O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

14 DE JUNHO DE 2023

27

PROJETO DE LEI N.º 829/XV/1.ª

PROCEDE À ALTERAÇÃO DOS PRAZOS DE PRESCRIÇÃO DOS CRIMES SEXUAIS E DE

MUTILAÇÃO GENITAL CONTRA MENORES

Exposição de motivos

O abuso sexual de menores é um crime traumático e doloroso e na maioria das vezes, pode levar anos ou décadas, até que as vítimas tenham o discernimento e condições de maturidade que lhes permita processar a experiência, superar o trauma e tomar a decisão de denunciar os crimes de que foram vítimas.

Um exemplo claro deste facto e que nos permitiu ter consciência da dimensão que o silêncio tem na revelação deste tipo de crimes, foi o resultado do trabalho1 que a Comissão Independente para o Estudo de Abusos Sexuais contra Crianças na Igreja Católica, doravante CI, trouxe a público, e que demonstrou a crua realidade de décadas de abusos praticados por determinados elementos da Igreja Católica, só agora revelados.

Segundo o coordenador da CI e Médico de Psiquiatria da Infância e Adolescência, Dr. Pedro Strecht, 48152 vítimas, pelo menos, estiveram em silêncio durante mais de 50 anos, num período temporal entre 1950 e 2022.

É importante destacar que o abuso sexual de menores não é um problema exclusivo da Igreja, mas sim um fenómeno que ocorre em diversos contextos, incluindo escolas, ambiente familiar e outros. Embora o relatório da CI para o Estudo de Abusos Sexuais contra Crianças na Igreja Católica tenha trazido à tona a gravidade deste tipo de crimes no contexto eclesiástico, é essencial reconhecer que essa é apenas uma parte do problema.

Infelizmente, os abusos sexuais contra menores são uma triste realidade e ocorrem em variados contextos, desde clubes desportivos, instituições de acolhimento, centros religiosos e até mesmo no seio familiar. São na sua grande maioria perpetrados por sujeitos considerados altamente confiáveis, colocando assim em evidência a trágica quebra de confiança dentro de um espaço que deveria ser seguro.

Acresce referir que se torna crucial reconhecer que o abuso sexual de menores acontece também em diferentes esferas da sociedade e que é fundamental combater este tipo de violência em todas as situações, sem exceção, implementando políticas e procedimentos muito mais rigorosos, garantindo a deteção precoce, a denúncia segura e o apoio adequado às vítimas.

E sobretudo, é fundamental responsabilizar os agressores e garantir que estes sejam efetivamente submetidos à justiça, de forma atempada e assertiva. A pergunta que surge é a seguinte: quantos agressores sexuais de menores vão perpetuar os seus crimes, sem que nunca sejam identificados, responsabilizados e condenados?

É amplamente conhecido que muitas vítimas só conseguem falar sobre as suas experiências quando atingem uma certa maturidade, o que muitas vezes ocorre por volta dos 30 ou 40 anos de idade. A este respeito acrescente-se que, segundo o citado relatório da CI, a média de idades das vítimas situa-se nos 11 anos, ou seja, muito antes da plena maturidade física e psicossocial que lhes permite estarem preparadas para enfrentar as consequências de uma ou mais denúncias.

Considerando que o abuso sexual de crianças é um crime propenso à reincidência, podendo afetar múltiplas vítimas e repetir-se inúmeras vezes ao longo da vida do agressor, torna-se evidente que a importância de ampliar os prazos de prescrição não diminui com o tempo, assim como a necessidade de prevenção.

Atualmente, os prazos de prescrição estão definidos no artigo 118.º3 do Código Penal, e variam de acordo com o crime, em geral, definidos entre os 15 e dois anos com base no limite máximo da pena aplicável ao delito em questão. Quando o prazo de prescrição é esgotado, o processo criminal é extinto, o que significa que nenhuma ação que vise a responsabilidade criminal do agente pode ser iniciada ou continuada.

Embora o n.º 5 do artigo 118.º estabeleça uma regra especial para crimes contra a liberdade e autodeterminação sexual de menores, assim como para o crime de mutilação genital feminina em vítimas menores, ao impedir que o procedimento criminal seja extinto devido à prescrição antes que a vítima complete 23 anos de idade, esse mecanismo legal pode não ser suficiente para garantir que agressores não fiquem impunes.

1 Cf. RELATORIO-CI_FEV_2023.pdf 2 Cf. RRenascença-Noticia-13.02.2023 3 CP – Artigo 118.º