferença de apreciação do significado da conjugação dos mecanismos de formação de governos em sede parlamentar e de accionamento do mecanismo de dissolução do Parlamento.

É óbvio que estou de acordo com a observação que o Sr. Deputado Rui Machete fez sobre o significado da moção de censura quer face à experiência da República de Weimar, quer na RFA, quer em Espanha. O que só demonstra - e poderíamos alongar-nos neste ponto, mas não o farei - que o que torna relevante a leitura do significado concreto da moção de censura construtiva, na sua origem histórica e nos casos em que houve condições para aplicar em concreto o mecanismo, não é tanto o fetichismo das soluções institucionais (que não defendo, nem defendi e procurei situar na sua devida proporção), mas a relevância da conformação do sistema partidário para a eficácia dos próprios mecanismos institucionais. E, nesse sentido, assumi, com humildade, mas com objectividade, que, na nossa interpretação, a moção de censura construtiva é grandemente tributária da natureza concreta do sistema partidário existente no regime em que vigora, é tributária do sistema partidário, mas tem também uma função conformadora desse mesmo sistema partidário. E não é um mecanismo institucional despiciendo na formulação do posicionamento dos partidos políticos face ao exercício do poder. E vemos, nesta segunda vertente, virtude inegáveis na sua introdução no sistema político português.

Uma última observação. É óbvio que o problema da estabilidade governativa pode colocar-se noutros terrenos - no terreno do sistema eleitoral, no terreno das fórmulas de representação - e o PS, com a proposta

da moção de censura construtiva, o que pretende exactamente evitar é que o País atravesse períodos sucessivos de instabilidade governativa em que se generalize a convicção de que o valor da estabilidade justifica a amputação do valor da representação proporcional. E, mesmo assim, convinha meditar sobre as experiências europeias. Nos exemplos que poderiam ser escolhidos de 21 regimes democráticos à escala mundial entre 1945 e 1980, verificaremos que 17% do período de tempo em causa, nessas 21 democracias, foi preenchido por governos minoritários. Há países onde não há nenhuma experiência de governos minoritários, como a Nova Zelândia ou o Luxemburgo, a Austrália ou a RFA, a Suíça, a França durante a V República até às últimas eleições. E para esses países, e para esses sistemas políticos, a questão da moção de censura construtiva não faz sentido, não tem significado, é uma questão que não se coloca. Mas já, por exemplo - e aqui começa a ser interessante fazer o cruzar da malha entre o sistema partidário e o sistema eleitoral - entre 1945 e 1980, 10 % deste período de tempo, no Reino Unido, foi preenchido por governos minoritários, e é um sistema eleitoral maioritário a uma volta, onde um partido com 34 % dos sufrágios pode ter maioria no Parlamento - e aqui temos um exemplo claro de um sistema eleitoral ultramaioritário (mais maioritário do que este não pode haver) que, mesmo assim, num período significativo de tempo, desde a Segunda Guerra Mundial até 1980, teve que recorrer, em 10% deste tempo, a governos minoritários. Veja-se, por exemplo, o sistema irlandês que é um sistema proporcional com um método típico de conversão de votos em mandatos, 22% do período de tempo em causa foi preenchido com governos minoritários; o Canadá, por exemplo, 27%; a Noruega, 33%, com um sistema também proporcional; a Dinamarca, um sistema proporcional com um método bastante complexo de conversão dos votos em mandatos, 68% do período entre 1945 e 1980 foi preenchido por governos minoritários; na Finlândia, um exemplo de um sistema semipresidencial, 25% do tempo foi preenchido com governos minoritários; na Itália, um sistema proporcional sem cláusulas barreiras, um sistema pluripartidário da grande dispersão partidária, 36% do tempo foi preenchido com governos minoritários; a França da IV República, que é o exemplo mais flagrante, 40% do tempo foi preenchido por governos minoritários. Enfim, os números demonstram que entre 1945 e 1980, nas 21 democracias tomadas em linha de conta no estudo que estou a citar que é baseado em dados fornecidos por várias fontes, 17% desse tempo foi preenchido com governos minoritários, e em sistemas políticos onde vigoram sistemas eleitorais completamente distintos entre si. E se quisermos exemplo mais flagrante teremos até os exemplos mais recentes destes dois últimos anos. Em países com sistema proporcional onde - se recordarmos as velhas regras do Professor Duverger - esses sistemas proporcionais teriam maior dificuldade em gerar maiorias de governo, dois sistemas proporcionais que usam o método de Hondt - que, como todos sabemos, é o método de conversão de votos em mantados que leva mais longe a proporcionalidade e que menor desvio garante entre a proporcionalidade concreta e aquilo que seria um conceito de proporcionalidade pura - em dois sistemas proporcionais baseados no método de Hondt, o sistema eleitoral gerou maiorias de governo: o por-