1 DE FEVEREIRO DE 1952 349
O Sr. Paulo Cancela de Abreu: - Pelo motivo que já indiquei, votei, sem constrangimento, o requerimento do ilustre Deputado João das Neves no sentido de a discussão na especialidade incidir sobre o parecer da Câmara Corporativa. É indiferente, repito.
Imperaram também no meu voto duas circunstâncias mais: primeira, o desejo de, quanto possível, obtermos uma solução que esteja no conceito unânime da Assembleia; segunda, a circunstância de existir na Mesa uma proposta dimanada das nossas comissões que substitui substancialmente o texto daquele parecer, nomeadamente em dois pontos essenciais em que este divergia do meu projecto, ou sejam: o primeiro, a eliminação dos artigos 4.° e 5.° do texto da Câmara Corporativa, referentes ao lenocínio e ao incesto, que, pelos motivos já expostos, reputo estranhos aos objectivos especiais desta lei (apoiados) ... e o segundo é ficar dependente de simples denúncia ao Ministério Público o exercício da acção penal.
Há, é certo, na proposta de substituição do artigo 1.° submetida à nossa apreciação uma diferença importante do meu projecto inicial. Refere-se ao facto de por essa proposta ser mister haver sempre uma decisão judicial condenando nos alimentos os infractores que incorrerem na sanção penal.
No projecto tive em vista estabelecer este princípio só em relação aos alimentos do cônjuge, porque partia do princípio de que geralmente, neste caso, a obrigação de prestar alimentos resulta de uma sentença judicial, é consequência do divórcio ou da separação de pessoas e bens e, por vezes, embora mais raramente, de simples acção de alimentos intentada pelo cônjuge abandonado, que não pode ou não quer divorciar-se ou separar-se judicialmente.
O mesmo já não penso em referência à obrigação de prestar alimentos a menores, e, por isso, o projecto não tornava necessário que eles estivessem estabelecidos por sentença judicial.
A obrigação de prestar alimentos aos menores é tão fundamental, está tão integrada no próprio exercício do pátrio poder e da tutela e vive tão independente do estado civil ou da conduta dos pais que se me afigurou desnecessária a prévia condenação judicial. Desnecessária e inconveniente "pelas demoras e trabalhos a que dá origem, não obstante a simplicidade processual vigente nos tribunais de menores. A fome é incompatível com delongas.
Há, todavia, quem entenda que a obrigação de alimentos aos menores está implícita no direito a assistência económica e moral que nesta lei se lhes confere; e para isto não é necessária sentença.
De acordo. O argumento convence-me se também ficar entendido que a falta de alimentos importa perigo moral para o menor, isto é, importa a existência do requisito de que fica a depender a acção penal.
Quero referir-me ainda a um aspecto ontem brilhantemente focado pela nossa ilustre colega 3r.a D. Maria Leonor Correia Botelho: é o que diz respeito à legitimidade para promover a acção penal.
Repudiada por todos a necessidade de a acção criminal depender da constituição da parte acusadora (hoje assistente), estabelece-se na lei em discussão que ela depende unicamente da denúncia ao Ministério Público e indicam-se as pessoas que têm legitimidade para fazê-lo.
Mas a Sr.ª D. Maria Leonor Correia Botelho deseja, e muito bem, que se vá mais longe. Como, em geral, as mulheres, por temperamento, educação, receio ou acanhamento, não querem tomar a iniciativa de proceder contra o marido, deseja S. Ex.ª que a atribuição da denúncia fosse extensiva às entidades ou instituições a cuja guarda ou amparo as famílias ou as mulheres estão confiadas.
Ora, quanto aos filhos, eu suponho que o justificado desejo da ilustre senhora está satisfeito na lei geral.
O artigo 1462.° do Código de Processo Civil diz o seguinte:
Leu.
A lacuna existe, pois, apenas no que se refere propriamente à denúncia contra o marido por falta de prestação de alimentos à mulher.
Tenho dito.
O Sr. Presidente: - Continua em discussão.
O Sr. Sá Carneiro: - Pouco acrescentarei ao que foi dito pelo ilustre Deputado Dr. Paulo Cancela de Abreu. A emenda que, com outros colegas, subscrevi mantém, quanto aos n.ºs 1.°, 2.° e 3.°, o texto sugerido pela Câmara Corporativa.
O projecto estabelecia a pena de prisão correccional de um mês a dois anos e multa até 10 contos para infracções variadas, que o artigo 1.° enumerava.
A Câmara Corporativa separou os casos da falta de prestação de alimentos a menores ou ao cônjuge e actos fraudulentos, praticados com o fim de a pessoa que tem obrigação de dar os alimentos se colocar na impossibilidade, pelo menos aparente, de cumprir esse dever, de outras hipóteses de falta de assistência material.
Neste momento apenas interessam os casos do artigo 1.° da Câmara Corporativa.
O autor do projecto apenas exigia a decisão judicial obrigando à prestação alimentícia relativamente ao cônjuge ou ex-cônjuge.
A Câmara Corporativa amplia esse requisito da figura criminal aos alimentos devidos aos próprios menores.
Não obstante as doutas considerações ontem feitas aqui, penso que a exigência deve abranger os dois casos.
Quando a falta de assistência económica e moral possa pôr em perigo o menor, o caso integra-se no artigo 2.°.
Nas outras hipóteses a acção cível - que pode ser antecedida do preparatório dos alimentos provisórios - tem de preceder o processo criminal.
É essa a tradição do nosso direito - artigo 16.° do Decreto n.° 20:431, de 24 de Outubro de 1931, e alínea c) do artigo 1405.° do Código de Processo Civil.
As penalidades do projecto eram talvez excessivas - e todos sabem que as penas demasiadamente violentas conduzem à impunidade.
As propostas pela Câmara Corporativa seriam muito brandas.
A prisão não remível por seis meses é pena séria e que deverá intimidar aqueles que não procedam em obediência a imperativos de consciência.
Uma das novidades do projecto é a de se punirem criminalmente aqueles que não cumpram as decisões judiciais que os obrigam a prestar alimentos aos seus cônjuges ou ex-cônjuges, não obstante poderem dá-los. Era justo que tal sanção não fosse aplicada apenas aos que tinham de dar alimentos a menores.
No projecto do Código da Infância, existente no Ministério da Justiça, punia-se com prisão até dois anos ou com multa aquele que, intencionalmente, faltasse ao cumprimento dos deveres de assistência moral ou económica inerentes ao poder paternal ou tutelar ou à qualidade de cônjuge, de forma a conduzir a família à sua desorganização ou a provocar privações graves, a miséria ou a corrupção das pessoas que constituem a família.
O Sr. José Meneres: - Sr. Presidente: a proposta de substituição do artigo 1.°, que tive a honra de subscrever com outros Srs. Deputados, assenta, como já disseram