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20 DE OUTUBRO DE 1988 1485

e do PCP franceses onde poderia funcionar amplamente essa solidariedade republicana, ela também não funciona, tendo os socialistas franceses preferido formar um governo minoritário com abertura ao centro do que uma coligação com os comunistas. Esta situação corresponde também a uma fase histórica de relativo declínio político e eleitoral do Partido Comunista Francês e de progressão do Partido Socialista Francês, não tanto quanto os próprios socialistas franceses desejaram, mas, o simples facto de terem hoje o Presidente da República e um governo em França, não pode deixar de ser interpretado como tendo consequência no conjunto do sistema partidário francês.

A verdade é que o que a moção de censura construtiva causa ao PCP é um verdadeiro horror, como o Sr. Deputado José Magalhães muito neo-realisticamente nos deixou perceber, um horror enroupado em razões de Estado mas que tem como cerne apenas dois pontos. O primeiro ponto é identificar a proposta de moção de censura construtiva por parte do PS como apenas norteada por abjectos e mesquinhos interesses partidários dos socialistas - essa é a cor; e, em segundo lugar, manifestar-se contra ela pelos mesmos mesquinhos e abjectos interesses partidários do PCP, considerando que a aprovação da moção de censura construtiva constituiria um tipo de morte na capacidade de constrangimento de um poder centrado no PS, que assiste ao PCP em virtude da natureza do sistema partidário hoje existente em Portugal. E é essa medida de descontrangimento da capacidade impositiva do PCP, face a um poder centrado no PS, que o PCP não quer ver arredada. Por razões de Estado? Bom, o Sr. Deputado José Magalhães bem as tentou enroupar em razões de Estado, mas o que o fez correr são verdadeiras razões partidárias, as quais eu não enjeitei no que diz respeito à nossa própria proposta de alteração do sistema partidário. O receio, no fundo, é de que a moção de censura construtiva, a ser consagrada, cortasse cerce a via, já de si bastante estreita, que o PCP tem face ao exercício do poder: a via do condicionamento. Pelo contrário, o que nós dizemos é que é bem preferível que os valores da estabilidade governativa sejam ressalvados através de mecanismos institucionais do que através do fervilhar do caldo de cultura que a prazo conduza a colocar a questão da alteração do sistema eleitoral e da amputação da representação proporcional, para tudo sacrificar ao valor da estabilidade governativa. E, nessa altura, o PCP compreenderá melhor por que é que a proposta do PS também tem a ver com os interesses da esquerda no seu conjunto e com os valores tradicionais da solidariedade republicana. Nós não somos detentores da verdade absoluta, nem temos a chave da evolução do sistema partidário. Cada partido, e o seu percurso próprio, influi determinantemente na evolução dos outros e, nesse contexto, a evolução por que o PCP está a passar, o significado do seu debate interno e o reposicionamento que dele possivelmente decorrerá no conjunto do sistema partidário português e na sociedade portuguesa, seja em que sentido for, é relevante para a interpretação da eficácia do sistema partidário na formação de maiorias estáveis em termos de Governo. O que nós não queremos enjeitar são as nossas responsabilidades nesse desiderato global, não fugimos a ser responsabilizados pela nossa actuação em concreto, temos o mesmíssimo estado de espírito e a mesmíssima exigência de análise do comportamento do próprio PCP.

O Sr. Presidente: - Se nenhum dos Srs. Deputados deseja usar da palavra, eu formularia cinco breves comentários a esta intervenção do Sr. Deputado António Vitorino, como creio ser indispensável, face ao contributo para uma discussão que ela própria representa.

Em primeiro lugar, o Partido Socialista reconhece claramente, abertamente, embora na sequência de um certo esforço de debate, que a solução que propõe tem virtualidades rigidificadoras, que diminui a flexibilidade da matriz originária constitucional neste ponto. É evidente que essa matriz já sofreu alterações decorrentes do posicionamento relativo do Presidente e da Assembleia e das alterações introduzidas na primeira revisão nesse domínio. Em todo o caso, esta alteração representaria, evidentemente, um passo de rigidificação ulterior e mais grave. O único argumento que, no fundo, o Sr. Deputado António Vitorino deduz para justificar esta quebra de flexibilidade é o chamado "argumento do pecado igual" ("não critiques tu o meu pecado porque tens na tua própria carne um de teor semelhante ou porventura mais agravado").

O exemplo que invoca parece-me, porém, particularmente infeliz. A proposta do PCP (como de resto já ontem pudemos abordar e a acta retrata) no tocante ao artigo 195.°, n.° 4, não tem outra consequência que não seja permitir que uma maioria simples (quando exista tal maioria simples) impeça que um governo se constitua se, ao ser investido, tiver contra si essa maioria. É apenas a supressão de um elemento de flexibilidade artificial, hoje previsto, que é um favor, um super favor e até um favor envenenado, por uma razão que é evidente: que caracteriza uma solução em que um governo minoritário tem contra si uma maioria, embora uma maioria não absoluta? A circunstância que um governo desses enfrenta é a de uma grande debilidade, quer em termos de subsistência, quer em capacidade de fazer passar a sua própria legislação, quer ainda em termos de afirmação do seu programa político. É um governo condicionado, hipercondicionado. Se um governo nem consegue ter, à partida uma maioria simples que o tolere, que o enjeite, que se cale, é dúbio que se possa considerar como tendo vitalidade mínima para "arrancar" para a governação. É esse apenas o significado da proposta do PCP! Não é assumida como uma proposta "racha governos" minoritários ou como uma proposta "ilegitimadora" de governos minoritários.

Menos ainda a proposta do PCP é susceptível de prefigurar o crime qualificado anti "solidariedade republicana", que o Sr. Deputado António Vitorino gostaria de ter na carteira para invocar em circunstâncias deste tipo. Perguntou estarrecido: "Pois se o PCP altera radicalmente a matriz originária da Constituição em termos de ilegitimar governos minoritários, por que é que, além de impedir a sua constituição quando houvesse contra eles uma maioria simples, não permite o seu derrube quando, depois de formados, haja uma maioria simples contra eles?!" Deliberadamente, o PCP não faz isso! A proposta que nós apresentamos mantém o regime constitucional quanto ao derrube dos governos. Portanto, um governo minoritário que consiga investidura e depois disso não tenha contra si uma maioria