O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

21 DE FEVEREIRO DE 1992

244-(171)

questão política e polírico-orçamental da Polícia Judiciária para fazer um fotograma abstracto, estático, róseo, dessa situação, como, de resto, de todas as outras!...

Há, neste momento, em Portugal — creio que isso é evidente pelas razão que já estão assinaladas e por outras —, uma certa crise de confiança na justiça, que, longe de ter diminuído, no ano passado aumentou, com fenómenos até novos de contestação de decisões judiciais, de instabilidade, de justiça privada ou de propensão para a justiça privada, o que, obviamente, é a denegação da justiça, etc.

Por outro lado, esta instabilidade desenvolve-se nos protagonistas do sistema, funcionários judiciais que ontem estiveram em greve, como é evidente. Quem ouvisse V.Ex.8 falar julgaria que os funcionários judiciais ontem estiveram ali, «estacanovisticamente», nos tribunais. Não estiveram, fizeram greve.... bastante... muito ... arrasadoramente! ... E isto no seu Ministério e não por acaso! Fizeram-no com um caderno reivindicativo específico, em relação ao qual V. Ex.1 também não se pronuncia porque prefere «dedilhar alexandrinos» sobre algumas das verbas que vai tendo, para não falar das verbas que não tem.

Portanto, Sr. Ministro, para se ter uma postura de Estado sobre a questão da justiça, a primeira regra e o primeiro pressuposto é que encaremos realisticamente, ou seja, com verdade, o panorama. E o panorama não é de molde a inspirar discursos róseos — Honni soit qui mal y pense, mas não é!

O segundo aspecto decorre de uma parte da sua intervenção. O Sr. Ministro, chegando à Assembleia da República num contexto como este, não podia deixar de saber da insatisfação e da instabilidade que reinam nas estruturas devido ao anúncio de reformas, de supetão, em domínios fulcrais, reformas que também diria estruturais, como V. Ex.8, em relação ao estatuto das magistraturas, à Lei Orgânica do Ministério Público, ao Estatuto dos Magistrados Judiciais, mas também em relação à Lei Orgância dos Tribunais Judiciais.

Ora, ficámos perplexos com as declarações do Sr. Ministro da Justiça porque, tomadas pelo valor facial ou tomadas literalmente, se quiser — e não veja nisto nenhum acinte —, elas significam o desmentido absoluto e total de tudo o que tinha vindo a lume sobre as intenções do Ministério da Justiça e do Governo neste domínio. Designadamente quanto à organização do Ministério Público, significam o anúncio formal — não digo retratação, visto que apenas havia anúncios informais — de que o Govemo não pretende rever a Lei Orgânica do Ministério Público senão ouvindo o Conselho Superior do Ministério Público e os magistrados, como tais (também pressuponho), com o tempo, o modo e a preparação adequada e, portanto, renunciando a quaisquer formas de guerrilha ou de ataques de supetão, que tinham sido receados pelos magistrados, provavelmente fundadamente, e que os levou, de resto, a dirigirem-se ao Presidente da República para lhe exprimirem a sua preocupação e, ao mesmo tempo, à opinião pública, para o anunciarem e alertarem para este risco.

Fazia, no entanto, empenho, Sr. Ministro, em que clarificasse definitivamente este aspecto, porque é intolera-velmente instabilizador que todo este conjunto de rumores, que provocam, de resto, fundados maus humores e apreensões, prossigam sem uma tomada de posição clara e frontal.

Isto é agravado porque no dia 27 está agendado para o Plenário da Assembleia da República o debate de duas

iniciativas legislativas — uma apresentada pelo Grupo Parlamentar do PS e outra apresentada pelo Grupo Parlamentar do PCP — sobre, precisamente, a constitucionali-zação da actual Lei Orgânica do Ministério Público e temos de saber o que significa aquilo que V. Ex.1, hoje, aqui veio anunciar, para saber se vamos debater alguma coisa na próxima quinta-feira, se não devemos debater nada e enveredar por um outro modus agendi que tenha em conta um universo mais largo, ou por outro caminho, mas temos de saber. A Assembleia da República não pode ser posta a funcionar ad hoc para um debate cujo contexto se alterou radicalmente, numa situação que, ela própria, tem contornos diferentes. Portanto, é fundamental para nós e é uma questão de posicionamento ter uma posição clara de V. Ex.1 sobre este aspecto.

É-me poupada a análise da massa financeira, em sentido próprio, do Ministério, mas, a esse respeito, gostaria de focar um outro aspecto que o Sr. Ministro não encarou na sua exposição. V. Ex.* anunciou um calendário de reformas. Devo dizer que o primeiro comentário que ele nos suscita é o de que é ligeiramente surrealista, sem ofensa para o Sr. Ministro, porque o Código Penal, Sr. Ministro, está preparado, quanto à revisão, como V. Ex.! sabe, desde há muitos meses—já no fim da legislatura passada havia trabalhos bastante adiantados.

Claro que, como em todas as obras em preparação, podemos sempre achar que a «sinfonia» precisa de um outro «acorde» ou que precisamos de «mudar de tempo», mas isso é outra questão.

Não se vê qualquer razão para projectar para Abril ou Maio um trabalho como este e, menos ainda, para o adiar até ao fim de 1992. A reforma do Código de Processo Penal para 1992?! A reforma do Código de Processo Penal está anunciada há meses e está em preparação há meses e é necessária como pão para a boca para que certas aberrações decorrentes da versão originária do CPP não continuem a produzir-se no dia a dia dos tribunais — hoje, a esta hora, uma vez que hoje não há greve.

Portanto, não se percebe de maneira alguma que esta reforma, que é vital neste sentido, tenha este calendário, esquisito, de resto, devo dizer-lhe. Porquê até ao fim de 1992? Afinal de contas, isto significa, desde logo, que as promessas do Governo na legislatura anterior não foram cumpridas, não foram honradas e que as reformas previstas foram atrasadas. É a primeira coisa que isto significa.

Em segundo lugar, há um prazo esquisito, adiantado — atrasado no sentido das promessas —, que é inexplicável e eu não o compreendo, pura e simplesmente.

E o mesmo se pode dizer quanto à reforma do Código de Processo Civil. O Sr. Ministro podia chegar aqui e dizer que a reforma do Código de Processo Civil encalhou e nós aceitaríamos a liberdade de linguagem com todo o gosto. Já sabíamos que tinha encalhado, unhamos percebido. Está encalhadíssimo há muitos meses e, sobretudo, aparentemente, está num beco sem saída.

Há anos e anos e anos e anos que há comissões e comissões e comissões de reforma, que reformam, reformam, reformam no papel e não reformam nada no Diário da República. E, aparentemente, a última das comissões de reforma produziu um tijolo que V. Ex.' considera inaceitável e não sabe o que é que lhe há-de fazer.

O grande problema é que o quotidiano dos tribunais também paga o anacronismo que é a legislação processual civil e isso é outro custo. Além das custas, dos encargos, etc, etc, ainda temos os custos decorrentes da morosi-dade totalmente anacrónica, anticuropeia, provavelmente