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2 DE ABRIL DE 1986

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Mais me preocupa ainda o que se passa com a Direcção-Geral da Acção Cultural. Não ignoro o tipo de críticas que é costume lançar à DGAC, desde logo porque tem um aparelho burocrático pesado e extenso, o que é, em grande medida, falso, pois só 55% dos quadros estão preenchidos e poderia, portanto, de acordo com alguns dos vícios da Administração Pública portuguesa, encontrar-se em estado muito pior. O que acontece é que o pessoal não está suficientemente rendibilizado. E a DGAC desempenha uma actividade relevante, de apoio a todo o vastíssimo conjunto de iniciativas que de ponta a ponta do País vêm tendo lugar, muitas delas vivendo em franca penúria e mesmo a exaurir-se, devido à falta de suporte material e de consideração da sua importância.

Uma das verbas que eu gostaria de obter com detalhe é a vocacionada para a animação cultural. Em todos os papéis que teve a gentileza de depositar na Mesa da Comissão nada se diz sobre isso. Também as transferências para instituições particulares são demasiado inconcretizadas, 157 703 contos, e eu pedia-lhe, se não fosse exagerado e grosseiro da minha parte, que me desse alguma explicação sobre os vectores que presidiram a esta quantificação e sobre quais os objectivos que com ela se pretendem.

É que eu creio que é através da DGAC, mais do que através de qualquer outro dos serviços da Secretaria de Estado da Cultura, que se consegue esta realidade fundamental: pôr a cultura fora da Avenida da República, fazer com que o papel do Estado se não confine ao seu Auditório de Carlos Seixas e à sua torre de marfim, ao seu Halley Hall. .. muito interessante e discutível em alguns aspectos...

Vozes inaudíveis.

Eu estou a dizer «seu» da Secretaria de Estado, não pretendo ser ominoso...

A Sr.a Secretária de Estado da Cultura: — Não

estou de acordo!

O Orador: — Eu sei que sim. É que é um estilo de exibir cultura e ainda bem que não está de acordo com ele.

Portanto, como dizia, é uma das formas de fazer com que o Estado saia da Avenida da República e acompanhe, de acordo com o que a Constituição estabelece como uma das suas injunções fundamentais, as realizações das associações, das organizações populares e dos grupos. Assim, se a Direcção-Geral da Acção Cultural não tiver meios, frustrará tal objectivo.

Outra questão importante que se levanta é a dos instrumentos musicais — a sua aquisição ou a participação na sua aquisição.

Os instrumentos musicais são hoje de altíssimo custo. Mesmo com a baixa do dólar — creio que a do iene também, embora relativa e por arrastamento —, eles continuam a ser importados a preços muito elevados. Assim, importará considerar, no âmbito do Orçamento do Estado, a desoneração possível da importação desses instrumentos e, sobretudo, da venda aos particulares que desejem praticar a actividade musical.

Os impostos só são arrecadados pelo Estado na medida em que houver vendas, e o que está a acontecer é que, neste domínio, aumenta de forma perfeita-

mente espantosa o mercado paralelo, sendo que do ponto de vista do controle dos dinheiros públicos e do trânsito dos dinheiros através de fronteiras tudo permanece numa anemia indébita.

Entretanto, preocupa-me o seguinte: certamente que a Sr. Secretária de Estado e os Srs. Deputados têm conhecimento das muitas e muitas ponderadas palavras que, por exemplo, o Carlos Paredes e o Pedro Caldeira Cabral têm proferido acerca da necessidade de apoiar uma verdadeira promoção dos instrumentos musicais portugueses. Com efeito, está a perder-se, inteiramente a perder-se, uma escola, de altíssimo valor, de construção de instrumentos nossos. É o que acontece com a guitarra portuguesa, mas também com outros instrumentos populares que tem sido possível recolher e recuperar a partir do esforço e do labor relevante de algumas personalidades.

Creio que neste capitulo era preciso ser um pouco audaz e encontrar formas de apoio aos artesãos e aos pequenos produtores, que existem especialmente no Norte do País e que vivem com carências e grandes dificuldades.

Por outro lado, os 2 000 contos previstos para a formação de especialistas da regência de bandas filarmónicas fazem-me supor que as ajudas para aquisição de instrumentos por essas mesmas bandas estão incluídas na outra verba que vem mais ao lado, da ordem dos 20 000 contos, já mais elevada, embora também se me afigure não ser excessiva.

Gostaria de lhe pedir esclarecimentos relativamente ao problema da intervenção discográfica.

Trata-se de uma frente bastante importante, da qual se conhece muito pouco. Pessoalmente, teria o maior interesse em saber qual o plano de actividades que se visa com o que está estabelecido. Vai continuar a edição de grandes cantores líricos, como o Edmundo Bettencourt, que chegou a ser referido anteriormente, o Estêvão Amarante ou os recitadores de poesia de grande qualidade? Suponho que se mantém de pé o projecto de viabilização de intervenção nesse domínio.

Ainda no âmbito da Direcção-Geral da Acção Cultural, coloca-se a magna questão do Fundo do Teatro. A Sr.a Secretária de Estado espera, certamente, um pouco o que vou dizer.

As dotações são, por exemplo, menores do que as que estão destinada para o Teatro de D. Maria 11, isto é, todo o teatro independente dispõe de menos dinheiro do que aquele que está consignado para o Teatro de D. Maria II.

Não gostaria de entrar muito na discussão — porque penso que não há talvez muito lugar agora, embora fosse extremamente interessante — de saber se o Teatro de D. Maria II deve ou não ter tanto dinheiro. No entanto, o que me parece é que há aqui uma distorção que importa ter em conta e que importa corrigir: todo o teatro independente dispõe, quando muito, incluindo os 4000 contos das contas de ordem, de 162 000 contos, enquanto o Teatro de D. Maria II tem, no total, 179 862 contos.

Esta é, de facto, uma velha batalha, travada por muitos agentes da produção teatral em Portugal. Creio que merece uma ponderação muito aprofundada por parte do poder político e que será de toda a premência, no mínimo, não irrelevar os montantes para a produção regular dos grupos autónomos, onde quer que se situem (na descentralização ou não), não aumentando e hiperbolizando excessivamente o que está destinado ao Teatro de D. Maria II.