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II SÉRIE-C — NÚMERO 5
Outro sector, onde a mesma seriedade impõe que se diga que muito tem sido feito, mas onde bastante preocupação existe ainda, é o do sistema prisional. Trata-se de Uma questão relativamente à qual, entendo que, necessariamente, tem de ser debatida entre nós não apenas aqui, nesta reunião, mas — até na linha do que já foi acordado por nós — no âmbito da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias.
Uma vez que hoje não temos apenas uma abordagem, do ponto de vista da política de justiça, para o sistema prisional, não temos apenas uma análise do que é, em concreto, o funcionamento do sistema prisional, temos de ser nós, a Europa, no seu conjunto, ou se quisermos, todo o mundo — mas talvez a Europa nos chegue —, a fazer uma reflexão acerca do modo de intervenção sobre o fenómeno da criminalidade na sua globalidade, fazendo incluir também nessa reflexão aquilo que pretendemos que seja o sistema prisional.
Neste âmbito, e aqui, sim, houve, necessariamente, uma inflexão de oportunidade, mas apenas de oportunidade, no programa definido pelo Ministério da Justiça para o sistema prisional.
Como os Srs. Deputados se recordarão, criámos um programa que intitulámos «Nova Vida na Vida Prisional», no qual confiamos, programa esse que tinha e tem como objectivo essencial o de caminhar no sentido de uma política de diversificação do próprio sistema prisional, designadamente de diversificação de espaços, de níveis de disciplina e de qualidades de intervenção, através da diversificação do próprio tipo de recluso.
Esse programa, obviamente, mantém-se — é essa a intenção do Ministério da Justiça —, simplesmente, em termos de oportunidade, o Ministério foi «atropelado» por um problema novo, que não era previsível, na quantidade em que se verificou, que é o da actual superlotação das prisões portuguesas. E esse problema não era previsível, porque, no fundo, a superlotação não resulta do aumento da criminalidade ou, melhor, resulta minimamente desse aumento. É importante que isso seja retido, isto é, não há uma relação de causa/efeito entre o aumento da criminalidade e o aumento significativo do número de reclusos, ela tem algum contributo, evidentemente, mas esse era previsível e, inclusivamente, está aquém da própria previsão.
Na verdade, o problema da superlotação resulta também de duas outras previsibilidades: a da maior rapidez de funcionamento dos tribunais judiciais em matéria de aplicação do direito penal e a da maior eficiência da Polícia Judiciária no combate à criminalidade. Aí, tenho de reconhecer que não fui tão optimista como costumo ser, pois não esperava que os resultados fossem tão bons, que, tão depressa, tanta qualidade acrescida pudesse chegar aos tribunais e à Polícia Judiciária e que, portanto, pela intervenção mais célere destes sectores, viéssemos a ter de receber um número maior de reclusos.
No entanto, e esta é uma questão que, no fundo, se prende muito mais-com-a nossa posição relativamente a uma política criminal, continuo a crer que ainda hoje se recorre exageradamente a penas de prisão, sobretudo a penas curtas de prisão.
De qualquer modo, essa questão será, porventura, objecto de um debate mais alargado que teremos aqui, aquando da discussão do Código Penal, relativamente ao qual não tenho qualquer dúvida de que, muito alargadamente, nesta Assembleia da República, será um debate despido de qualquer demagogia.
Como W. Ex." sabem, tem-se tentado fazer crer que vamos apresentar um Código Penal despenalizador tout court. Ora, todos sabem que isso não é verdade. Aliás, uma das grandes razões que justificaram a revisão do Código
Penal foi exactamente a de uma maior penalização de crimes mais graves, de crimes violentos, de crimes contra as pessoas.
Por isso, quando se fala de uma intervenção no sentido daquilo que, impropriamente, se pode chamar despenalização, porque nem nesses casos o será, está a falar-se, como é evidente, da pequena criminalidade e da média ou baixa criminalidade. Aí, o debate é realmente fundamental, para sabermos até que ponto vai a nossa visão relativamente à legitimação da intervenção punitiva do Estado e não para resolvermos o problema da superlotação das cadeias. É importante que isso fique claro, para não estigmatizar negativamente o futuro debate sobre o Código Penal, pois nunca um Código Penal será uma forma estratégica de resolver um problema técnico de superlotação de prisões. Mas uma coisa é isso e outra coisa é também essa causa estar na origem da superlotação, quando não deve estar nem enquanto causa, nem enquanto forma de resolução dos problemas da superlotação.
Em todo o caso, Srs. Deputados, houve um salto quantitativo enorme, pois tínhamos uma previsão que, no limite, rondaria os 9000 reclusos, a previsão inicial era de 8500, e temos, neste momento, cerca de 11 000 reclusos.
Isto impôs que fizéssemos uma paragem na evolução do programa Nova Vida na Vida Prisional, tal como ele estava concebido, para termos, neste âmbito, uma intervenção próxima de uma intervenção de crise.
Nessa medida, decidimos construir 19 novos pavilhões para reclusos em regime aberto, relativamente aos quais posso dizer-vos que já foram todos adjudicados e as suas construções estão para muito breve, pois está previsto para cada um deles um prazo de seis meses de construção.
Por outro lado, está para entrar em funcionamento, próximo do mês de Fevereiro, o novo Estabelecimento Prisional do Funchal, que passará a ser o estabelecimento de maior qualidade em todo o País.
Também por essa altura, porventura um mês depois, entrará em funcionamento o novo grande pavilhão de Santa Cruz do Bispo, que vai ser incorporado num dos melhores estabelecimentos prisionais que temos, o de Santa Cruz do Bispo, e é também a alternativa de pavilhões dessa natureza que estamos a projectar construir, em 1994, porventura em Pinheiro da Cruz e em Alcoentre, mas, relativamente a esses, ainda há, neste momento, uma indefinição quanto ao espaço concreto para a sua instalação.
Tudo isto conduziu a uma retracção, para já, quanto ao Estabelecimento Prisional do Algarve, por uma razão muito simples: é que o estabelecimento prisional do Algarve, no máximo, no limite, comportará 500 reclusos e, neste quadro, entendemos importante não proceder ao total investimento nem a uma carga de investimento de trabalho num estabelecimento que apenas reterá 500 reclusos.
Portanto, os Estabelecimentos Prisionais do Algarve, de Viseu, para a comunidade prisional jovem, e de São Fiel, para a comunidade prisional integrada, recuam nas prioridades, para podermos atacar com este outro tipo de intervenção tendente a resolver o problema da superlotação.
Simultaneamente, far-se-á o ajustamento ao sistema prisional de um ou outro estabelecimento de reeducação de menores, visto que nessa área, hoje, há uma opção por lares limitados no espaço e na sua contextura física, para aproximação de equipas de intervenção familiar, e não pela