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15 DE DEZEMBRO DE 1992

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digo Penal. Pelo contrário, a nossa perspectiva é a de permitir agora, com a revisão que está na fase final de elaboração, vir levar tão longe quanto era inicialmente desejada essa política criminal que preexistia ao próprio Código.

A este propósito, posso dar um exemplo. Embora não seja, porventura, o local mais adequado para fazer uma explicitação demasiada extensa, dar-lhe-ei um exemplo que é fundamental. Como V. Ex.* sabe, o Código de Processo Penal, publicado já posteriormente ao Código Penal, vem estabelecer uma distinção que nos parece essencial — que começa a colher aceitação nos vários meios jurídicos e judiciários portugueses e espero que, a breve trecho, na sociedade portuguesa no seu conjunto— entre a chamada criminalidade de consenso e criminalidade de conflito.

Assim, o processo penal, permite que, hoje, no domínio da chamada criminalidade de consenso, haja já uma série de medidas alternativas em termos não tecnicamente, de todo em lodo, correctos do ponto de vista adjectivo, na área de um direito processual que, sendo adjecüvo, tem muito de material e de substantivo, como é o processo penal.

Ora, o importante agora é que o Código Penal venha, no fecho do tecto definitivo do sistema penal português, ser coerente e coincidente com esta distinção entre criminalidade de consenso e de conflito. E uma das conclusões a que, facilmente, pudemos chegar foi a de que, naquilo que no Código Penal está previsto, como as chamadas medidas alternativas à pena de prisão, a previsão dos pressupostos não foi suficientemente corajosa, não permitindo, portanto, que hoje a maior parte dos tribunais tenha à sua disposição meios legais suficientes para que a adopção das medidas alternativas à pena de prisão sejam uma realidade.

É evidente que há também aqui um outro esforço de formação, que quase diria cultural, dos agentes de intervenção, para que eles próprios, também, o façam. Alias, esse tem sido um trabalho, e suponho que meritório, levado a cabo pelo Centro de Estudos Judiciários, onde esta linha foi sempre defendida.

Hoje, na revisão que vamos introduzir no Código Penal, vamos alargar, justamente na moldura abstrata, a possibilidade de aplicação de medidas alternativas para que desapareça a razão que tem sido invocada, segundo a qual essas medidas alternativas não se aplicam porque a previsão é de tal maneira estreita que não chega a haver casos de prisão que venham, depois, a ser substituídos por essas medidas alternativas. Esta é uma das perspectivas essenciais da revisão actualmente em curso.

Por outro lado, se V. Ex.* se recordar dos trabalhos preparatórios de então, verifica que foram algumas razões de exigência exógena à própria Comissão que o determinaram e que, .quase no último momento, houve um aumento significativo das penas previstas para os crimes contra a propriedade e património, uma vez que era aí que se gerava uma maior insegurança na altura e porque, do ponto de vista social, se reclamava que se actuasse de forma mais «repressiva», se se entender nesse domínio.

Contudo, do ponto de vista de filosofia global, tal acabou por vir a introduzir alguma distorção, fazendo que, em alguns casos, os crimes contra as pessoas acabassem por ser punidos de forma menos severa do que os crimes contra o património. É justamente nessa área que vamos intervir e, portanto, o chamado aumento da dosimetria da pena vai acontecer exactamente no domínio dos crimes contra as pessoas.

Sei que havia outra alternativa: diminuir as penas dos crimes contra o património. Porém, V. Ex.* sabe que, mesmo na ausência de institutos de criminologia há hoje regras aceites por aquilo que, no fundo, se conhece da evolução da criminologia em toda a parte. Com efeito, sabe-se que, do ponto de vista filosófico, os crimes contra as pessoas não devem ser punidos, para não dar uma referência negativa de forma menos severa do que os crimes contra

o património.

No entanto, não basta colocar as questões apenas em termos de comparação de valores, pessoas e bens; é também necessário fazê-lo em termos de eficácia de intervenção da própria lei penal, jogando, portanto, com o que são, no fundo, as exigências de prevenção por aquilo que é referido pela maior taxa de criminalidade. Ora essa maior taxa de criminalidade é, claramente, mais expressiva no domínio dos crimes contra o património do que no dos crimes contra as pessoas.

Foi esta a razão que nos levou a optar por elevar as penas dos crimes contra as pessoas, deixando, todavia um Código Penal com um máximo de dosimetria abstracta da pena a uma distância enorme dos países que têm, realmente, uma visão repressiva, no pior sentido do termo, relativamente à intervenção do sistema penal.

Por outro lado, actuámos através de molduras que apelam e continuam a apelar para o papel importante da intervenção dos tribunais. De facto, Sr. Deputado, também por aí se respeita a independência dos tribunais. A independência dos tribunais não se respeita apenas através de um quadro formal e institucional, respeita-se, sobretudo, através de uma afirmação de confiança material de intervenção: fazer que a lei permita que os tribunais, actuando com independência, sejam eles próprios capazes de adequar, em cada situação concreta, o direito abstracto à realidade que se lhes impõe. Também aí não vamos introduzir alterações significativas.

Com efeito, não só confiamos nos tribunais portugueses como garantimos a independência para a sua intervenção, o que, obviamente, acaba sempre, porque é um desvio relativamente ao que são os valores essenciais de um Estado de direito e da democracia por criar algumas dis-funcionalidades. No entanto, as disfuncionalidades da independência dos tribunais são, no fundo, o preço mínimo que se paga por um bem superior: a garantia da própria independência mas uma independência com juízes que, sendo independentes, têm margem de intervenção para afirmação da sua independência. Não podemos, formalmente, dar independência aos juízes e, depois, «legislar por circular», retirando, portanto, na prática, a independência de que os juízes devem, obviamente, gozar.

Ora, é justamente nesta perspectiva que não acreditamos que venha a produzir-se, por esta via qualquer tipo de bloqueamento do sistema prisional. Ele pode vir a produzir-se, como está a acontecer neste momento, mais por razões de natureza positiva, isto é, pela maior capacidade de resposta dos tribunais, por uma maior e mais rápida capacidade de decisão e, portanto, por um número maior de pessoas condenadas, não por que exista proporcionalmente, um número maior de criminosos ou de crimes cometidos, mas porque há, efectivamente, uma capacidade de resposta do sistema que, na área do processo penal e, sobretudo, em toda a criminalidade cometida no âmbito do novo Código de Processo Penal, é já de todos conhecida Hoje, parece-me evidente que, salvo algumas raras situações de bloqueio, na globalidade a resposta da justiça penal é imensamente mais rápida do que hí uns fem-