22 DE ABRIL DE 1952 823
Presentemente na Inglaterra o imposto sobre os lucros excessivos é de 30 por cento líquidos acima da média dos anos de 1947, 1948 e 1949 e nos Estados Unidos da América também uma pesadíssima contribuição recai sobre os lucros anormais, baseada nos preços correspondentes aos anos de 1946 a 1949. Se a fixação da taxa fiscal das maiores valias dos nossos produtos ultramarinos seguisse o molde inglês ou americano, quanto mais altas não seriam as importâncias a cobrar!
Quer dizer: a tributação agora estabelecida é, para a quase totalidade dos produtos abrangidos pelo Decreto-Lei n.º 38:704, muito mais benigna do que a equivalente em outros países e mesmo do que a existente na metrópole, para a qual o Decreto-Lei n.º 38:400 prevê a possibilidade de a sua elevação ir até 60 por cento dos lucros excessivos - enquanto aquela não ultrapassará 15 a 17 por cento!
O Sr. Botelho Moniz: - Na prática, esse decreto já não está em vigor na metrópole.
O Orador: - Não me consta que tal diploma haja sido revogado; se ele até é referido num telegrama do Sr. Presidente do Conselho publicado pelos jornais e já mais de uma vez citado durante este debate!
Sr. Presidente: um dos argumentos condenatórios do decreto-lei em debate que também tenho ouvido invocar consiste na obrigatoriedade do depósito monetário...
O Sr. Botelho Moniz: - Realmente não é só isso que os arruina.
O Orador:- ... no momento da exportação, quando ainda não foi recebida a importância da sua venda, facto que acarretará ao exportador prejuízos apreciáveis. A isto responder-se-á: está claro que o exportador nunca colocará a mercadoria a bordo sem que previamente esteja na posse do numerário ou do substituto documento de crédito, além de ser perfeitamente admissível a instituição duma modalidade de pagamento na alfândega de toda ou parte da percentagem, por meio de um termo de fiança, válido por determinado tempo.
Por me parecer conveniente, farei uns rápidos apontamentos sobre o capital convertido em títulos do empréstimo emitido nas condições da alínea b) do artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 38:704 e sobre a utilização dos dinheiros do Fundo de Fomento e Povoamento.
Desconheço os fundamentos concretos em que assentam certas ilações, como sejam as que declaram que a maioria dos produtores não poderá obter prioridade para o emprego, em proveito próprio, do capital depositado, os quais, pelo contrário, a exemplo dos exportadores, se verão obrigados a receber títulos dos empréstimos provinciais de 3 por cento ilíquidos.
Estou convencido de que o resgate e reembolso dos títulos do empréstimo se poderão fazer quando os seus donos hajam necessidade do dinheiro cativo para empreendimentos taxativamente expressos na alínea a) do artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 38:704; e, em inteira concordância com a magnífica doutrina do diploma, a prioridade da utilização de capital do Fundo de Fomento e Povoamento pelos seus donos há-de certamente ser concedida sempre que eles visem aumento e valorização da produção agrícola ou melhoria económica das propriedades rústicas ou urbanas, a fundação de novas empresas de interesse geral e ainda quando da mecanização das actividades produtivas provenha alargamento da exploração, limitando o aproveitamento da mão-de-obra indígena, tão precisa para fomentar outras fontes de riqueza nas quais a máquina não possa ser empregada, por inaplicável ou pouco eficiente.
Sr. Presidente: quero ainda dizer que creio que ninguém pretendeu menosprezar a activa função económica do comércio exportador, nem prejudicar, nem tão-pouco diminuir, o merecimento dos seus agentes, que toda a Nação aprecia devidamente. Realmente, um dos preceitos do Decreto-Lei n.º 38:704 que muito tem sido comentado consiste no mais benevolente tratamento fiscal reservado para o excesso dos lucros do produtor-exportador - 15 por cento, enquanto os exportadores ficarão sujeitos à taxa de 17 por cento.
Semelhante diferença tributária é classificada de injusta e lesiva dos interesses do comércio exportador: injusta, porque esta actividade tem concorrido bastante para a prosperidade do ultramar; lesiva, porque a compra da mercadoria em regime de concorrência levará os comerciantes a adquiri-la pelos preços por que os produtores lha queiram vender, os quais beneficiarão duplamente - da sobrevalorização e da menor taxa fiscal.
Por conseguinte, tais intenções protectoras favorecerão apenas os grandes produtores, os únicos que têm possibilidades financeiras para comprar e exportar toda a produção local, já que os produtores indígenas e os pequenos produtores europeus, desprovidos de meios pecuniários e de organização comercial, estão impedidos de vender para os mercados externos.
Quer dizer: como consequência da aplicação do decreto-lei em debate, aparecerão a ruína da maioria dos exportadores e o envilecimento dos preços, circunstâncias que celeremente se reflectirão sobre a economia, com efeitos inversos dos que o diploma pretende obter!
Parece-me que estas apreensões não se justificam. Senão vejamos: o milho é quase todo cultivado pelos indígenas, sucedendo o mesmo com uma parte muito apreciável da produção do café, copra e castanha de caju; o cereal está tabelado e é de esperar que brevemente se verifique o tabelamento dos três produtos referidos - e de modo que os interesses dos nativos não sejam afectados nem diminuídos os preços de 1949, já fortemente remuneradores.
Não estamos nós numa República Corporativa? Estamos. Pois será excelente oportunidade para se efectivar, de maneira prática, a sua doutrina em Angola e Moçambique, metendo em regime de corporativismo os pequenos produtores europeus, com a ajuda dos organismos coordenadores e disciplinadores já existentes, obstando-se ao aviltamento dos preços respectivos. Mas isto é matéria regulamentar, e não podemos deixar de confiar incondicionalmente em Salazar, no seu nunca desmentido bom senso.
Sr. Presidente: não posso estar de acordo com os princípios eclécticos de certo orador, pois, no louvável desejo de glorificar as empresas privadas, tanto desconsidera as iniciativas do Estado, «quase sempre tardias e descoordenadas, com erros totais», como exalta «as suas esplêndidas realizações».
Como se os Governos do Estado Novo não fossem os principais impulsionadores da admirável prosperidade e do enorme prestígio internacional de que Portugal de aquém e de além-mar ora desfruta e de que tão legitimamente se ufana!
Que notável papel não têm desempenhado o Banco Nacional Ultramarino e o Banco de Angola no engrandecimento económico e social das nossas terras de além-mar! Olvidar a sua brilhante actuação - que tantos salvou da derrocada, em épocas de crise - seria ingratidão.
E alguém poderá, porventura, ignorar, ou sequer esquecer, quanto a intensificação do fomento, a melhoria da qualidade e o aumento do preço dos produtos ricos do nosso ultramar devem ao Estado, por intermédio da excelente actuação dos organismos de coordenação económica instituídos pela Revolução Nacional - Junta de Exportação do Algodão Colonial, juntas de exportação, Junta de Exportação do Café Colonial?