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II SÉRIE-C — NÚMERO 9

0 Sr. Ministro da Educação:— Sr. Presidente, quero apenas, dentro deste clima dc trégua final, de paz c de pacificação, fazer também as pazes, se é que isso alguma vez esteve em questão.

Os Srs. Deputados Vítor Costa e António Barreto sabem bem o respeito que tenho por esta Câmara c pelos Srs. Deputados. Sabem também como tenho sempre procurado honrar, com a minha presença assídua nas discussões —a Sr.' Deputada Julieta Sampaio tem sublinhado várias vezes a grande disponibilidade da equipa do Ministério da Educação —, quer no Plenário, quer nas reuniões de debate do Orçamento do Estado, etc, facultando, aliás —já o fiz em vários orçamentos anteriores—, para análise leal e aberta dos Srs. Deputados, informação extremamente pormenorizada sobre a estruturação do orçamento do Ministério da Educação, para além daquelas rubricas mais críticas que aparecem na proposta de lei funcionalmente apresentada na Assembleia da República.

Faço-o, aliás, em benefício de todos nós e creio bem que muito do pormenor e da percepção extremamente minuciosa de verbas, de políticas e até de críticas que alguns Srs. Deputados fizeram üveram lugar porque foi possível analisar-se na base da minúcia e da abertura com que foram e são sempre fornecidos os dados por parte do Ministério da Educação.

Dentro deste clima de absoluta lealdade e dc verdade que, a todo o transe, quero manter, direi ao Sr. Deputado Vítor Costa que o partir do geral para o particular ou do particular para o geral envolve métodos científicos, métodos dedutivos c métodos indutivos, como sabe — o partir do particular para o geral, como sabe, é um método bem conhecido, é um método científico —, mas não é isso que está aqui em causa.

Não pretendi, de maneira alguma, fazer um bloco homogéneo ou indiscemível da oposição, mas, antes, ser eficiente nas respostas que me pareceram mais globalizantes relativamente a várias intervenções provenientes das duas bancadas que hoje aqui intervieram em nome da oposição, mas queria dizer-lhe, muito sinceramente, que se o Sr. Deputado sc sentiu, a título pessoal ou a título institucional, de alguma maneira ofendido, peço-lhe toda a desculpa e estou pronto para reconhecer qualquer excesso que me venha a ser imputado na linguagem verbal, sempre acicatada, que tem lugar nestas reuniões. Como sabe, cia não representa menor consideração nem pelo Sr. Deputado nem pela sua bancada.

Passando ao Sr. Deputado António Barreto — e também dentro destas últimas trocas de galhardetes no encerramento do debate —, permita-me que lhe diga duas ou três coisas.

Reconheço que não é um marciano, que não desceu agora à Terra, e reconheço mesmo que, se o fosse, linha a inteligência e a perspicácia para, sendo a primeira vez que me ouvisse, ser capaz de me ripostar como riposta sempre, com grande capacidade dc argumentação e profundidade. Reconheço eu, que sou um admirador dos marcianos, nomeadamente através dos contos dc Ray Bradbury —que tem os contos mais maravilhosos sobre os marcianos, dos mais humanamente mais profundos, e donde me vem uma grande admiração pelos marcianos—, que a discussão do Orçamento do Estado não é uma questão para marcianos, mas, sim, para terrenos. E, neste caso concreto, é uma questão para terrenos portugueses, nesta Pátria concreta, nesta Nação que quer progredir C está a progredir, está a avançar c a fazer progressos assinaláveis, quer se queira quer não, em todos os domínios.

Já tenho dito várias vezes que —e eu penso como cidadão—, com toda a honestidade (não estou a fazer

nenhuma blague política nem nenhum excesso de fervor político ou pró-governamcntal), julgo que, se há crise neste momento em Portugal, se há sentimento «crísico», esse sentimento resulta de uma crise de crescimento e não de uma crise de estagnação. Porventura, até, em alguns aspectos e nalgumas vertentes, numa crise de sobreaquecimento nesse crescimento da sociedade portuguesa e das várias vertentes em que se desdobra. Aliás, o Sr. Deputado António Barreto já fez eco disso em relação a uma questão muito concreta — que penso que até já hoje trouxe à colação e que lhe tenho ouvido noutras intervenções, nomeadamente naquela que proferiu a propósito dos 700 anos da universidade — referindo algum sobreaquecimento na expansão do ensino e na expansão educativa. Isso concedo inteiramente e sou o primeiro a reconhecê-lo: não podemos continuar a este ritmo de expansão; não será, a meu ver, a política correcta.

Contudo, penso que, em termos de legislatura, este constituiu, c bem, um primeiro grande objectivo, uma grande prioridade da política educativa: o acesso, a democratização, a expansão da oferta de vagas e de oportunidades de ensino a todos os níveis. E considero isso porque, mais do que défice de ministro, o que está em causa é uma atitude ética perante um défice social — isso sim — e um défice educativo acumulado durante muitos anos. Isso é inquestionável. Não se trata aqui de atirar culpas a ninguém, não estamos em posição de emitir juízos farisaicos sobre a história, ou sobre antecessores nossos, ou sobre gerações — cada um terá, certamente, a sua opinião legítima. O que é um facto, e um facto indesmentível do ponto de vista quantitativo, qualitativo, de todas as estatísticas e indicadores que possam ser esgrimidos para comparar a nossa situação com a de países vizinhos, para comparar as oportunidades que os nossos jovens têm com as dos jovens de países vizinhos, é que tudo isso era, há poucos anos atrás, a demonstração de um défice social e de um défice educativo acumulados dc décadas, em relação aos quais é necessário adoptar medidas enérgicas para lhes pôr cobro. Julgo que estamos hoje numa situação, dc facto, estrutural e substancialmente diversa daquela cm que estávamos há quatro ou cinco anos atrás.

Estamos numa situação cm que podemos chegar a um consenso com o PS, pelo menos pela voz do Sr. Deputado António Barreto, quanto à necessidade de inflectir as prioridades, concordando em que a quantidade deixará de ser a primeira prioridade, embora deva continuar a ser preocupação; mas agora, fundamentalmente, é a reforma de natureza qualitativa, curricular, o software do sistema — digamos assim —, e já não tanto o hardware do sistema. Penso que isto é uma aquisição. E uma aquisição de legislatura, se me permitem dizê-lo, uma aquisição pacífica, dentro deste clima de tréguas e de pacificação com o qual, quero crer, podemos terminar esta nossa conversa c este nosso debate. É uma aquisição pacífica, que fica a crédito da democracia — mais uma aquisição importante a crédito da democracia e do sentido patriótico que anima o Governo, que anima o partido que apoia o Governo c que anima o principal partido da oposição, que muito respeitamos c que aqui está representado.

Não sc trata também —e o Sr. Deputado, insistentemente, utiliza-o dentro da sua proficiência linguística, não direi para distorcer mas para introduzir nuances vcrbalizantes— de um anúncio dc demissão. Não J?á demissão no termo da legislatura! No termo da legislatura, todo o governo é demitido, no sentido que o Sr. Deputado está a dizer.