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296 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 70

Mas a assimilação que daí se tem de extrair é que não pode, nos dias de hoje, ir até aos extremos limites que a lógica imporia.
Já na actual organização administrativa metropolitana se distinguem as províncias continentais dos distritos autonomia das ilhas adjacentes.
A divisão administrativa e as fórmulas orgânicas estabelecidas para o continente tiveram de ceder quando se tratou de as aplicar a arquipélagos, só por o serem e por estarem distanciados da capital, muito embora haja entre a sua população e a continental uma perfeita identidade em todos os sentidos.
Quando, porém, se passa para os territórios africanos, situados na zona intertropical, com vastas extensões por desbravar, populações em regime tribal, núcleos europeus constituídos por colonos em número mínimo desgarrados das suas famílias e dos meios sociais tradicionais e ainda não congregados em novas comunidades estáveis - é manifesto que não pode pensar-se em deixar de lhes atribuir uma organização administrativa quase totalmente diversa da metropolitana.

14. O próprio ouso de Cabo Verde não parece eximir-se a esta regra. É facto que o arquipélago se pode considerar colonizado (é um dos exemplos da «função histórica» cumprida sob esse aspecto) e que nele vive uma sociedade já estabilizada, com grande número de famílias brancas, mestiças e pretas assimiladas, de antigas raízes já lançadas à terra.
Ainda existe uma considerável população negra que se não pode dizer civilizada, mas b facto é que também não é indígena, nem se encontra em estado mais atrasado que o com um das populações negras do Brasil.
Sob esse aspecto, Cabo Verde poderia passar do estatuto de colónia ao das ilhas adjacentes. Mas lucraria alguma coisa com isso? Esse é o único problema que restará resolver.
Como colónia o arquipélago desfruta ampla autonomia, possui um governador com largos poderes, junto do qual actua o Conselho de Governo, onde têm voz os representantes locais. Como distrito autónomo insular a sua administração complicar-se-ia e tornar-se-ia porventura mais dispendiosa; a legislação e o regime fiscal teriam de ajustar-se aos modelos metropolitanos; a autonomia seria suficiente para lhe não deixar receber subsídios regulares do Estado, mas não tanta que o governador não passasse às proporções modestíssimas dos governadores civis; enfim, a correspondência e dependência dos vários Ministérios não melhoraria a velocidade do estudo e da resolução dos problemas, nem a consideração dos aspectos particulares da vida de um território com três grupos étnicos e unia economia já africana.
Há circunstâncias, por outro lado, que a Câmara reconhece poderem militar a favor da integração do arquipélago «a administro cão da metrópole: a sua importância económica e estratégica como nó de comunicações marítimas e aéreas no Atlântico e o facto de já alguns dos seus serviços (defesa, aeroportos, meteorologia) estarem ligados a Ministérios metropolitanos.
É que a administração cabo-verdiana carece de ser reformada, também não há dúvida: não se trata de uma, colónia como S. Tomé ou a Guiné; impõe-se -urgentemente um esforço sério do Governo no sentido de melhorar as condições de vida da sua martirizada população, de fomentar a sua economia e de a defender contra os efeitos dos flagelos que periodicamente a assolam.
Se a ligação mais directa ao Governo metropolitano pode acelerai1 a realização dessas reformas sem os inconvenientes do desconhecimento das condições locais peculiares, dê-se depressa ao arquipélago o estatuto metropolitano. Mas a este respeito seria extremamente elucidativo seguir a experiência que a França está a colher da transformação das suas antigas colónias, da Guadalupe, da Martinica e da Reunião em departamentos, assimilados à metrópole quanto ao Governo, à administração e às leis.
É sabido tratar-se de territórios em condições muito semelhantes às de Cabo Verde: ilhas de já antigo povoamento, com uma população culta, espiritualmente assimilada, e na qual sobressaem as famílias brancas creou-las a par de um importante núcleo de mestiços e de outro constituído pelos descendentes dos escravos trazidos outrora do continente africano.
A lei de 19 de Março de 1946 pôs em execução as novas disposições constitucionais francesas quanto às vieilles colonies. O resultado imediato foi certa desorganização administrativa, agravada, com a instalação os novos serviços e a chegada dos funcionários metropolitanos, carecidos totalmente de preparação para actuar no novo meio e ... de casas para se instalarem.
Num livro recentemente publicado1 o Prof. Revert dá conta do que se tem passado e entre as diversas dificuldades encontradas nota a seguinte: «Jadis on était habitué à traiter toutes les questions d'intêret général avec le seul Ministère de la France d'Outre-mer. On est obligé de s´adresser maintenant à plusieurs et l´on n'y rencontre pas facilement le service ou le bureau compétents. Les vieilles habitudes se sont perdues, les contacts humains relachés. D'oú perte de temps et un mécontentement larvé qui s'est parfois exprimé de manière outrancière. Dans certains milieux irresponsables il a même été susurré imprudemment le not d'autonomie caraíbe ...».
E o autor, antigo e experiente colonial, conclui por propor que se confiem «toutes les affaires intéressant les nouveaux départements à une direction unique dépendant d'un grand Ministère, Intérieur ou Finances, et ou l´on eût rassemblé un ccrtain nombre d'especialistes des vieilles colonies», observando com prudente sabedoria:
«Il vant mieux, dans les circonstances présentes, éviter les heurts et les mutations trop brusques, ne fussent que pour ôter toutes appaarences de prétexte à certaines déclarations venues de la côte ferme».
A Câmara pensa, pois, que a outorga do estatuto metropolitano ao arquipélago de Cabo Verde deve ser feita com a maior circunspecção. Convirá começar por estabelecer um regime transitório em que o arquipélago goze de um estatuto ainda mais desconcentrado e descentralizado do que o das ilhas adjacentes, ficando dependente de uma pequena repartição metropolitana, que teria a sua colocação lógica na Presidência do Conselho. Através desta repartição se facilitariam os contactos da administração cabo-verdiana com os diversos Ministérios e aí se informariam os assuntos a ela respeitantes com o conhecimento especial de que carece.
Por isso sugere que na Constituição fique apenas um preceito - que deverá constituir o § único do artigo 3.º do Acto Colonial - permitindo ao legislador ordinário que faça a integração progressiva da administração cabo-verdiano na da metrópole.

15.º Voltando à questão da denominação, a Câmara Corporativa compreende que o Governo sinta a conveniência de nesta oportunidade substituir a designação de colónias por outra. Mas qual?
Aqui as opiniões dividem-se. A adopção da expressão províncias ultramarinas reúne os sufrágios de muitos e ilustres colonialistas e tem a simpatia de parte da Câ-

1 Terres lontaines - La France d'Amérique, 1949, ver p. 168.