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II SÉRIE - NÚERO 35

assim são colocados de, dentro dos amplos limites fixados no texto legal e em face dos dados de que dispuserem (e que a reforma do direito processual penal há-de certamente alargar), deverem decidir tanto da aplicação ou não de uma pena detentiva, como, no caso afirmativo, de qual delas concretamente.

8 — Não se esgotam, de resto, nessa norma do artigo 72.° os poderes que o projecto atribui aos juízes para, através da escolha e graduação da pena, se lograr a justa punição do agente e a realização do objectivo geral da prevenção do crime pelo tratamento do condenado.

Assim, importa lembrar que se prevê uma atenuação especial da pena nos casos em que haja circunstâncias que diminuam, por forma acentuada, a ilicitude do facto ou a culpa do agente (artigo 74.°), e que essa atenuação terá o efeito de poder o juiz substituir a prisão por «prisão por dias livres» ou pela pena de multa (artigo 75.°).

Mas o projecto vai bem mais longe ao consagrar duas importantes inovações .para o nosso direito. Com efeito, permite-se, por um lado, que, verificados que sejam certos pressupostos (ser o facto punível com pena de prisão ou de mulita até seis meses, ser diminuta a culpa do agente, ter sido reparado o dano e não se oporem a tal medida as exigências de recuperação do delinquente e da prevenção geral) o tribunal não aplique qualquer pena (artigo 76.°, n.° 1).

Por outro, permite-se mesmo que, nos casos em que não estejam ainda integralmente realizados aqueles pressupostos, o tribunal não chegue sequer a proferir a sentença, adiando a sua pronúncia para um momento posterior (dentro do prazo máximo de um ano), na esperança de que a conduta do delinquente, a reparação próxima do dano ou a confirmação da falta de especiais exigências de prevenção venham a justificar a dispensa da pena (n.° 2).

Com tais medidas —que o Comité de Ministros do Conselho da Europa recomenda na referida resolução de 9 de Março de 1976, e que se encontram já consagradas, por exemplo, em Inglaterra, em França (por recente lei de 11 de Julho de 1975) e também na Áustria (Código Penal, § 42)— espera o projecto dotar a administração da justiça penal de um meio idóneo de substituição de curtas penas de prisão ou mesmo da pronúncia de outras penas que nem a protecção da sociedade nem a recuperação do delinquente parecem seriamente exigir.

9 — Já atrás se referiram as razões por que, no momento actual, não pode o projecto deixar de utilizar a prisão. Mas fá-lo com a clara consciência de que ela é um mal que reve reduzir-se ao mínimo necessário e que haverá que harmonizar o mais possível a sua estrutura e regime com a recuperação dos delinquentes que venha a ser aplicada.

Primeira nota a referir é que o projecto aboliu a diferenciação da prisão em várias espécies (como entre nós ainda acontece com a prisão maior e a prisão correccional). O sentido da existência de diferentes espécies de prisão é, tradicionalmente, o de traduzir uma diferenciação de formas de retribuição, correspondentes à diversidade da natureza e gravidade dos factos que a originam. Daí que às espécies mais graves devessem corresponder certos

efeitos próprios (como, por exemplo, a demissão de lugares públicos ou a incapacidade de exercer certas funções).

A solução perfilhada, neste domínio, pelo projecto parte, desde logo, da ideia —em que os mais representativos cultores da ciência penitenciária vêm desde há tempos insistindo— de que a execução das penas privativas de liberdade tão-só pode diferenciar-se em função da sua maior ou menor duração.

Mas também não lhe é estranho outro pensamento fundamental: o de retirar à pena de prisão todo o carácter infamante, em consonância de resto com o disposto no artigo 66." —outra novidade do projecto relativamente ao nosso direito actual— onde se proclama que «nenhuma pena envolve, como efeito necessário, a perda de direitos civis, profissionais ou políticos».

Segundo aspecto a ter em conta numa leitura correcta do projecto é o que diz respeito às medidas consagradas com o objectivo de limitar o mais possível os efeitos criminógenos da prisão.

Para além de um regime muito aberto de substituição da prisão por multa (artigo 44.°), há que referir que a prisão, não superior a três meses, poderá ser cumprida por dias livres (fins de semana e dias feriados), para evitar ou pelo menos atenuar os efeitos perniciosos de uma curta detenção de cumprimento continuado (artigo 45.°).

O mesmo propósito de, por um lado, furtar o delinquente à contaminação do meio prisional e, por outro, impedir que a privação de liberdade interrompa por completo as suas relações sociais e profissionais, justifica ainda a possibilidade, prevista no artigo 46.°, de um regime de semidetenção.

Considerada originalmente como um simples período de transição entre a prisão e a liberdade, a semidetenção (ou semiliberdade, como por vezes é também designada) foi de início utilizada no domínio da execução das longas penas de prisão, constituindo uma última fase da pena que permitia ao recluso uma readaptação progressiva à vida normal. Os resultados positivos desta experiência levaram, modernamente, o legislador a tentar um emprego diferente da medida. Assim aconteceu, por exemplo, em França, onde a lei de 11 de Julho de 1970 (que modificou o artigo 723.° do Código de Processo Penal) autorizou o tribunal a decidir desde logo da sujeição do réu ao regime de semiliberdade, nos casos de infracção punível com curtas penas de prisão.

E idêntico caminho segue agora o projecto ao estabelecer um regime de semidetenção que permita ao delinquente prosseguir a sua formação ou actividade profissional normal ou os seus estudos.

Ê no quadro desta política de combate ao carácter criminogénico das penas detentivas que se deve ainda compreender o regime previsto nos artigos 62.° e seguintes para a liberdade condicional. Definitivamente ultrapassada a sua compreensão como medida de clemência ou de recompensa por boa conduta, a libertação condicional serve, na política do projecto, um objectivo bem definido: o de criar um período de transição entre a prisão e a liberdade, durante o qual o delinquente possa equilibradamente recobrar o sentido de orientação social fatalmente enfraquecido por efeito da reclusão.