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DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 153 604

Dos estudos levados a cabo pelo professor Bandeira, de Coimbra, vê-se que o próprio Estado nunca curou de definir ou precisar a especialidade farmacêutica.
E a esta cachoeira de novas especialidades o Estado, ainda, os serviços, a organização corporativa, a higiene oficial têm permanecido alheios ou indiferentes!
Podemos manter-nos impassíveis e alheios perante o problema?
Por outro lado a especialização a torto e a direito levou à especialidade mascarada e à especialidade de ficção.
E verificou-se isto, absolutamente inesperado e indefensável: o produto fabricado muito mais caro que o produto manipulado.
Xaropes, que custam na farmácia 10$, são industrializados e vendidos a 20$.
Solutos de cálcio, que nas farmácias custam 6$, aparecem a 20$, brindados com um nome de fantasia.
Esquecida já a lição dos debates na Assembleia e na imprensa, tenho visto nos últimos dias montras muito graciosas, onde só há tubos, caixas, boiões de 16$ a 30$.
Portanto, a máquina posta ao serviço do homem para poupar e embaratecer serviu aqui, em bastantes casos, para elevar e encarecer.

Vozes: -Muito bem!

O Orador: - A estatística é uma fotografia e admito mesmo que reproduz exactissimamente a realidade.
Mas a estatística não dá o relevo, raramente fornecerá a cor, e nem sempre através dela, tomando conhecimento da dinâmica, seremos iniciados nas origens e consequências.
Vamos explicar como podem dar-se e têm-se dado manobras altistas, inteiramente à margem das leis, dos preços oficiais, das direcções gerais e das comissões reguladoras.
Pega-se numa droga simples e converte-se pomposamente em especialidade, uma vez que a indústria ou o laboratório se fazem pagar melhor que a farmácia de manipulação.
Complicando o negócio inicial com análises, esterilizações, venda de produtos higiénicos, associações de remédios.
Substituindo as especialidades antigas por especialidades de último modelo, mercê de uma propaganda diligente e bem ordenada.
Há muita forma de pescar trutas, e, se as contas de propaganda, investigação científica ou técnica e as de embalagem estiverem folgadinhas, os custos originários podem matematicamente roçar pelo preço da matéria-prima.
Forçando a aquisição de doses superiores às necessidades individuais do doente.
E claro que este abuso tem sido reprimido ou foi simpaticamente atenuado nos últimos tempos.
Começando por um tubo de poucos escudos, melhorando por outro mais caro, servindo um boião que vai para o dobro, prosseguindo com um frasco e um conta-
-gotas já aperfeiçoado e consociado e acabando numa especialidade indiscutivelmente melhor e mais eficiente que multiplica o ponto de partida.
É como se passássemos do gabão de Aveiro ao capote alentejano, deste à gabardina e por fim ao casaco de peles!
Reforçando as especialidades com adjuvantes, dando--as como vitaminadas, sulfamidadas, etc.
Inflando as farmácias de especialidades inéditas ou ignoradas, que nunca mais têm saída. Dizia um farmacêutico: "Isto é uma repartição de objectos abandonados!".
E era.
Mas existe ainda o problema das importações. Ao contrário do exportador português, batido nas práticas comerciais, conhecedor da sua tarefa profissional e dos mercados externos, grande inúmero de importadores dos últimos anos foram uns "anjinhos" implumes na mão dos caixeiros viajantes.
Mandaram vir os produtos mais supérfluos e extravagantes. Importaram só pelo prazer de importar. Converteram as montras da baixa em redutos hostis à indústria nacional e fizeram de alguns comerciantes os mais derrancados inimigos da solidez da nossa moeda.
As pastas para dentes, as vacinas, o cálcio, os xaropes, etc., são importados por forma maciça e prejudicial e o público paga levianamente pela sedução de lhe parecer outra coisa ou supondo simplesmente que é melhor o que vem de fora.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - O decreto n.º 30:270, de 12 de Janeiro de 1940, criou uma Comissão Reguladora dos Produtos Químicos e Farmacêuticos e incumbiu-a, além do abastecimento, desenvolvimento industrial e distribuição, de fiscalizar as actividades enquadradas e de manter o justo preço dos produtos.
Toda a gente sabe o alcance da expressão "fiscalizar as actividades" e também o que será, melhor ou pior, o justo preço dos produtos.
Sem nos envolvermos em questões complicadas, diremos: "justo preço" é o preço sem especulação, o preço sem usura, que acompanha o nível dos salários justos e do custo de vida e que não agrava o consumidor ou o cliente último. Para ficarmos em ideias tão genéricas dispensamos acompanhar os canonistas nas suas análises subtis, de resto esclarecedoras.
Como se procurou realizar esta directiva moral na economia?
Como se fez ouvir a voz da justiça nos mercados?
Como se pôs em andamento mecânica corporativa que devia consagrá-la?
Vejamos devagar:
Segundo a Direcção Geral de Saúde, os preços de medicamentos manipulados - formas farmacêuticas e simples- continuam a ser regulados na tabela aprovada pelo decreto n.º 20:437, de 2o de Junho de 1931, e por alterações introduzidas em 1933 e 1936, e, posteriormente, por despacho ministerial, pela Comissão Reguladora dos Produtos Químicos e Farmacêuticos.
Quanto aos medicamentos especializados -e é isso o que interessa-, eram, até ao decreto-lei n.º 29:537, da exclusiva iniciativa dos fabricantes e importadores, não carecendo de qualquer sanção oficial!
Quer dizer: o farmacêutico estava apertado numa tabela, mas o industrial e o importador reinavam como soberanos no comércio!
O decreto-lei n.º 29:537, de 18 de Abril de 1939, pretendeu sujeitar a indústria de medicamentos especializados a regras tendentes ao aperfeiçoamento técnico e à pureza da produção.
Já nessa altura se salienta a inconveniência dos pequenos laboratórios no País.
Pelo seu artigo 15.º dispôs-se porém que "a comissão do regimento dos preço dos medicamentos estudará a forma de tabelar os preços dos medicamentos especializados, quer naturais, quer estrangeiros, ou de marca estrangeira".
Depreende-se da informação citada que esta disposição não foi executada.
Entretanto, a Constituição de 1933 forçava o Estado à obrigação da higiene pública no artigo 40.º E até mais-do artigo 31.º, n.º 3.º, da mesma posso deduzir que os aperfeiçoamentos técnicos hão-de conduzir a melhorias de preço.