4 DE MARÇO DE 1948 288-(161)
7. Os produtos alimentares pesam muito na balança comercial, e, de entre eles, os farináceos ocupam lugar de grande relevo.
É até certo ponto paradoxal esta influência, que aliás não é de agora, mas vem de longe. Vista à luz das possibilidades internas, depois de exame do pequeno rendimento agrícola de largas áreas a sul do Tejo e das possibilidades de outras a norte, embora em mais reduzida escala, as grandes importações de substâncias alimentícias de 1946 e 1947 estão fora da lógica económica.
Torna-se necessário fazer um grande esforço no sentido de adaptar os terrenos do Alentejo e outras zonas do País à produção intensiva. Só é possível alcançar tal objectivo por meio do aproveitamento máximo das disponibilidades de águas, quer subterrâneas, quer das chuvas. A cultura extensiva, feita nas condições do passado, não consegue suprir ou apagar as deficiências actuais, sobretudo quando se considera que a população está a aumentar na razão de 700 ou 800 mil habitantes por década.
A questão da cultura agrícola é das mais sérias na política nacional, porque, por um lado, a maioria do povo português vive nos campos e, por outro, porque se torna necessário equilibrar os custos com os salários, de modo a permitir preços de venda satisfatórios, tanto para o produtor rural como para o consumidor urbano. Há nela factores de natureza social, e até política, que transcendem razões puramente económicas.
Parece não haver dúvidas de que é necessário produzir muito mais dentro do País. A terra terá de dar colheitas maiores do que até, agora por unidade de superfície, de modo a que o agricultor receba, com preços justos, a compensação do seu esforço, porque, se assim não for, não poderá haver progresso sensível.
O sacrifício de uma parte da população em prol da outra poderá justificar-se por fundas razões, de ordem social num espaço de tempo curto, mas trará efeitos calamitosos de ordem geral se for prolongado.
Impõe-se por tudo isto um cuidadoso estudo das possibilidades agrícolas e a adopção de medidas radicais que tendam a elevar o seu rendimento. Haverá para isso que ir contra ideias arreigadas na índole da população, como sejam: a resistência ao emparceiramento o parcelamento, tradições culturais atrasadas, métodos de conservação e armazenamento de produtos rotineiros, além de instrução agrícola insuficiente ou mal orientada. Mas, a sobrelevar a todas, paira a utilização em limito maior escala das reservas aquíferas nacionais. E neste último aspecto há ainda uma longa estrada a percorrer - que é mister percorrer com rapidez, como manda o interesse da Nação.
8. Em matéria de equipamento industrial, os anos mais próximos hão-de exigir um grande acréscimo de importações. O que veio em 1946 e 1947 é muito pouco, e, embora nestes anos se tivessem já liquidado encomendas que só influirão na balança comercial nos anos próximos, a modernização da indústria e da agricultura necessita de bem maiores gastos.
É lamentável que fosse permitida tão longa importação de automóveis de carga, passageiros e outros, nos dois últimos anos, sobretudo no último. Elevou-se, no total, a perto de 1 milhão de contos, parte dos quais bem poderiam ter sido melhor aproveitados. Deve considerar-se neste aspecto que quase tudo a que constitui a exploração do automóvel é importado: a gasolina, a câmara de ar, o pneumático, os óleos, as tintas. O que o não é requer a importação de matérias-primas valiosas para serem transformadas dentro do País. Uma grande, parte destas importações dissipa-se em puro prazer. Não haveria inconveniente nisso se a situação do País fosse de molde a permiti-lo. Mas como as coisas correm agora no Mundo deveriam ser restringidos os gastos.
9. No que respeita à variada lista de manufacturas que hoje se importam, há possibilidades sérias de progressos internos e, com efeito, estão em andamento, já há anos, fábricas ou oficinas de certo interesse que poderão suprir notórias deficiências nesta matéria. Contudo a gradual elevação do nível de vida que se tem acentuado aios últimos tempos há-de requerer a importação de coisas que hoje ainda se não consomem, ou se gastam em pequenas quantidades.
Tudo indica, que, apesar de desenvolvimentos internos, se acentue o aumento de importação de diversos tipos de manufacturas que não possam ou não devam aqui ser produzidas.
As exportações
10. O caso das exportações é mais delicado e complexo do que o das importações.
Verificou-se no texto deste estudo que o volume das exportações repousa sobre três ou quatro produtos, quase todos de origem agrícola ou florestal. São os vinhos, as cortiças, os resinosos e as conservas.
Nos últimos tempos as indústrias algodoeiras favoreceram muito abalança comercial. Trabalharam principalmente para os domínios de além-mar.
Os produtos que formam a essência das exportações em épocas normais são extremamente vulneráveis em momentos de crise. Tanto os vinhos como as conservas, além de terem concorrentes poderosos e sérios, não podem ser classificados de primeira necessidade - de essenciais, como, por exemplo, os combustíveis, os farináceas, as gorduras e muitos, outros.
Quando uma grave crise económica assalta o país ou países importadoras dos produtos e a própria salvação interna exige economias, é natural supor que elas começarão pelos géneros de substituição mais fácil, como está acontecendo na conjuntura actual. A balança dos países exportadores será por este facto muito atingida.
Conviria por isso orientar a economia interna, no sentido de tornar menos contingente e perigosa a estrutura das exportações.
Parece ser isso possível em vários aspectos e até no agrícola, pela intensificação da actividade florestal e frutícola. O País pode elevar fàcilmente a exploração de produtos hortícolas e de frutas, de madeiras para esteios, caixotaria e outros fins - e parece que os mercados recebem bem e com facilidade estes produtos. Mas ainda neste campo, e logo que seja possível alargar a rega, como preconizado, há lugar para consideráveis progressos, sobretudo em produtos de qualidade. Não representarão talvez uma quantia muito grande na exportação, mas com outros auxiliarão a sua debilidade e tornarão mais sólida a sua estrutura.
11. As matérias-primas exportadas consistem essencialmente em cortiça, produtos resinosos, madeiras para esteios e minérios. Mas, de todas, as cortiças ocupam um lugar de relevo. As matérias-primas de origem, vegetal, dentro das quais a cortiça representa mais de metade, totalizaram cerca de 70 por cento da exportação das matérias-primas.
A indústria transformadora norte-americana é a principal importadora das cortiças portuguesas. E, como este país é um grande consumidor deste produto, os mercados da indústria portuguesa restringem-se a outras partes