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II SÉRIE-C — NÚMERO 5
soa deve ficar salvaguardada, me desse -a indicação da pessoa em concreto, do estabelecimento onde está colocado —■■ como calcula, uma situação deste tipo e ainda por cima quando acaba de me dizer que há todas as condições para que a medicação seja ministrada e só o não é por razões que, obviamente, não são susceptíveis de serem entendidas não é admissível—para que, como Ministro da Justiça, possa intervir o mais rapidamente possível.
Passando às outras questões e começando pela Sr.a Deputada Odete Santos, gostaria de começar por deixar bem esclarecido-—porque há uma questão que não queria, em circunstância nenhuma, que fosse mal interpretada e aqui posso invocar o conjunto de intervenções passadas nesse sentido— que quando falei da inexistência de uma cultura de cumprimento de prazos não estava a fazer nenhum tipo de censura dirigida a ninguém em particular, mas, se quiser, entendá-a como uma atitude global de todos nós que tem de ser mudada. Efectivamente, não há uma cultura de cumprimento de prazos e por uma razão muito simples. É que não há no sistema de justiça — e eu conheço-o muito bem — uma cultura de eficácia e, repito, isto não é uma censura porque, eu próprio, durante muitos anos fui magistrado, exerci funções como magistrado e sei que é assim, até porque durante muito tempo se entendia que a eficácia estava fora do sistema, aliás, da mesma maneira que estava fora do direito que não tinha de ser eficaz.
E não vale a pena estarmos aqui a fazer uma intervenção de natureza mais filosófica ou ideológica sobre a concepção do sistema, porque todos sabemos que é assim. É muito recente a inclusão da eficácia como valor ao nível da segurança, da independência, da qualidade da intervenção, a eficácia estava fora e muitas vezes até era desprezada, através de um discurso contra uma visão tecnocrática de intervenção do sistema.
Portanto, essa cultura tem de ser reconduzida à interioridade do sistema e eu não tenho nenhuma dúvida em afirmar que problemas como o da aceleração da justiça têm de ser integrados'na nossa cultura como um dever cívico e não esperarmos todos que apenas através de mecanismos de intervenção por parte do Governo se resolva de uma vez por todas o problema da lentidão da justiça. Enquanto não for integrado como um dever cívico que todos os cidadãos devem cumprir e assumir como seu, o problema da lentidão da justiça será um problema a superar com lentidão, o que, obviamente, é desagradável para lodos nós.
Agora, essa cuitura existe de facto e acho que não ganhamos nada em escamotear que existe essa cultura ou que não existe, dizendo, pela negativa, que nãoexiste essa cultura da eficácia e da celeridade. Acho que atirarmos areia para os nossos próprios olhos nãó vale a pena, não é necessário fazê-lo porque isso vai atrasar um processo de recuperação que não queremos fazer contra ninguém mas que queremos fazer, obviamente, a favor do cidadão — e aqui supomos que estamos todos de acordo.
A Sr.° Deputada,'que tem a sua intervenção muito vocacionada para esta área, certamente tem visto que, variadíssimas vezes, em intervenções públicas, lenho, sistematicamente, recusado um alijar de responsabilidades para o lado de quem actua na área dos tribunais, sejam eles advogados, magistrados ou funcionários; embora todos estejamos convencidos que, num sistema onde actuam-dezenas de milhares de outras pessoas, alguma responsabilidade também está do outro lado, o queé perfeitamente aceitá-
vel. Negar isso é negar a realidade e então, nessa altura, o que se pretende é encontrar um bode expiatório —e se for político ainda melhor— para. no fundo, resolver todos os problemas que afagam a nossa própria consciência. Ora, é isso que acho errado, porque vai atrasar qualquer processo de recuperação.
Portanto, pela minha parte, não recuso a responsabilidade que cabe ao Governo e ao Ministro da Justiça, particularmente neste domínio, mas, justamente porque não recuso essa responsabilidade, entendo ter a legitimidade moral para lançar a questão, do ponto de vista do próprio debate cultural, da rapidez do funcionamento da justiça e devo dizer-lhe, Sr.a Deputada, que não tenho nenhuma dúvida —todos estamos de acordo— quanto a esse objectivo e quanto a essa atitude.
Por outro lado, como é evidente, não recuso as críticas que vêm do interior do próprio sistema, tais como as do Sindicato dos Oficiais de Justiça, da Associação Sindical dos Magistrados Judiciais ou do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público, que são estruturas perfeitamente legitimadas e que, numa democracia aberta, têm um papel específico a desempenhar. Quando quero falar com «os» magistrados enquanto representantes da magistratura, em termos de órgão de soberania, dirijo-me ao Conselho Superior da Magistratura, à Proçuradoria-Geral da República ou à Ordem dos Advogados! E os discursos são diferentes. O que nós não podemos — eu, pelo menos, não o faço— é criar uma confusão institucional que só gera aspectos de incapacidade de resposta face ao próprio sistema.
Portanto, não tenho qualquer dúvida de que as reivindicações que vêm dos órgãos de classe próprios, perfeitamente legítimos, são, obviamente, diferentes —ou, pelo. menos, devem ser diferentes— das que vêm dos órgãos de Estado, já que estes representam o sistema e não os interesses corporativos de classe, que são também legítimos mas que são diferentes.
Nesta perspectiva, sendo todos eles legítimos, sempre que conflitua um interesse de classe, corporativo, com o interesse global do cidadão, eu privilegio este, sem nenhuma dúvida. Esse é o caminho que temos de seguir, sem que isto signifique menor legitimidade das reivindicações de tipo corporativo ou de classe e, muitas vezes, elas são compatíveis com as próprias reivindicações dos cidadãos e, aí, a questão é a de maior ou de menor capacidade de resposta.
O que não tenho nem terei nunca — e não a tenho porque não a cultivo, e não o faço só desde que estou a exercer funções políticas — é uma atitude fechada, autista, do próprio sistema, que se autolegitima e que, dentro dessa autolegitimação, pressupõe uma aparente consensualidade de intervenção que conduziu; durante muitos anos, a que a justiça não pudesse ter o ritmo que entendo que ela deve ter. E há aqui como que um discurso de autodesculpabili-zação interna, que projecta a responsabilidade apenas para o plano político, o que tem também contribuído para uma menor aceleração do processo de recuperação e de mudança. E aí, Sr.' Deputada, apesar das nossas divergências, que são sempre salutares em democracia, eu continuarei a bater-me por aquilo que considero ser a linha que conduz a uma mais rápida satisfação dos interesses dos cidadãos no seu conjunto.
V. Ex.° falou dos tribunais de pequena instância. Como é óbvio, não tenho o número específico de processos, mas posso dizer-lhe que significa 40 % do número total de processos pendentes no Palácio da Justiça, em Lisboa, e que