O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

25 DE FEVEREIRO DE 1944 107

Há, pois, um dever social de assistência aos necessitados. Quere isto dizer que à sociedade incumbe o encargo em que a assistência, se traduz - encargo cada vez mais premente em face do aumento de intensidade das necessidades e do arreigamento da doutrina da função social da riqueza.
Mas sociedade é um termo vago. Não há concretamente sociedade, há sociedades ou modos sociais de vida: a família, a autarquia local, a corporação, a Igreja, a nação, as associações ou instituições voluntariamente formadas pelos indivíduos. E através de todas elas pode cada um desempenhar-se do dever que pertence a todos. Resta saber se numa organização bem ordenada não caberá a alguma ou a algumas destas sociedades a preferência ou até o exclusivo em relação a outras.

Necessidade de um plano de assistência social

42. Para conjugação e coordenação de tantas «sociedades» no desempenho do dever social de assistência impõe-se que se elabore e cumpra um plano, segundo o qual depois se desenvolvam as iniciativas públicas e orientem as particulares.
A elaboração desse plano não pode deixar de pertencer ao Estado.
Arroladas as necessidades e os fins a atingir e graduadas por ordem de valor e urgência, feito, por outro lado, o recenseamento dos meios (obras, dinheiro, pessoal) de que em cada período e para cada fim é possível dispor, trata-se depois de ordenar as cousas de modo que no lapso de tempo abrangido pelo plano convirja para os objectivos escolhidos o máximo de energias e recursos mobilizados para o efeito.
É evidente que, sendo tantas as necessidades a suprir, se torna impossível satisfazê-las todas a um tempo. Há que progredir por lances e partindo das tarefas mais fáceis e de circunscrição para circunscrição, pois só assim se eusaiarão os homens, se experimentará a organização e se ganhará a confiança indispensável para acometer mais complexos problemas.
Deve o plano ser muito simples, muito claro e preciso, mas suficientemente pormenorizado, para que todos e cada um saibam o papel a desempenhar e como desempenhá-lo: não- basta um programa vago, mais anúncio de intenções que imposição de comandos. O que não quere dizer que seja minucioso na regulamentação da execução a ponto de tolher iniciativas e quitar responsabilidades.
Plano é decisão, previsão, concatenação. É critério orientador a nortear rumos, de modo a suprimir as paragens bruscas, as mudanças de direeção, as surpresas
constantes. Mais que da permanência dos homens, a sequência das obras depende da estabilidade das ideas a realizar: se estas se impuserem aos executores que se sucedam ou revezem, a continuidade está assegurada.
No plano há duas partes a considerar: a do «armamento» da Assistência (edifícios a construir ou a adaptar para hospitais, asilos, sanatórios, creches, dispensários ...) e a da acção imediata a exercer. Aquela tem necessariamente de visar um período mais largo do que esta.
Vejamos quem há-de executar e como.

Iniciativa do Estado e iniciativa particular

43. O problema de saber a quem devem pertencer as iniciativas no domínio da assistência social não pode ter uma solução única, de carácter absoluto.
Em princípio o Estado tem o dever de prestar assistência social aos seus cidadãos que dela necessitem; ainda em princípio, a assistência do Estado não deve excluir nem embaraçar a assistência privada.
Que o Estado, em Portugal, tem o dever de assegurar e desenvolver a assistência social entendida no sentido largo em que a proposta a toma, não parece duvidoso à face da Constituição Política.
Na verdade, pelo artigo 6.º da nossa lei fundamental, incumbe ao Estado «zelar pela melhoria de condições das classes sociais mais desfavorecidas, obstando a que aquelas desçam abaixo do mínimo de existência humanamente suficiente»; no artigo 14.º prescreve que pertence ao Estado e autarquias locais: «em ordem à defesa da família - favorecer a constituição de lares independentes e em condições de salubridade ..., proteger a maternidade, facilitar aos pais o cumprimento do dever de instruir e educar os filhos, cooperando com eles por meio de estabelecimentos oficiais de ensino e correcção ...»; no artigo 40.º afirma ser direito e obrigação do Estado a defesa da moral, da salubridade, da alimentação e da higiene pública...
E não podia ser de outra maneira. Não só os problemas da assistência social são de verdadeiro e superior interesse nacional, como neles se exprime, mais tangivelmente que noutras quaisquer formas de política, a solidariedade que une entre si pelos laços do sangue e da história todos os membros da Nação.
Por outro lado, nenhuma comunidade dispõe dos meios de autoridade, do pessoal e dos recursos financeiros que o Estado pode pôr ao serviço da assistência social. Não esqueçamos o que a revista das necessidades a suprir nos revelou: somos um país em atraso na resolução de muitos problemas vitais, que é tempo de atacar com decisão e energia. Certos aspectos de mobilização; e de campanha, dispensáveis noutros países, são aqui imprescindíveis. E só o Estado pode dá-los à acção a empreender.
Pode parecer à primeira vista que isto é, quando iduito, verdadeiro em relação à sanidade pública, mas não vimos nós que a preservação da infância dos flagelos da tuberculose, da lepra ... e da imoralidade exige creches, jardins de infância, asilos ...? Não vimos ainda que o internamento de certos incuráveis em asilos constitue indispensável medida profilática e que a educação geral está intimamente ligada a todos os problemas da assistência?
Aquilo que se pode conceder é que, traçado um plano e reconhecida prioridade a uns objectivos sobre outros, o Estado concentre as suas disponibilidades e esforços nos que pôs adiante.
Claro que a construção dos principais estabelecimentos da rede de assistência social tem de competir ao Estado: reconhecida a sua urgência, não tolera demoras, nem esperas, a execução. São insuficientes os hospitais de Lisboa e Porto e não se chegaram a fazer ainda os grandes Hospitais-Faculdades inteiramente projectados; faltam sanatórios e hospitais para tuberculosos, que andam, mau grado seu, pelo meio das populações a espalhar bacilos e a morrer aos poucos; faltam dispensários, são precisos mais leprosários ... Há que construí-los quanto antes, ainda que à custa de um empréstimo, perfeitamente justificado por se tratar de benefícios para as gerações futuras.
Quanto à parte do plano relativa à acção imediata - há que ir mantendo sem decréscimo as actividades que se não puderem desde logo desenvolver, emquanto se incrementam ao máximo aquelas a que se tenha dado prioridade. Nestas o Estado entrará a fundo, convidando a iniciativa privada a colaborar com ele; quanto às restantes, serão o campo em que os particulares têm de ir progredindo por si, até chegar o momento da ajuda decisiva do Poder.
Exemplificando. Considera esta Câmara, como já disse, primacial a luta contra a mortalidade infantil em geral e o ataque em especial às doenças infecto-con-