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22 DE ABRIL DE 1952 815

Afinal, Sr. Presidente, a Direcção-Geral de Saúde não pôde chegar a conclusões diferentes daquelas a que chegara o Dr. Cutileiro: a doença era, na verdade, uma salmonelose, provocada pela snlmonella typki-muriurum, transmitida por ovos consumidos no hospital.
Houve apenas uma diferença: o Dr. Cutileiro chegou a essa conclusão em dez ou onze escassos dias de trabalho, ao passo que os serviços competentes da Direcção-Geral de Saúde, apesar de informados das diligências e resultados que tal médico ia realizando e conseguindo, levaram mais de mês e meio a chegar as mesmas conclusões.

É para mim motivo de grande perplexidade a manifesta lentidão com que os serviços oficiais se houveram. Afinal, um homem expedito, sem o labirinto burocrático a enredá-lo, mostrou-se de uma eficiência muitíssimo superior à dos bem apetrechados e quiçá bem burocratizados serviços oficiais!

A saúde pública ficou devendo ao Dr. Cutileiro não pequeno serviço; mas isso não lhe evitou um processo disciplinar e correlativa sanção.

Pois já que se puniu o médico funcionário e não quero apreciar se bem se mal, era-lhe devida, ao menos, a palavra de justiça a que tinha direito. E, porque se lançaram dúvidas sobre as conclusões a que chegara, era obrigação da Direcção-Geral de Saúde, quando pelos seus serviços as viu confirmadas, dar público conhecimento desse facto, já que a público, trouxera a questão e também as dúvidas.

Vozes: - Muito bem!

O Orador:-Não conheço o Dr. Cutileiro e dizem-me não comungar as ideias políticas que perfilho. Isso não me impede, porém, de lhe dirigir daqui a palavra de justiça que lhe era devida e não ouviu ainda e dizer que compreendo bem a amargura com que termina o seu livro sobre este triste caso. Teve plena razão.

Vozes: - Muito bem!

O Orador:-Entendi e entendo ainda que a Direcção-Geral de Saúde, tão solícita em prevenir o público contra a aceitação precipitada das conclusões do Dr. Cutileiro, deveria igualmente já que naquele caso e para aquele efeito quebrara o seu cómodo mutismo , deveria, repito, logo que pudesse, fazer cessar o estado de dúvida a que dera causa. Manda-me informar, porém, o Sr. Ministro do Interior ter-se considerado inconveniente alarmar o público com a revelação do modo como a doença se originara. Desde que a doença fora transmitida por ovos adquiridos em certo mercado e infectados, segundo se supõe, nesse mesmo mercado, poderia o público, diz-se, supor que todos os ovos dos restantes mercados eram veículo possível da mesma doença.

Ora o público já não podia alarmar-se com isso, pois o Dr. Cutileiro, na Sociedade de Ciências Médicas e depois em livro, indicou os ovos como transmissores da doença, embora adquiridos noutro local.

Concedendo, embora, que havia o perigo de criar tal alarme, nada obrigava a dizer onde os ovos foram adquiridos e muito menos o mecanismo da sua infecção.
Para tranquilizar o público, cuido eu, bastaria dizer que tinham sido tomadas as medidas adequadas para evitar a repetição de semelhante acidente. Penso, portanto, que era obrigação dos serviços tranquilizar o público e, de igual passo, prestar ao Dr. Cutileiro a justiça que lhe era devida. Assim, nem uma nem outra, coisa se fez.

Sobre o modo como os ovos se transformaram em agentes transmissores da doença permito-me, com a devida vénia para os entendidos, fazer tímidas reflexões.
Supondo que os ovos não provieram de aves atacadas de salmonelose e que foi no local de venda que se infectaram exteriormente, não vejo como só os ovos merecessem a preferência do agente infectante e fossem os únicos escolhidos entre tantos e tão variados veículos possíveis.

E porque não haviam de ter colaborado na difusão da doença os legumes, hortaliças, frutas e tantos outros alimentos, existentes no local e ao alcance do contágio infeccioso? A preferência pelos ovos e, dentre estes, por certo lote é um tanto estranha. Em todo o caso, aqui fica o tema para meditação de sábios e curiosos.

Sobre isto nada mais direi.
Só porque estou tratando do assunto relacionado com a saúde pública, peço licença, Sr. Presidente, para apoiar as considerações do ilustre relator das contas públicas quando refere a necessidade de dotar o Instituto de Higiene Dr. Ricardo Jorge com edifício adequado aos muitos serviços que ali funcionam. O material é muito o bom, mas está já excessivamente aglomerado para se obter dele todo o rendimento. Faço votos para que tais serviços sejam dotados com instalação adequada à sua função e ao muito que o País deles espera e podem realizar.

Vozes: - Muito bem!

O Orador:-Para terminar, Sr. Presidente, quero referir-me ao doloroso desapontamento que sofri ao compulsar, por necessidade de trabalho de que mo ocupo, o Boletim da Organização Mundial da Saúde, vol. m, n.º 10, publicado em Outubro de 1950.

Num artigo sobre mortalidade por tuberculose inserto naquela publicação chega-se à conclusão de que Portugal e a Escócia são os dois únicos países da Europa onde a taxa de mortalidade por tuberculose aumentou no período de 1947-1949, em comparação com a taxa referida ao período de 1937-1939.
Na verdade, e segundo o quadro estatístico que ilustra o referido artigo, verifica-se que entre nós a taxa de mortalidade de 1937-1939 foi de 148,9 por 100:000 habitantes e a de 1947-1949, para o mesmo número de habitantes, foi de 149,9. O autor deste artigo borda sobre esto facto alarmante e inteiramente inesperado as considerações que melancolicamente vou transcrever:
Pelo que respeita à tuberculose, Portugal e a Espanha acusam, com a Finlândia, as taxas mais elevadas do grupo de países europeus que figuram no quadro. Todavia, enquanto as taxas finlandesas baixam de novo, não sucede o mesmo em Portugal e na Espanha. Nenhum destes países participou directamente na segunda guerra mundial, ainda que a falta de transportes marítimos tenha impedido em Portugal a importação de produtos alimentares essenciais e provocado uma alta do custo de vida, que atingiu particularmente as classes inferiores e médias da população. Todavia, depois da guerra não se verificaram senão poucas ou nenhumas melhoras nas taxas de mortalidade espanholas ou portuguesas, contrariamente às constatações que podem fazer-se em grande número de outros países da Europa.
E mais adiante escreve-se ainda:

Resta a Escócia, que, com Portugal, possui a particularidade pouco invejável de ser um dos dois países que figuram no quadro acusando um aumento da mortalidade por tuberculose no período de 1947-1949, em comparação com as taxas de 1937-1939.
Ignoro se os números publicados são exactos. Se o não são, importa corrigi-los sem demora e averiguar, quem