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12 DE DEZEMBRO DE 1988 1937

a expropriação ficam a ser claramente uma "faculdade" de qualquer governo, mas deixam de ser uma "imposição" constitucional, se essa é hoje a melhor interpretação da alínea f) do artigo 290.°

Devo dizer que essa interpretação não decorre directamente da formulação de limite, mas pode decorrer do seu enquadramento constitucional ligado ao plano e a outras regras com as quais o artigo 290.° tem de ser sistematicamente relacionado.

Para além disso, de acordo com a nossa interpretação de que a planificação económica deve deixar de ter a omnipresença que tem hoje na Constituição, e até o sentido algo colectivista que tem no actual texto, pareceu-nos que deveríamos reformular a redacção deste limite em termos de simples existência de planos económicos no quadro de uma economia mista.

Introduzidas estas únicas alterações, com as quais estamos de acordo, e o nosso voto não poderá ir além delas, parece-nos que os restantes limites materiais de revisão não criam problemas a nenhum partido e muito menos à vida e à interpretação da Constituição. Até porque uns seriam sempre limites materiais independentemente da formulação. Os outros merecem essa mesma formulação expressa.

Parece-me que a Constituição, despojada destes três limites, que poderiam criar alguns problemas quer a nível da constituição económica quer ao da organização do poder político na referência às organizações populares de base, só ganha e nada perde. A inserção de expressões como "a independência dos tribunais, a autonomia das autarquias locais, a autonomia político-administrativa dos arquipélagos dos Açores e da Madeira, a fiscalização da constitucionalidade por acção ou por omissão, o pluralismo de expressão, sufrágio universal, os direitos dos trabalhadores, os direitos, liberdades e garantias, etc.., devem, em nosso entender, estar fora de disputa. O artigo 290.° fica agora reduzido ao essencial. Não é necessário levar mais longe a sua alteração.

Esta é a nossa posição, aliás muito reflectida. Assumimos as alterações que nele introduzimos e não daremos o nosso acordo a qualquer modificação que não sejam estas.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o artigo 290.° é, de algum modo, uma síntese da interpretação da Constituição e, simultaneamente, o precipitar daquilo que as diversas forças políticas consideram essencial.

Na nossa perspectiva, entendemos que houve um claro exagero, aproveitando uma maioria na Assembleia Constituinte, em virem consignar-se normas em matéria de limites materiais de revisão constitucional muito para além daquilo que são os princípios, os preceitos e as instituições mais fundamentais à existência de um Estado democrático que seja consensualmente aceito. Daí que numa das fórmulas que temos repetidamente referido tivéssemos considerado que, na realidade, há concretizações daquilo que é um princípio estruturante fundamental do nosso Estado e da Constituição, que e o princípio democrático, e há no artigo 290.° outras realidades que vão muito para além dele. Aliás, mesmo que não existisse um artigo 290.°, o princípio democrático e as suas concretizações constituiriam um limite material de revisão, visto que esses limites materiais não existem pela circunstância de serem consignados na lei, mas, sim, porque fazem parte da natureza das coisas e descaracterizariam o Estado e a lei fundamental se forem desrespeitados. Contudo, para além disso, procurou-se, de uma maneira porventura ingénua e, simultaneamente, habilidosa, garantir determinadas opções circunstanciais, rodeando-as da ideia de que poderia haver uma estabilização ad seculum seculorum através da sua inclusão num artigo sobre limites materiais da Constituição. E foi o que aconteceu a propósito daquilo que costumamos designar como "afloramentos do princípio socialista de raiz colectivista-marxista". É assim que a Constituição não se limita aos aspectos fundamentais de um estado democrático e de direito, como também aparecem ínsitos nela, designadamente, o princípio da apropriação colectiva dos principais meios de produção e solos, bem como dos recursos naturais e a eliminação dos monopólios e dos latifúndios, a planificação democrática da economia no sentido que tinha no texto da Constituição de 1976, que foi apenas ligeiramente podado na revisão de 1982. E também surge como afloramento, que espanta um pouco que tenha sido considerado como tão importante para justificar a sua inclusão numa das alíneas do artigo 290.°, o que respeita à participação das organizações populares de base no exercício do poder local.

O princípio socialista-colectivista só existe se for animado por uma vontade democrática que permanentemente incentive ao progresso, à manutenção das situações já adquiridas. Ele caducou porque essa vontade desapareceu, na medida em que isso se evidenciou claramente através de sucessivas eleições onde a maioria dos eleitores de uma maneira inequívoca sufragaram programas de Governo que eram contrários àqueles que estavam implícitos nas disposições que estamos agora a analisar. E igualmente pela prática dos órgãos políticos representativos, de que é exemplo mais visível a circunstância de Portugal ter aderido às Comunidades Económicas Europeias, onde evidentemente o modelo de sociedade e de Estado que se pressupõe está nos antípodas do modelo que, de algum modo, era almejado por estes preceitos e por aquele princípio socialista-colectivista-marxista.

É evidente que estamos perante um problema técnico-jurídico importante, mas que não nos deve fazer esquecer de que esses problemas são, apesar de tudo, relativamente instrumentais, face a questões bem mais importantes, ainda, de carácter político e filosófico.

É óbvio que podemos escolher, como parece que fez o PS, e não o levamos a mal por isso, uma técnica de dupla revisão instantânea da Constituição, que assente também, do ponto de vista jurídico, em pressupostos largamente discutíveis e discutidos. Poderíamos até pensar que as coisas são irremediáveis, que estávamos encerrados num casulo, que a única solução técnica é semantizar a Constituição e manter todos os preceitos para, de uma maneira hipócrita, não terem na prática qualquer aplicação. Porém, assim desvalorizamos irremediavelmente a Constituição e pomos em perigo o valor fundamental da democracia. Há muito de fundamental e aproveitável neste Estado de direito criado após o 25 de Abril e consagrado na Constituição. Aliás, o mais importante está salvaguardado na lei fundamental, ou seja, o princípio do carácter democrático e pluralista do Estado.

Há, entretanto, uma outra via que, como é conhecido, adoptámos de uma maneira inequívoca e que se consubstancia no entendimento de que, mesmo do