O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

1698 II SÉRIE - NÚMERO 54-RC

conseguidas noutros países, de molde a utilizar aquilo que foi positivo e evitar o que se revelou negativo. Isso não se compadece com a opinião de V. Exa., quando diz: "Qual é o problema? Remeteremos isto para uma lei ordinária ou, pelo menos, para uma lei não constitucional. Portanto, como VV. Exas. têm uma maioria absoluta, farão a lei que muito bem entenderem, o que, no fundo, equivale à regionalização que bem entenderem."

Ora, como disse o meu colega - e muito bem -, a regionalização é um problema nacional, e talvez um dos mais importantes, que vai alterar substancialmente a estrutura administrativa do País. Daí as nossas cautelas...

O Sr. Presidente: - Também a reforma fiscal e agrária são estruturais!

O Sr. Cardoso Ferreira (PSD): -... e a nossa ênfase de que todas as preocupações serão poucas neste processo.

O Sr. Presidente: - Julguei que o vosso entusiasmo era filho da certeza de que as vantagens superavam as desvantagens! Contudo, vejo que não! VV. Exas. ainda vão estudar o caso estrangeiro, mas eu já o fiz! Filio as minhas reservas em certezas e não em suposições! Vou contra a regionalização por razões muito concretas! Entretanto, julguei que VV. Exas. eram a favor por razões também fundadas e que já tinham estudado as experiências estrangeiras!

O Sr. Cardoso Ferreira (PSD): - Temos, de facto, razões fundadas e acreditamos na regionalização. Pensamos, aliás, que elas são positivas. Simplesmente, há algumas dificuldades a ultrapassar, a fim de que as consequências sejam, como pretendemos, mais benéficas do que nefastas.

O Sr. Presidente: - Têm de assumir no Plenário da Assembleia da República a responsabilidade de dizerem que precisam de mais tempo para estudar o processo e chegar a conclusões definitivas.

Tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Mendes.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Sr. Presidente, creio que a matéria suscita todo o discurso periférico e, em alguma medida, o legitima.

Do mesmo modo, afigura-se-me inteiramente líquido que se há domínio em que um prazo não seja uma questão meramente adjectiva é este.

De facto, institui-se uma obrigação de f acere para todos nós, e com essa obrigação e com essa decisão havida assume-se o compromisso político de pôr termo a alguma coisa que não aproveita a ninguém e que doze anos volvidos sobre a Constituição é, a todas as luzes, muito mau que continue a existir. Refiro-me a um clima de exaltadas afirmações em favor da regionalização nas enunciações quotidianas do fait divers político, mas de completa inacção no terreno jurídico e, pior do que isso, em muitas circunstâncias de clara obstrução. Não vale a pena negá-lo, pois houve claras obstruções ao processo de regionalização. Já hoje de manhã tive oportunidade de dizer aquilo que é uma evidência para todos nós: a falta de vontade política tem determinado que, passado todo este tempo, nos situemos ainda na estaca zero.

O Sr. Deputado Cardoso Ferreira aludiu, há bocado, à circunstância de se não pretender "ir a galope" fazer a regionalização. Para além do argumento histórico que vale o que vale - e é bastante -, o que acontece é que nem sequer se tem andado a passo de caracol. De facto, tem-se estado inteiramente parado, a ludibriar expectativas, a defraudar os anseios das populações e, sobretudo, a enovelar, de uma forma perfeitamente intolerável, o discurso político em torno daquilo que não passa de uma pura mistificação retórica.

Ora, completam-se este ano 100 anos sobre a edição de Os Maios. Aconselharia, por isso, os Srs. Deputados do PSD a ler as inesquecíveis páginas do Eça de Queirós a propósito da regionalização ou de alguma coisa de parecido com aquilo que isso é e a tirarem daí as convenientes ilações. De facto, tudo o que é diferir, dilacionar (para não se sabe quando), o que tem de se efectuar e deve ser feito por consenso nacional e com alto sentido de Estado no imediato o que gera é a anemia e, a prazo, a catástrofe. Portanto, o problema que nos está colocado é, a todas as luzes, de extrema relevância.

Entendemos, assim, que o simples compromisso verbal de, num prazo de um, um ano e meio ou dois anos, se proceder à regionalização, seja ela feita pelo Prof. Cavaco Silva ou por quem quer que seja em nome do PSD, não basta. Não tem, de forma nenhuma, o mesmo vínculo jurídico que um prazo inscrito na Constituição em sede de normas transitórias. Como já pudemos comprovar até ao presente, não tem sequer a legitimá-lo e a aboná-lo a circunstância de ser inteiramente credível no terreno político. Quando propomos 90 dias não estamos a sugerir uma fórmula completamente acabada, ou seja, o alfa e o ómega, de modo a dizermos: "é esse prazo e mais nenhum". É óbvio que estamos disponíveis para discutir se hão-de ser estes dias ou mais. Porém, o que não podemos é deixar passar em claro a afirmação do PSD, segundo a qual isto não tem dignidade constitucional. Lembro, entretanto, que as constituições estão cheias de prazos deste género. Verificou-se isso na Constituição Portuguesa de 1976 e, aliás, todas as redacções originárias das constituições nascidas de rupturas revolucionárias estão cheias de prazos deste género. As revisões das constituições em toda a parte do mundo têm prazos deste tipo. Assim sendo, o que é que para o PSD tem dignidade constitucional? Será que é apenas a abolição das nacionalizações? Da reforma agrária? Ou há coisas que não têm dignidade constitucional segundo as conveniências e outras que a têm segundo as mesmas conveniências, que, de resto, são bastantes obscuras?

Devo agora dizer que, não obstante a ênfase colocada nas afirmações, se me afigura, de todo em todo, inaceitável uma postura do género de dizer: "em todo o momento consideraremos se por lei ordinária se fará ou não fará". O PCP com algum empenho defenderá a consignação de um prazo na Constituição, seja ele qual for, desde que razoável, porque é evidente que nos oporemos a um prazo que seja, por exemplo, de dez anos. Seria a completa desvergonha! Entendemos, pois, que um prazo razoável e credível deve passar a constar da Constituição.