15 DE DEZEMBRO DE 1992
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do sistema. Foi esta a ideia base com que fiquei da sua intervenção, em que, fundamentalmente, se referiu à nova proposta de reformulação do Serviço Nacional de Saúde. Enfim, não sei se é Serviço Nacional de Saúde, se sistema nacional de saúde ou se serviço nacional de seguros!... Qualquer coisa deste género irá, com certeza sair desta politica
Digo isto porque nós, parlamentares, continuamos exactamente sem saber quais são os coelhos que V. Ex.* irá tirar da cartola Porque, perante tanta legislação acessória que é necessária para regulamentar aquilo de que temos conhecimento, as hipóteses ou alternativas são de tal forma que poderemos pensar que, para além de regulamentar a Lei de Bases da Saúde, o Ministério da Saúde pretende até construir uma nova lei e, provavelmente, à revelia da Constituição da República Portuguesa
As questões que referiu do Serviço Nacional de Saúde relacionam-se directamente com o orçamento porque do funcionamento dos serviços futuros irá, com certeza depender em grande parte a viabilização do sistema mas de qualquer forma quando V. Ex." fala em humanização ou em qualidade, permita-me que fique um pouco céptico em relação a essas questões.
Porque aquilo que o meu partido entende é que este Ministério da Saúde pretende criar um sistema autoritário através de uma «capitalização forçada» — permita-me esta expressão — do Serviço Nacional de Saúde e, hoje, começa a apontar-se para que essa «capitalização forçada» se faça à custa da redução de direitos adquiridos pelos profissionais, pelas populações e pelos utentes em geral. São as taxas moderadoras que, como V. Ex.° disse, prevêem um grande aumento das receitas próprias, mas não sabemos à custa de quê. Não me parece que os atrasos dos pagamentos aos hospitais, que existem por parte de algumas instituições, sejam tão significativos como isso. Exemplo dessa situação foi a recente visita efectuada pela Comissão de Saúde a Évora em que foi referido por um administrador hospitalar que as dívidas das companhias de seguros ou outras eram uma questão mínima dentro do hospital.
A principal forma de financiamento que tinham — e permitam-me que cite — era, exactamente, o endividamento. Com efeito, só tinham uma maneira de modernizar os meios e de investir, era ficarem a dever. Inclusivamente, davam até o exemplo dos milhares de contas que estão a dever neste momento devido aos investimentos que fizeram, não se preocupando sequer com o pagamento.
Isto leva-nos directamente à questão principal, que é a questão do orçamento. Não são dados do meu partido, nem sequer do Partido Socialista mas que podem ser lidos das documentos que V. Ex.' distribuiu.
A dívida do Ministério da Saúde, neste momento, são 114 milhões de contos. Esta verba representa talvez, um quarto do dinheiro disponível para o orçamento do Ministério da Saúde. É certo que para V. Ex.° não é o orçamento que gostaria de ter— é o orçamento possível, eventualmente —, mas, logo a seguir, prende-nos com um tal caudal de ideias optimistas que duvido em grande parte que V. Ex.' admita que o orçamento não é aquilo que queria. Se não fosse assim, não poderia estar tão optimista em relação ao futuro, pois quais são as consequências que irá ter com este agravamento das dívidas?
Hoje em dia verificamos que em relação às farmácias existem, eventualmente, milhões de contos de dívidas. Por exemplo, os utentes de radiologia do Serviço Nacional de Saúde de Lisboa e Porto, hoje, se quiserem fazer uma radiografia pagam-na Já andam assim há muito tempo e no Porto, talvez, desde o princípio do ano.
Na Comissão de Saúde também já recebemos os radiologistas e disseram-nos que nem sequer pretendiam a reformulação e a revisão da convenção, mas, pura e simplesmente, que os utentes que lá chegassem pagassem e depois fossem receber a parte mínima do Estado, já que este, comparticipando como comparticipa para eles pouco lhes interessava É esta política que referi há pouco, que é a capitalização forçada As pessoas vão ter de pagar e sobre isso não há qualquer dúvida
Sr. Ministro, como é possível entendermos que é real esse aumento de 14 % do Ministério da Saúde quando, na prática se formos detalhadamente às instituições verificar qual é o aumento para funcionamento, não atingimos na maior parte dos casos aumentos para consumos maiores de 5 %? Por exemplo, lembro-me dos hospitais, onde esse aumento ronda os 5 % e sabe-se que a inflação nos materiais relacionados com a saúde é no mínimo o dobro da prevista
Portanto, não entendo como vai ser possível modernizar os meios e as instalações. Não entendo como é possível modernizar e dar qualidade ao serviço quando se pretende exactamente penalizar os profissionais. Infelizmente, teremos de nos cingir às notícias que vão saindo a público e onde se prevêem restrições ao pessoal. Isto é, o quadro dos excedentários, como é chamado, vai ser aplicado na saúde? É que se fala com bastante insistência e até hoje o Ministério da Saúde não foi capaz de desmentir, nem sequer de assumir, as reduções que vão ter em termos de pessoal.
Relativamente ao PIDDAC, permita-me que também coloque em duvida a tal viabilização do sistema porque no meu partido entendemos que qualquer sistema de saúde para ser viável em Portugal terá de assentar, fundamentalmente, numa rede funcionante que dê resposta aos cuidados primários de saúde. Com efeito, é dando resposta localmente às populações que se vai evitar o entupimento dos hospitais a que se assiste neste momento.
As consultas que muitos hospitais vão hoje reclamando como aumentando em número significativo— porque lhe vão dar receita — quanto a mim não tem razão de ser porque apenas deveriam atender doentes referenciados.
Os cuidados de saúde deveriam ser privilegiados em termos de PLDDAC, mas verificamos que apenas existem 3 milhões de contos para centros de saúde. E uma quantia ridícula atendendo ao funcionamento da maior parte dos centros de saúde que existem neste pais: uns colocados em andares habiticionais, sem quaisquer condições de higiene, inclusivamente; alguns, hoje, em Portugal, ainda não têm sequer casa de banho nem para os doentes nem para os profissionais de saúde e, embora não sejam muitos, o que acontece é que nesses casas não existe sequer a possibilidade de lavar as mãos depois do acto médico.
O Sr. Ministro da Saúde: — Quais, Sr. Deputado?
O Orador: — Sr. Ministro, posso dar-lhe uma lista e até a tenho aqui. Por exemplo, no concelho do Sardoal existe um posto onde o médico para lá ir tem de atravessar o milheiral a pé porque nem de carro lá pode ir. É um local onde os doentes são atendidos!...
É esta a questão que me preocupa Qual a forma que vai encontrar para viabilizar os cuidados primários? Ou será que o Ministério da Saúde, como aponta em termos de PLDDAC e em termos de investimento, vai apostar numa política centralizada — como agora se diz —, hospital ou comunitária em que os doentes serão eventualmente transferidos de autocarro para as consultas e em vez de investirem em centros de sáude, permita-me esta graça invistam em autocarros?