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II SÉRIE -C — NÚMERO 10
O Sr. Guilherme Oliveira Martins (PS): — O Sr. Deputado Carlos Lélis começou por dizer que eu tinha anunciado as minhas perguntas, mas certamente verificou
a coerência entre o que eu disse e o que a Sr.* Deputada Ana Maria Bettencourt acaba de referir. Efectivamente, são as questões, que a minha colega de bancada acaba de pôr as que estão em causa e, como temos o hábito de trabalhar em equipa, toma-se fundamental colocá-las desta maneira.
Sr. Ministro, este Orçamento para 1993 tem, a nosso ver, um .ponto grave e negro que é a educação. E grave e negro porque, pela primeira vez de há muitos anos a esta parte, temos uma redução em termos reais no orçamento da educação. O Sr. Ministro teve ocasião de dizer no Plenário que isso se devia ao facto de haver desperdícios. No entanto, em várias circunstâncias tenho recordado uma afirmação isenta e objectiva, e não a propósito deste orçamento,' de um antigo director -geral do GEP que diz o seguinte: «Um país nas circunstâncias de Portugal, designadamente a aplicar uma reforma do sistema educativo, não se pode dar ao luxo de uma redução do orçamento da educação, uma vez que essa redução lerá sempre resultados negativos multiplicados.» E porquê? Porque as despesas na educação, quer de funcionamento quer de investimento, têm sempre efeitos reprodutivos.
No entanto, fiquei satisfeito ao ouvir o Sr. Ministro fazer a principal das autocríticas quando nos disse que o sistema tinha de continuar a crescer. V. Ex." afirmou expressamente: «Tem de continuar a crescer.» Ora bem, talvez seja através da descoberta da quadratura do círculo.
Assim, a minha primeira pergunta prende-se com o facto de o sistema crescer decrescendo os meios. Como? O partido da maioria e o Govemo muitas vezes acusam a v oposição de não ter alternativas, mas aqui está um caso claro e evidente em que apresentamos alternativas. E a alternativa é esta: prioridade à educação, mais educação.
Todavia Sr. Ministro, apresentando esta alternativa de assumir essa prioridade à educação, sei que V. Ex." não pode estar satisfeito com este orçamento e isto pela simples razão de que o orçamento não tem neste momento os meios adequados para prosseguir os fins que estão em causa. E espero que, dentro de poucos dias, não constatemos isso mesmo através de um orçamento rectificativo. Vamos ver!... Se houver um orçamento rectificativo para prover a dificuldades da educação, será a primeira demonstração de que, se não tinha meios suficientes em 1992, muito menos terá em 1993.
Sr. Deputado Carlos Coelho, registo o seu apoio e agradeço-o... No fundo, os bons espíritos encontram-se!...
Sr. Ministro, como é que está feito, na prática o cálculo orçamental para 1993? Qual foi o critério? Esta é uma velha questão que, na Comissão de Economia, tenho colocado de forma positiva à Sr.a Secretária de Estado do Orçamento: é a necessidade do aperfeiçoamento dos mecanismos de previsão orçamental. E é com satisfação que temos visto que o Govemo tem vindo a preocupar-se em pôr em causa o velho sistema incrementalista e em pôr em prática sistemas de racionalização nessa previsão. Mas é necessário sabermos exactamente, no caso da educação, como é que essa previsão está feita sobretudo tendo em conta que há perplexidades, que há dúvidas. Em cada passo, falando com pessoas que têm, no dia-a-dia, a seu cargo a resolução de problemas da educação, elas dizem que não têm meios suficientes nem sabem como resolver os estímulos, as questões, os desafios com que se defrontam. É por isso que nós, num gesto que é, fundamentalmente, um gesto de orientação clara dizemos
que a educação pré-escolar, a acção social escolar, o ensino superior, a educação especial têm de ser reforçados. Mas
nós, como oposição, não temos como fazê-lo. Tal como a Sr." Deputada Ana Maria Bettencourt acaba de dizer, nôs solicitamos informação e essa informação ou é tardia ou nem sequer surge.
Nós entendemos que devíamos fazer um gesto concreto exigindo: na educação pré-escolar, na educação especial, na acção social escolar e no ensino superior, reforços! E não se diga que é uma orientação «despesista»! Porquê? Pela simples razão de que, neste caso concreto, nós tivemos o cuidado de olhar a sobre-avaliação nos juros para que, na educação, não houvesse agravamento no défice. Está ah o meu querido amigo e colega de lides académicas, Dr. Bracinha Vieira que sabe bem como estas matérias orçamentais me preocupam, e, se digo isto, é porque tive essa preocupação.
Sr. Ministro, relativamente à questão das propinas, acaba de ser dito, designadamente no esclarecimento à intervenção do Sr. Deputado António Filipe e, depois, do Sr. Deputado Pedro Passos Coelho, que haveria recursos necessários para o cumprimento do tal acordo social. Ora bem, a questão que se coloca aqui é uma questão de uma certa opacidade relativamente a meios, porque há uma proposta de lei do Orçamento e diz-se que há já, previstos anteriormente, os recursos necessários em verbas globais. Sr. Ministro, como é que é isto? Então já estava a prever, quando apresentou o Orçamento, que iria ser celebrado o acordo social e quais os respectivos termos? Ou o Sr. Ministro já estabeleceu algumas «almofadas» nalguns domínios para isto e para outras coisas? Este é um esclarecimento importante uma vez que a transparência é algo de essencial no Orçamento. A discriminação orçamental é algo que tem de ser cumprido e só excepcionalmente poderá ser afastado — e há excepções, designadamente a dotação provisional; mas esta destina--se a um fim específico, para acorrer a despesas urgentes e inadiáveis, que não podem ser previstas no momento em que o Orçamento é aprovado. Pois bem, desafio o Governo a especificar concretamente os recursos necessários para acorrer a essas dificuldades.
Relativamente ao artigo 55.°, nós vamos, com coerência propor a sua não aprovação porque entendemos que não há condições práticas para aplicar a lei das propinas e, não havendo tais condições, não tem sentido, naturalmente, o artigo 55.° Mas, como tive ocasião de dizer no próprio debate em que foi aprovada aqui a lei das propinas (e contra a qual votámos), entendemos que esta questão deveria ser colocada articuladamente com o financiamento do ensino superior e com a acção social escolar — e não foi. Pelo que é indispensável que esta questão seja colocada.
Ainda um outro tema: declarações de vários reitores, designadamente do Sr. Reitor da Universidade Clássica de Lisboa, sobre quem e como se cobram as propinas. O Sr. Reitor da Universidade Clássica de Lisboa diz que «se o Govemo quer ter propinas, que as cobre» — como é que é isto?
Últimas duas questões, Sr. Ministro: avaliação aferida do sistema — não basta falar de qualidade! Portugal é, na Comunidade Europeia, um dos únicos países que não tem avaliação aferida no sistema educativo. Sr. Ministro, nada parece existir quanto a isto; neste ponto, continua, de algum modo, uma certa inércia. Assim, gostaríamos de ouvir da sua parte aquilo que pensa sobre esta necessidade da avaliação aferida do sistema.