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20 DE OUTUBRO DE 1988 1489

ou pode conduzir ao resultado de, com um presidente que tenha um comportamento diferente daquele que este tem tido, criar situações de grave tensão e de sensação para o Presidente da República de conflito entre as suas competências e o modo de eleição.

Devo, em todo o caso, dizer que o regime que hoje vigora e que veio da revisão de 1982 já é um regime dificilmente sustentável e não foi só por teimosia que o PRD quis regressar à fórmula da Constituição de 1976 e se tem sempre oposto à solução encontrada em 1982 e propôs, embora provavelmente isso não vingue, o regresso à fórmula de 1976. Porque, tendo-se suprimido a responsabilidade política do Governo perante o Presidente da República, se manteve um regime de responsabilidade limitada do Governo perante a Assembleia da República, isto é, não se pode dizer que um governo tenha a confiança da Assembleia. É um regime de responsabilidade limitada, no sentido de que o Governo pode não ter nenhum apoio parlamentar, bastando-lhe não ter a oposição da maioria da Assembleia da República. É teoricamente possível um programa de governo passar, não ser aprovado, mas passar, e um governo manter-se, teoricamente, com zero votos na Assembleia a seu favor, desde que não tenha 126 votos contra. Ora, parece-nos que o regime actualmente existente, no esquema de 1982, é um regime incoerente, porque o Governo acaba por não ter ou poder não ter legitimidade provinda de lado nenhum. Não tem legitimidade advinda do Presidente da República, porque se põe em causa a sua responsabilidade política perante o Presidente da República e a necessidade de um mínimo de confiança política. Não tem legitimidade advinda do Parlamento, porque lhe basta que o Parlamento não seja contrário, não precisa de apoio parlamentar. Nessa linha, diria que a solução do PS, a solução da moção de censura construtiva, era uma solução mais coerente do que a que existe. Com ela vamos, claramente, para uma legitimação parlamentar do Governo. Simplesmente, pergunto o que é que nesse caso fica a fazer o Presidente da República eleito por sufrágio directo e universal? Penso que, mais dia menos dia, este problema da incoerência quanto à legitimação do Governo que hoje existe na Constituição tem de ser resolvido. Temo, no entanto, que a adopção da moção de censura construtiva seja, inevitavelmente, queira-se ou não, um passo para a eleição indirecta do Presidente da República e por essa razão, sobretudo por essa razão, sou hostil ao esquema, embora reconheça que as coisas não são obviamente tão simples como por vezes se apresentam.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Vitorino para formular perguntas.

O Sr. António Vitorino (PS): - Como nunca se sabe se algum dia alguém não se lembrará de ler estas actas e não perceberá muito bem o encadeamento, porque o Sr. Deputado Miguel Galvão Teles falou não tendo ouvido a minha intervenção inicial nem as intervenções dos Srs. Deputados Rui Machete e José Magalhães e, portanto, isto pode começar a parecer um diálogo de surdos, que não é.

O Sr. Miguel Galvão Teles (PRD): - Mas nas actas não vem a altura em que nós entramos?

O Sr. Presidente: - Não. Mas a partir de agora já vem, esteja descansado, Sr. Deputado.

Risos.

O Sr. António Vitorino (PS): - Só queria dizer que, a algumas das preocupações do Sr. Deputado Miguel. Galvão Teles, eu procurei responder numa típica jogada da antecipação e só não queria deixar de sintetizar, muito esquematicamente, alguns pontos de reflexão.

O primeiro é concordar totalmente com ele, porque, como tive ocasião de dizer, aqueles que interpretam que o sistema de governo emergente da revisão de 1982 já não é um sistema de governo tipicamente semipresidencial encontrarão, na proposta de moção de censura construtiva, um reforço adicional à tese que defendem desde 1982 e um acto de coerência complementar em relação à primeira intervenção cirúrgica, no sistema de governo, operada em 1982. Nesse sentido estou de acordo com ele, embora o PRD não proponha verdadeiramente o retorno ao sistema de 1976, na medida em que, não existindo o Conselho da Revolução, o sistema de governo que o PRD propõe é um sistema de significativa presidencialização do regime político, na medida em que há de facto a reposição do relacionamento do Presidente da República com os governos, mas há a manutenção do sistema de livre dissolução do Parlamento pelo Presidente da República, que não existia na versão originária de 1976 e foi introduzida na revisão de 1982 e que, portanto, a proposta do PRD é um projecto de presidencialização do sistema político. Não é um sistema presidencial puro, é um sistema semi-presidencial com um muito significativo reforço da componente presidencial.

Quanto à questão dos poderes do Presidente da República face ao Governo tive, na minha intervenção, ocasião de explicitar o meu entendimento sobre isso, que sinteticamente é este. É verdade que há uma diminuição dos poderes do Presidente da República em relação à escolha de um primeiro-ministro na sequência da votação de moção de censura construtiva na Assembleia da República, contudo essa perda relativa de' poder, nessa circunstância, é, em meu entender, compensada por um aumento do poder do Presidente da República, após a realização de um acto eleitoral, quando escolhe um primeiro-ministro, no caso de não existir uma maioria parlamentar. Nessa conjuntura, a moção de censura construtiva funciona a favor do Presidente da República e em protecção do governo proposto pelo Presidente da República, que só pode cair através da formação, no Parlamento, de uma maioria positiva e nunca através da formação de uma maioria negativa. Aliás, neste aspecto, o PRD também não retoma a versão originária da Constituição de 1976 onde se previa que ao fim da terceira recusa consecutiva de governo haveria dissolução obrigatória do Parlamento. Ora, não recuperando também esta componente e em virtude de o Presidente da República poder escolher um primeiro-ministro a seguir a eleições que apenas se tem que preocupar que não tenha contra ele uma maioria positiva, há, em meu entender, nesta conjuntura, um acrescento de poderes do Presidente da República.

O Sr. Miguel Galvão Teles (PRD): - Se a Comissão aprovasse a ideia do PRD, seria o primeiro a sugerir que se completasse com o regresso a uma norma desse tipo.