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82 DIÁRIO DAS SESSÕES - N.º 48

Ainda na actualidade 09 benefícios da colonização portuguesa estão sendo calorosamente postos em relevo pelo excepcional ensaísta, verdadeiro innovador dos processos da ciência social, que é Gilberto Freire, quando afirma:

.. O Brasil é hoje a parte mais viva e mais destacada do mundo que o português criou com elementos principalmente europeus e cristãos, mus através de vasta miscegenação e de larga interpenetração de culturas ... Nunca houve maior vitória do humano, do demasiadamente humano, sobre o económico 9.

Como esquecer a oração famosa, em glorificação da língua comum, de um dos mais categorizados e leais amigos de Portugal em terras de Santa Cruz, o propugnador da criação entre nós da cadeira de Estudos Camonianos, Sr. Dr. Afrânio Peixoto, para quem Camões e o Brasil são os dois maiores prodígios que fizemos no Mundo?!
Dêsse discurso, lido na sessão da nossa Academia em 10 de Junho de 1940, devo transcrever o passo seguinte, porquanto dele irradia a ternura lusófila do autor:

Somos filhos legítimos e trazemos, com garbo e honra, o nome de família; «guardaremos com piedade e orgulho a língua, a mesma que falaram esses lusíadas que revelaram o mundo ao mundo e salvaram a civilização latina e cristã dos bárbaros maometanos, obrigados a refluir da Europa às suas nascentes asiáticas...
Língua de epopeia e de amor, ainda e sempre a mesma, de Garrett a Castro Alves; de Herculano a Machado de Assis; de João de Deus a Bilac; de Camilo a Rui Barbosa...

III

Seria interminável a lista dos brasileiros ilustres que comungam nesta aspiração ao lado de muitos dos mais insignes escritores portugueses, de que me permito apenas lembrar, para só falar dos mortos: Malheiro Dias, o empreendedor desse monumento bibliográfico, a História da Colonização Portuguesa no Brasil, que ao estreitamento das relações luso-brasileiras dedicou uma vida infatigável; Alberto de Oliveira, que carinhosamente designava o Brasil de «outra banda de Portugal», vendo na sua lusitanidade a garantia de persistência diferenciada, não só territorial, mas moral e histórica 10; Ricardo Jorge, defensor acérrimo do que chamava brasilismo, o culto e o amor das cousas do Brasil 11; Sampaio Bruno, em cujo entender-constituía «verdadeiro serviço público» tornar o Brasil conhecido dos portugueses 12; e Manuel de Sousa Pinto, que desenvolveu labor inesquecível na sua cátedra de Estudos brasileiros 13, escrevendo a par disso monografias de mérito sobre a literatura do Brasil, considerado por ele «o segundo Portugal, o maior e o melhor presente que nos deu o destino, admiravelmente servido pela nossa ciência náutica» 14.
Acto de inteira justiça representa assim enaltecer entusiasticamente como acontecimento dos mais notáveis e patrióticos, expressão máxima de uma política clarividente, o Acordo estabelecido.
Constituo título de glória imorredoura para todos que de algum modo por ele se esforçaram15 e muito em particular para o estadista sem par, orgulho não apenas da sua Pátria mas da comunidade cristã, o Presidente do Conselho e Ministro dos Negócios Estrangeiros do Governo Português, Senhor Doutor Oliveira Salazar, também um clássico da linguagem pela elegância e correcção da forma de todos os seus escritos.
E, como remate, permitimo-nos recordar os versos de António Ferreira, que eles não perderam a actualidade e traduzem o sentir unânime da Câmara e certamente de todos os portugueses cultos:

Floresça, fale, cante, ouça-se e viva
A portuguesa língua, e já onde fôr,
Senhora vá de si, soberba e altiva!
Se até aqui esteve baixa e sem louvor,
Culpa é dos que a mal exercitaram.
Esquecimento nosso e desamor.

Pelo exposto, a Câmara Corporativa é de parecer que deve ser aprovada a proposta de lei referida.

Palácio de S. Bento, 6 de Fevereiro de 1944.

Domingos Fezas Vital.
João Serras e Silva.
José Gabriel Pinto Coelho.
Marcelo José das Neves Alves Caetano.
Gustavo Cordeiro Ramos, relator.

9 O Mundo que o português criou, Rio de Janeiro, pp. 41 e 45.
10 Artigo na Atlântida, ano I, n.° 3, de 15 de Janeiro de 1910, pp. 201-204.
11 Brasil! Brasil!, 1.ª ed., Lisboa, Empresa Literária Fluminense, p. 18.
12 O Brasil mental.
13 A iniciativa da fundação, na Faculdade de Letras de Lisboa, de uma cadeira de estudos brasileiros, instituída por decreto de 12 de Junho de 1916, cabe ao saudoso escritor e diplomata Dr. Alberto de Oliveira, que a preconizou acaloradamente na Academia das Ciências de Lisboa e na Academia Brasileira de Letras. O relator da respectiva proposta de lei na Câmara dos Deputados foi o Sr. Dr. João de Barros, «galhardo paladino da chamada aproximação luso-brasileira», como a esse escritor se refere justamente o Prof. Sousa Pinto.
14 Língua minha gentil. Aillaud e Bertrand, 1924, pp. 8-9.
15 De elementar justiça será acentuar que não se teria podido chegar a resultados tam decisivos sem a reforma ortográfica de 11 de Setembro de 1911, a qual veio pôr termo à anarquia existente.
Recordemos com gratidão os inestimáveis serviços prestados a este respeito, sobretudo pelo notabilíssimo filólogo Gonçalves Viana com os seus trabalhos e em especial com o Vocabulário Ortográfico.