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20 DE OUTUBRO DE 1988 1495

entre o PCP e o PSD, já não funciona como bloqueio absoluto, como a história o demonstra, nas relações entre o PS e o CDS.

Como sabemos, a moção de censura construtiva é sempre uma tentação para os dois partidos que estão colocados ao centro. Lembro-me de ter escrito um artigo acerca disso no Diário de Notícias, o qual findava com alguma maldade. Não foi por acaso que o Dr. Sá Carneiro pensou na moção de censura construtiva, e esse artigo referia esse aspecto. O Dr. Sá Carneiro tinha nessa altura entrado na AD e obviamente que estava a pensar em criar meios para ter as mãos livres em relação ao CDS. Isto passou-se mesmo no fim da AD, e o artigo tinha alguma maldade, mas era evidente que o pensamento político era esse.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, eis como a partir da reflexão sobre a moção de censura construtiva fizemos não só uma viagem pelo sistema partidário enquanto tal bem como pelas suas origens, as suas vicissitudes, o seu futuro, o sistema político, os poderes dos órgãos de soberania, as relações entre os seus diversos tipos, a formação e derrube dos governos, as causas desse derrube, as não causas do derrube dos governos e as soluções que nessa matéria os diversos partidos apresentam, assim como as suas razões, as suas apreensões e os seus projectos.

Nestes termos, declararia encerrado o debate sobre esta proposta apresentada pelo PS e passaríamos à apreciação do artigo seguinte.

Este artigo, reatando o fio ao debate que vínhamos travando, é o 211.°, relativamente ao qual foi apresentada uma proposta do PSD do seguinte teor: "As audiências dos tribunais são públicas, salvo quando o próprio tribunal decidir o contrário, em despacho fundamentado, para defesa da dignidade das pessoas e da moral pública, salvaguarda dos segredos de Estado ou para garantir o seu normal funcionamento."

Daria agora a palavra a um dos Srs. Deputados do PSD para fazer a respectiva apresentação, caso o desejem.

Tem a palavra o Sr. Deputado Pais de Sousa.

O Sr. Pais de Sousa (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O PSD propõe em sede de artigo 211.° apenas duas alterações: a substituição da palavra "salvaguarda" por "defesa", e a introdução do inciso "salvaguarda do segredo de Estado".

Este artigo concerne à questão do princípio da publicidade das audiências dos tribunais, que consiste numa exigência do Estado de direito democrático, e é também, paralelamente, uma garantia de defesa dos cidadãos face à justiça.

O princípio da publicidade conhece determinadas excepções, as quais implicam um despacho objectivamente motivado por parte do tribunal. Portanto, o PSD considerou que, para além das excepções que já constam do normativo, como sejam a defesa da dignidade das pessoas, da moral pública e da garantia do normal funcionamento por parte do tribunal, se justifica a abertura de uma nova excepção que tem a ver com as questões objecto do segredo de Estado.

Daí, entendermos que também deve ser derrogado o princípio da publicidade e, portanto, deve verificar-se uma situação de audiência secreta, embora mantendo aquela limitação, que consiste na obrigatoriedade do despacho objectivo e motivado.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está aberta a discussão.

Tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Galvão Teles.

O Sr. Miguel Galvão Teles (PRD): - Penso que isso que está inserido na lógica do que aprovámos quanto ao segredo de Estado, embora coloque um problema. Devo dizer que não sou totalmente contra o conceito do segredo de Estado mas apenas para além de certos limites.

Assim, depois de se saber quais são os casos em que se pode inquirir na base do segredo de Estado, pessoalmente não tenho qualquer objecção a uma solução destas. Ela está inserta na lógica do que já se aprovou do consenso que se formou acerca do segredo de Estado.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, da parte da bancada comunista a atitude em relação a esta proposta é de reserva, uma vez que ela se insere num conjunto de preocupações do PSD de reforçar não a transparência mas o secretismo. O debate que travámos acerca da norma que o PSD propõe quanto aos titulares de cargos políticos, no sentido de consagrar - e que na altura se apelidou de "rolha eterna" - um tal dever de silêncio mesmo após o exercício de funções, é bem elucidativo. O próprio PSD reconheceu que era excessiva a medida em que propunha essa consagração do segredo de Estado. As nossas propostas vão no sentido contrário.

Neste caso trata-se de reflectir sobre se tem cabimento ou não uma norma como a que é proposta. Chamo-vos a atenção para o facto de que não se pode deixar de ter em conta qual é o regime do segredo de Estado: evidentemente é irrigoroso dizer que a lei portuguesa "não regula" o regime do segredo de Estado. Regula, e designadamente a lei processual penal tem normativos atinentes a essa matéria: prevê os casos em que ele pode ser invocado, os casos em que pode ser quebrado e os casos em que deva ser, a todos os títulos, mantido.

O Código de Processo Penal, inclusivamente, prevê, porventura por excesso, a manutenção do segredo em hipóteses em que talvez não se justificasse a sua própria invocação, quando ela pode conduzir à subversão da repartição de competências entre órgãos de soberania, à inviabilização da realização da justiça e à impossibilidade de cumprimento das funções próprias dos tribunais. Por outras palavras, se no sistema actual o Primeiro-Ministro, que é o guardião supremo do segredo de Estado, denega autorização para a quebra do segredo, impedindo funcionários da Administração Pública de, perante os tribunais, revelarem conhecimentos de que são detentores sobre este ou aquele outro facto, pode-se tornar impossível a sua perseguição e a responsabilização criminal, mesmo na hipótese em que se verifiquem verdadeiros crimes. Isso equivale à restauração da garantia administrativa prescrita pelo artigo 271.° da Constituição!

Este é um risco real. A invocação do segredo de Estado pode conduzir à impossibilidade de efectivação das finalidades próprias do processo criminal, e até à restauração de fórmulas oblíquas de garantia administrativa, traduzida no facto de determinados agentes da Administração Pública, neste caso, por exemplo, os agentes secretos, os dos serviços de informações, poderem ser isentados de produzir testemunhos, ou de irem além de determinado ponto nos seus testemunhos, por forma tal que seja impossível efectivar as suas próprias