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2 DE NOVEMBRO DE 1988 1683

vezes, elas estão esquecidas em cima da mesa, mas estão perfeitamente vivas e aos saltos por baixo dela. A citação visa portanto apenas evitar a amnésia histórica.

A ideia de flexibilização do processo de criação de regiões não é uma ideia original. Sucede, porém, que, sem mais, pode comportar perigos de discriminação. Foi por isso que o projecto do PCP procurou acautelar no n.° 4 aquilo que, suprimindo-se o princípio da simultaneidade, ficaria sem cautela. Como o Sr. Deputado Jorge Lacão argutamente sublinhou, se se suprime o princípio da simultaneidade e se, concomitantemente, não se acautela que existindo uma forte vontade de criação concreta por parte dos interessados, e desde logo dos municípios, o Parlamento não tenha de praticar o acto de instituição concreta, ficar-se-ia então com um esquema que permitiria a não criação de determinadas regiões e a criação privilegiada de outras. É isso que o princípio da simultaneidade procura evitar e é isso que o nosso n.° 4 procura evitar. Pretende-se garantir que quando haja uma vontade municipal maioritária, devidamente apurada, a instituição concreta seja irresistível. Porque se a criação não é irresistível e se suprimimos o princípio da simultaneidade, o processo de regionalização pode ser tornado completamente arbitrário, com sacrifício de interesses legítimos e, designadamente, com sacrifício da vontade expressa das populações através dos seus municípios.

O Sr. António Vitorino (PS): - Essa lógica não levaria o PCP a propor que a pronúncia das populações se fizesse através de referendo, que, isso sim, seria a marca da reversibilidade da decisão das populações? De facto, o que o Sr. Deputado Jorge Lacão disse é totalmente verídico: o vosso n.° 4 introduz uma inovação no nosso sistema constitucional, que é uma imposição de legislação à Assembleia da República. Ou seja, há uma limitação dos poderes dos representantes do povo não por via do referendo, isto é, por via da pronúncia dos próprios mandantes, mas por via da decisão de um certo número de órgãos das autarquias.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Deputado António Vitorino, o problema com que nós nos deparámos, e dissemo-lo aqui com toda a lisura, foi o seguinte: primeiro, determinadas forças políticas entendem que o esquema em vigor "dificulta", ou mesmo "bloqueia", o processo de criação e depois a instituição concreta das regiões: diz-se que a flexibilização é imprescindível, que a simultaneidade, nos termos em que hoje se encontra definida, é um elemento impeditivo. Nós dissemos: em nosso entender, uma interpretação correcta da Constituição não permite discernir esse elemento de bloqueio. Mas, já que existe da parte de outras forças essa ideia, admitamos que há um bloqueio e avancemos para a sua supressão. Como é que se pode avançar para a sua supressão? Avança-se para a sua supressão eliminando o preceito, eliminando a regra. A partir do momento em que se elimina a regra, o processo de criação desenrola-se em dois passes, como agora: por um lado, a definição das atribuições das regiões, a composição e competência dos órgãos, o regime financeiro e depois a delimitação, a tormentosa e momentosa questão da delimitação. Avance-se num primeiro momento de forma comum e num segundo momento avance-se consoante a realidade ditar. Mas dizer que se avance consoante a realidade ditar cria um problema: é que a realidade não dita directamente; a Assembleia da República tem de intervir, e a Assembleia da República intervém de acordo com os seus critérios, critérios esses que podem, se não forem adoptadas certas cautelas, levar à concessão do privilégio do avanço a uns e à prateleira forçada para outros. Como é que se sai disso, como é que se evita este elemento de possível discriminação? Ou se evita, mais uma vez, através da definição de uma regra geral e abstracta, que a todos contemple, ou então através da concessão de uma eficácia intimativa, deliberativa à vontade popular, expressa através do mecanismo que a Constituição hoje consagra no n.° 3 adaptado.

E evidente que se a Constituição passasse a consagrar outros mecanismos, designadamente o referendo, a questão poderia ser encarada noutros termos. Mas repare: nós movemo-nos dentro da nossa lógica e movemo-nos dentro da lógica da Constituição vigente, não nos movemos dentro da lógica da Constituição futura ou da alteração constitucional decorrente da eventual consagração do referendo - é esta a explicação de a nossa posição ter sido aquela que resumi. Evidentemente, a nossa solução é uma solução em construção e uma base de partida para o debate. Esse debate tem de ser feito dentro de balizas que, por um lado, afirmem da parte de todos uma comum vontade regionalizadora, sob pena de ser uma feira de equívocos. De facto, só agora é que o Sr. Deputado Almeida Santos nos disse de forma clara, total e terminante que o PS mantém o princípio da simultaneidade. Já ouvimos noutros momentos e noutras sedes a afirmação de que não, ou seja, que o PS entendia que esse princípio tinha os dias contados, pelo que era de suprimir, de enterrar. Por isso, dizemos: é preciso clarificar e é precisa uma vontade comum nessa matéria.

O Sr. Presidente: - Mas, Sr. Deputado, se dizemos que "o território continental será geografícamente dividido, por lei, em regiões administrativas", parece-me que isto é tão claro como a água!... Até digo mais: é mais realista do que ter subjacente a essa norma o princípio da simultaneidade em abstracto sem dizer como é que se faz.

É claro que o meu amigo quando diz que há divergências no nosso partido reproduz com certeza opiniões dos nossos camaradas do Algarve.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Exacto, Sr. Presidente, reproduzo mesmo porque estão escritas e ditas. E mais: não sou eu que atribuo esse significado ao desaparecimento do advérbio, mas sim eles.

O Sr. Presidente: - Claro que sim, Sr. Deputado, porque toda a vida defenderam essa possibilidade, e até chegaram a apresentar um projecto de criação de uma região-piloto.

Entretanto, V. Exa. argumenta com a facilidade que representaria para a criação das regiões a eliminação desses princípios. Estou de acordo com isso, pois é evidente que as primeiras regiões serão mais fáceis de criar se não estiver ínsito na Constituição o princípio da simultaneidade. Porém, o que lhe pergunto é se as últimas não serão mais difíceis de criar. E é a isso que VV. Exas. não respondem!